Sistema Nacional da Educação - os debates e a importância da regulamentação prevista no PNE
Entenda os debates a respeito deste sistema e a relevância da colaboração entre União, Distrito Federal, Estados e Municípios para o avanço da educação no Brasil.
Introdução
Considerando as características federativas do Brasil, com diferentes instâncias administrativas para manter as estruturas públicas funcionando, assim como a heterogeneidade territorial, com capacidades sociais e econômicas distintas, são necessários mecanismos institucionais claros que prevejam a cooperação entre a União, estados, Distrito Federal e municípios e o regime de colaboração entre os sistemas de ensino. Com os muitos desafios – alguns aprofundados pela pandemia de covid-19 – que ainda temos para conquistar a garantia plena do direito à educação de qualidade para todos, a regulamentação e a implementação do Sistema Nacional de Educação (SNE) é essencial no contexto atual.
Previsto na Constituição Federal – a partir da Emenda Constitucional nº 59/2009 – e sendo uma das metas do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024, cuja vigência foi prorrogada até o fim de 2025, o Sistema Nacional de Educação, atualmente em discussão no Congresso Nacional, prevê a cooperação e a colaboração interfederativa em benefício da educação. E apesar de sua trajetória histórica, desde o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932 até os muitos debates a respeito dele nos dias atuais, a elaboração final das suas normas é complexa e, ao mesmo tempo, urgente.
Ao longo do conteúdo, você vai entender a relevância dessa regulamentação, o desenho do pacto federativo na educação nacional hoje, e conhecer algumas iniciativas de colaboração interfederativa para compreender os benefícios à educação proporcionados por ela.
Para uma imersão mais completa nesse debate, distribuímos uma série de links para conteúdos sobre o tema disponíveis no Observatório de Educação - Ensino Médio e Gestão Abre em uma nova guia ao longo do texto. Utilize-os para saber mais sobre aspectos específicos relacionados ao Sistema Nacional de Educação.
O Sistema Nacional de Educação e os debates para sua regulamentação
No Brasil, a emergência sanitária da covid-19 (2020-2023) provocou centenas de milhares de mortes e trouxe muitas outras consequências. Porém, é consensual que o impacto dessa e de outras doenças seria ainda maior sem o Sistema Único de Saúde (SUS)Abre em uma nova guia. Incluindo desde a atenção básica até o atendimento hospitalar de alta complexidade, esse sistema tem como princípio básico que a gestão deve ser solidária e participativa entre a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios.
Esses entes federativos possuem suas corresponsabilidades e autonomia para administrar as estruturas em seu território, respeitando preceitos como universalização, equidade e participação popular. Para garantir a integração entre as instâncias, existem Conselhos de Saúde e Comissões Intergestores em que representantes da União, do Distrito Federal, dos estados e dos municípios organizam aspectos operacionais.
Estrutura semelhante tem o Sistema Único de Assistência Social (Suas)Abre em uma nova guia, de maneira a proporcionar apoio a indivíduos, famílias e à comunidade no enfrentamento de suas dificuldades, por meio de serviços, benefícios, programas e projetos. Também conta com Comissões Intergestores e regras próprias para definir as responsabilidades da União, dos estados e dos municípios.
A educação pública no Brasil, entretanto, ainda não possui esse tipo de organização, estabelecendo uma situação em que a colaboração entre os diferentes entes do pacto federativo não é regulamentada, mesmo prevista na Constituição FederalAbre em uma nova guia, e aplicada em programas e ações específicas. Assim, o Sistema Nacional de Educação (SNE) é o mecanismo legal que formalizará a cooperação entre a União, o Distrito Federal, os estados e os municípios, visando ao alinhamento e harmonia entre as políticas, programas e ações dessas esferas na área da educação.
Com debates que ganharam força na última década, a institucionalização do SNE é essencial para definir normas de cooperação e colaboração interfederativa e assim qualificar programas e ações, reduzir desigualdades e proporcionar a garantia plena do direito à educação para todos os brasileiros.
A pesquisadora Fernanda Castro, no conteúdo disponível neste link Abre em uma nova guia, explica a definição dessa colaboração e sua relevância.
“O regime de colaboração é um conceito central na discussão de políticas educacionais no Brasil. É uma novidade constitucional que procura trazer mais clareza acerca das responsabilidades educacionais compartilhadas e comuns da União, estados e municípios. Em outras palavras, ele aponta para a importância da colaboração no processo de formulação e implementação de ações e programas educacionais entre os entes federativos, para que haja coerência entre os diferentes sistemas de ensino, independentemente de sua localização geográfica ou das condições educacionais de cada região.”
A necessidade de integração e coordenação mais qualificadas entre os entes federativos fica clara ao observarmos os dados do Ideb 2023Abre em uma nova guia. A média nacional manteve-se próxima dos resultados de 2021 e 2019 — como se pode ler neste linkAbre em uma nova guia, devido aos impactos da covid-19 na educação, recomenda-se que os indicadores de 2023 sejam analisados também à luz do ciclo avaliativo pré-pandemia. No Ideb 2023, os anos iniciais do ensino fundamental registraram média nacional de 6,0, enquanto os anos finais ficaram em 5,0 e o ensino médio alcançou 4,3. Contudo persistem disparidades significativas entre os territórios. Por exemplo, no ensino médio, estados como Goiás atingiram 4,8, enquanto Rio de Janeiro e Rio Grande do Norte ficaram abaixo da média nacional, com índices de 3,3 e 3,2, respectivamente. Essas variações atestam que o progresso agregado não é uniforme e tornam ainda mais urgente a efetiva instituição do SNE.
Você pode conferir esse e outros indicadores na Seção Educação em Números do Observatório de Educação através deste link. Abre em uma nova guia
Assim, torna-se evidente a necessidade de se elaborar políticas públicas alinhadas entre as diferentes esferas federativas, a fim de identificar as razões e combater a desigualdade nos resultados da aprendizagem desses estados para com o restante do Brasil.
No contexto da pandemia, que obrigou o fechamento das escolas e a implementação de ensino remoto emergencial, sem uma diretriz nacional clara, as redes se viram obrigadas a adotar diferentes soluções para manter as atividades funcionando à distância, conforme abordamos no conteúdo deste link.Abre em uma nova guia
Se o Sistema Nacional de Educação já estivesse regulamentado, as iniciativas de maior sucesso poderiam ter sido compartilhadas e implementadas com mais facilidade e integração pelo Brasil, atenuando os impactos da pandemia na aprendizagem, mapeados no estudo disponível neste linkAbre em uma nova guia. O mesmo se pode dizer dos esforços para a recomposição das aprendizagensAbre em uma nova guia, iniciados de forma ainda tímida em 2021, com o avanço da vacinação contra a covid-19 e a reabertura das escolas. Mais importante, o SNE permitiria estabelecer um diálogo permanente e efetivo entre os entes federativos e atores da sociedade civil, por meio das Comissões Intergestoras.
A trajetória dos debates sobre o Sistema Nacional de Educação
A Constituição Federal de 1988Abre em uma nova guia prevê em seu artigo 23º como responsabilidade comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação, à ciência, à tecnologia, à pesquisa e à inovação. Em seu artigo 211º, prevê que essas instâncias organizarão os seus sistemas de ensino em regime de colaboração, ponto que nunca foi regulamentado claramente, apesar das complementações no artigo ao longo do tempo.
Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, disponível neste link,Abre em uma nova guia cita o regime de colaboração entre a União, estados, Distrito Federal e municípios e estabelece responsabilidades de cada uma dessas instâncias, mas também sem definir claramente mecanismos legais para que essa colaboração aconteça.
A partir de 2010, o debate para a regulamentação do Sistema Nacional de Educação (SNE) ganhou força em diversos espaços. Conforme o conteúdo disponível neste linkAbre em uma nova guia, nesse período a regulamentação do sistema foi amplamente discutida na sociedade civil, com entidades de representação social como o Fórum Nacional de Educação, bem como nas Conferências Nacionais de Educação (Conae) de 2010, 2014 e 2018.
No executivo, a articulação para a criação do SNE ficou a cargo da Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sase)Abre em uma nova guia do Ministério da Educação (MEC), criada em 2011 para dar continuidade aos debates e construir consensos para a criação do SNE. Em 2014, o Plano Nacional de Educação, disponível neste link,Abre em uma nova guia estabeleceu entre suas metas a regulamentação do Sistema Nacional de Educação até 2016, fato que nunca ocorreu.
Também em 2016, em meio às discussões do Conselho da Sociedade Civil Organizada do Banco Interamericano de Desenvolvimento (ConSOC-BID), foi criado o Movimento Colabora Educação (MCE), organização que atuou até 2023 reunindo representantes de várias instituições da sociedade civil para a produção de informações, fomento ao debate e articulações para a regulamentação do regime de colaboração na educação. Conforme a apresentação do MCE:
“vale ressaltar que não contamos com previsões legislativas que orientem ou induzam os Estados e Municípios a trabalharem de maneira pactuada, dentro do seu próprio território. Por isso, é imprescindível e urgente garantir a construção e ou revisão de marcos legais e normativos que institucionalizem e garantam maior robustez aos esforços colaborativos que se deseja implementar.
Neste sentido, entendemos e reafirmamos a importância de se consolidar uma efetiva governança educacional, por meio da regulamentação de um Sistema Nacional de Educação (SNE). Desta forma, todos os entes federados, sob uma mesma normativa, terão condições e orientações semelhantes para institucionalizar e conduzir seu trabalho em Regime de Colaboração.”
No Congresso Nacional, ao longo desse período, tramitaram oito projetos de lei complementar com o objetivo instituir o Sistema Nacional de Educação, na expectativa de se definir normas de cooperação e colaboração interfederativa. Com o avanço dos debates as propostas foram sendo analisadas e, eventualmente, apensadas, de modo que apenas duas frentes seguem hoje em tramitação ativa.
Discussões atuais
As proposições legislativas atualmente em andamento para a instituição do Sistema Nacional de Educação (SNE) são o Projeto de Lei Complementar nº 25, de 2019, disponível neste linkAbre em uma nova guia, e o Projeto de Lei Complementar nº 235, de 2019, disponível neste linkAbre em uma nova guia. Em março de 2022, o PLP nº 235/2019 foi aprovado no Senado Federal e remetido à Câmara dos Deputados. Na sequência, o PLP n° 25/2019 foi apensado ao PLP nº 235/2019, passando ambos a tramitar conjuntamente. Ao longo de 2023 e 2024, outros projetos também foram apensados ao PLP nº 235/2019, entre eles o PLP nº 109/2023, o PLP nº 42/2024 e o PLP nº 119/2024. Atualmente, todo esse bloco tramita sob o número do PLP nº 235/2019, que se consolidou como o principal instrumento legislativo para tratar do SNE.
No início do mês de setembro de 2025 o PLP nº 235/2019Abre em uma nova guia foi aprovado com modificações na Câmara dos Deputados.
Sua nova versão indica, por exemplo, que todos os estudantes precisarão ter um Identificador Nacional Único do Estudante (INUE), que, segundo o projeto, deverá o mesmo número do CPF. Tal iniciativa busca facilitar o monitoramento dos dados da trajetória dos alunos, permitindo maior assertividade na amálise de dados relacionados a abandono escolar, trocas de escolas, entre outros.
No item governança, o projeto prevê que o Poder Executivo federal crie a Comissão Intergestores Tripartite da Educação (Cite) para sugerir políticas educacionais em nível nacional. Além disso, o texto aponta que a comissão será uma das responsáveis pelo cálculo do indicador Custo Aluno Qualidade, que mede a necessidade das escolas e ajuda a definir quais locais precisam de mais investimento.
Já as Comissões Intergestores Bipartite da Educação (Cibe) serão formadas por seis representantes do respectivo estado e seis dos seus municípios, segundo a proposta em trâmite. Ambas as comissões estavam no texto aprovado no Senado e foram mantidas pelos deputados.
O texto também aponta novas obrigações e mudanças na avaliação, indicando necessidade de integração entre o sistemas dos entes estaduais e municipais que medem a performance dos estudantes com o SNE
Tanto o Todos pela EducaçãoAbre em uma nova guia, quanto a Campanha Nacional pelo Direito à EducaçãoAbre em uma nova guia lançaram posicionamentos sobre as mudanças no texto, que agora volta para a análise do Senado.
O pacto federativo e o cenário atual da educação
Ao contrário do senso comum, o pacto federativo no Brasil não estabelece uma hierarquia direta entre as diferentes instâncias. Assim, as prefeituras não são subordinadas aos governos estaduais e nem esses ao executivo federal, mantendo relativa autonomia dentro do seu território e tomando decisões de forma democrática, ainda que a coordenação de políticas e programas específicos fique a cargo de alguma instância específica.
Conforme o estudo “Governança Multinível da Educação em Países Federativos”, coordenado pelo MCE, Fundação Getúlio Vargas e pelo Todos pela Educação:
“No contexto brasileiro, essa definição é aplicável, uma vez que na educação há competências comuns e concorrentes da União e entes subnacionais na gestão da política educacional, conforme a Constituição Federal de 1988. A União estimula a desconcentração da execução dos serviços, sem abdicar de seu papel central na coordenação da educação nacional, cabendo aos entes subnacionais gerir os sistemas de ensino, em regime de colaboração.”
Manter as políticas públicas de educação dentro do modelo federativo e enfrentar os desafios para a garantia plena do direito à educação e o combate às desigualdades são tarefas complexas em um país como o Brasil. Questões como gerenciamento de recursos, definição de competências e atribuições, tomadas de decisão, avaliação, etc. são elementos cruciais para o funcionamento dos sistemas em cenários educacionais como o do Brasil.
O estudo também traz diversas informações referentes ao funcionamento dos sistemas de educação em outros países federativos. Leia a pesquisa completa através deste link. Abre em uma nova guia
Ao longo do tempo, o arranjo de responsabilidades de cada ente federativo do nosso país colocou a União como responsável principal pelas instituições de ensino superior, enquanto os estados e o Distrito Federal cuidam do ensino médio. A responsabilidade dos municípios, por sua vez, recai sobre a educação infantil e o ensino fundamental, embora em muitas localidades as redes estadual e municipal dividam o atendimento dos anos finais do ensino fundamental.
Assim, esse desenho deixa em aberto a elaboração de meios de colaboração, redistribuição e suplementação de recursos técnicos e financeiros de maneira equitativa entre elas. Conforme a pesquisa de Fernando Luiz Abrucio e Catarina Ianni Segatto, que analisou a cooperação em seis estados brasileiros, disponível neste linkAbre em uma nova guia, essa questão torna a colaboração pouco definida e uniforme entre os estados:
“Em um extremo, há estados mais coordenadores, como o Ceará e o Mato Grosso do Sul, que possuem maior institucionalização e órgãos específicos para essa prática e buscam o aumento da capacidade institucional dos municípios por meio de contratação e formação de pessoal e por assessoria técnica para a elaboração e execução do PAR (Plano de Ações Articuladas). Acre e Minas Gerais, apesar de serem estados intermediários na cooperação por haver menos institucionalização, estão mais próximos do Ceará e do Mato Grosso do Sul que de São Paulo e Pará. No outro extremo, encontram-se esses dois últimos estados, em que, em São Paulo, não há debate em torno da cooperação e de projetos que integrem as duas redes, apenas programas estaduais que são abertos para que os municípios participem, e, no Pará, não há nada expressivo.”
Isso proporciona cenários em que instituições federais, estaduais e municipais, mesmo que inseridas em um mesmo território, tenham diferenças de estrutura e na qualidade do ensino. Conforme explica o pesquisador Fernando Luiz Abrucio, no livro disponível neste link.Abre em uma nova guia
“A Educação Básica é constituída, em grande medida, por uma duplicidade de redes convivendo em um mesmo território: escolas municipais e estaduais. Na verdade, no caso do Ensino Médio, é possível contar, ainda, com instituições federais, que tendem a crescer nesse ciclo por conta da expansão – necessária – das escolas técnicas. Em razão dessa configuração, é preciso coordenar a atuação dos níveis de governo a fim de evitar sobreposições e garantir padrões de qualidade similares. Infelizmente, hoje há pouquíssimo diálogo e colaboração entre as redes de ensino.”
Em alguns locais, a sobreposição de responsabilidades, principalmente envolvendo o Ensino Fundamental, provoca uma espécie de concorrência por um número mais elevado de matrículas, gerando uma competição entre Redes Estaduais e Municipais para que tenham mais alunos e, assim, mais recursos financeiros de políticas como o Fundeb.
Mesmo sem esse alinhamento nacional claro, a colaboração entre as diferentes instâncias do pacto federativo proporciona amplos benefícios em algumas experiências desenvolvidas no Brasil.
No Ceará, o Programa Alfabetização na Idade Certa (PAIC) foi criado como estrutura institucional de colaboração entre o Estado e os Municípios para melhorar os índices de proficiência em leitura e escrita dos estudantes. Conforme descrevem Fernando Luiz Abrucio, Catarina Ianni Seggatto e Maria Cecília Gomes Pereira, no estudo de caso sobre o programa:
“O Programa Alfabetização na Idade Certa (PAIC) foi lançado em maio de 2007 e institucionalizado por meio da Lei 14.026 de 17/12/2007, com o objetivo de garantir que todas as crianças fossem alfabetizadas até os sete anos de idade. O PAIC contou com a adesão de todos os 184 municípios cearenses, por meio de um acordo de cooperação. Desde o início do programa, a SEDUC enfatizou que questões político-partidárias não deveriam interferir na Educação e não tratou de maneira diferenciada prefeitos da base aliada ou opositores do governo estadual, como disseram os entrevistados ligados às associações municipalistas. O programa foi formulado e implementado à medida que se construía um arranjo de colaboração entre estado e municípios.”
Entre outras ações, o PAIC efetivou apoio técnico para a construção de currículos, direcionamento de recursos para a construção, ampliação, reformas de escolas e compra de equipamentos da rede municipal e celebrou acordos para o transporte de estudantes da rede estadual através da estrutura de veículos dos municípios.
Ao longo dos anos, o programa passou por inúmeras avaliações e ajustes em suas metodologias, tendo como critério principal a avaliação externa estadual SPAECE. Em 2007, quando o programa foi criado, apenas 8% dos municípios cearenses apresentavam índices adequados de alfabetização. Em 2015, esse mesmo dado indicava que 98% dos municípios haviam atingido níveis desejáveis de proficiência em leitura e escrita de seus estudantes.
Para saber mais sobre o regime de colaboração do Estado do Ceará e seus municípios, confira o estudo completo através deste link.Abre em uma nova guia
Relação com o Fundeb e o Custo Aluno Qualidade, o CAQ
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) é um fundo especial, de natureza contábil e de âmbito estadual, composto por recursos provenientes de impostos e das transferências dos estados, Distrito Federal e municípios vinculados à educação. Trata-se do principal mecanismo de financiamento em regime de colaboração da educação básica.
O Fundeb foi criado em 2006 e estava previsto para acabar em 2020. Entretanto, nesse mesmo ano, tornou-se permanente na Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional 108/2020Abre em uma nova guia, após amplo debate sobre políticas públicas e educacionais. Conforme abordamos neste linkAbre em uma nova guia, essa emenda determinou o aumento gradual da participação da União nos recursos destinados ao fundo, alcançando 21% em 2025, com previsão de chegar a 23% em 2026. Além disso, alterou a forma de distribuição dos recursos federais entre os estados e municípios, introduzindo mecanismos como a complementação VAAT (Valor Aluno/Ano Total) e a complementação VAAR (Valor Aluno/Ano Resultado), esta última vinculada a indicadores de gestão e resultados educacionais.
Os recursos oriundos do Fundeb destinam-se aos estados, Distrito Federal e municípios para o financiamento de ações de manutenção e desenvolvimento da educação básica pública, levando-se em consideração os âmbitos de atuação prioritária de cada ente federado. O papel do Fundeb é de alta responsabilidade, pois é ele que garante a melhoria das condições educacionais, a manutenção e o desenvolvimento do ensino.
Quando não há uma regulamentação que defina responsabilidades, organize competências e distribua funções entre União, estados, Distrito Federal e municípios, para que juntos consigam trabalhar pela educação do país, aumenta-se o risco de uso ineficiente dos recursos públicos destinados à área.
Um dos instrumentos importantes para orientar a distribuição dos recursos do Fundeb é o Custo Aluno Qualidade (CAQ)Abre em uma nova guia, previsto para ser regulamentado junto ao Sistema Nacional de Educação. O CAQ busca garantir escolas com infraestrutura, insumos e profissionais adequados, assegurando padrões mínimos de qualidade por meio da implementação do CAQi (Custo Aluno Qualidade Inicial) e, posteriormente, do próprio CAQ.
Este mecanismo, amplamente debatido em legislação, normas educacionais e estudos técnicos, tem como essência o cálculo do custo por aluno ou do valor aluno/ano necessário para garantir condições adequadas de ensino. A lógica é identificar referências concretas de qualidade educacional e dimensionar os custos para alcançá-la, possibilitando avaliar, de forma equitativa, a necessidade de recursos financeiros em cada localidade — tanto em termos de montante global quanto de prioridades e proporcionalidade na alocação dos recursos.
A ausência de regulamentação do Sistema Nacional de Educação e de mecanismos como o CAQ dificulta o trabalho dos estados e municípios de utilizar os recursos provenientes do Fundeb e outras políticas redistributivas de maneira coesa e alinhada às suas necessidades, identificadas a partir da colaboração entre as redes das diferentes esferas federativas.
No entanto, vale notar que o CAQ é um tema que requer aprofundamento. Diferentes atores já se posicionaram sobre a dificuldade de estabelecer referenciais que reflitam adequadamente a heterogeneidade dos contextos educacionais do país.
Embora o Fundeb permaneça assegurado constitucionalmente, a PEC 45/2024, aprovada em 2024Abre em uma nova guia, introduziu mudanças ao estabelecer que parte da complementação da União deve ser destinada especificamente à educação integral — até 10% em 2025 e no mínimo 4% a partir de 2026. Essa nova regra limita parcialmente a flexibilidade de aplicação dos recursos, ainda que o volume total continue protegido. Além disso, o novo arcabouço fiscal, instituído pela Lei Complementar nº 200/2023, impõe limites ao crescimento das despesas primárias da União, o que pode reduzir a capacidade de ampliar investimentos em educação como um todo. Nesse cenário, a criação do Sistema Nacional de Educação seria essencial para organizar pactuações entre União, estados e municípios sobre prioridades e uso eficiente dos recursos, sobretudo diante de possíveis restrições fiscais.
Regimes de colaboração na prática
Ao longo deste especial, apresentamos uma série de informações sobre o Sistema Nacional de Educação (SNE), a importância da sua regulamentação e como a colaboração entre diferentes instâncias federativas pode ser benéfica para a educação básica.
Para demonstrar como essa cooperação acontece, na prática, e inspirar gestores a elaborar experiências semelhantes, deixamos uma série de outros conteúdos do Observatório de Educação para que todos possam conhecer mais desses movimentos e fomentar os debates sobre ele.
1 - O sistema de Política Colaborativa do Maranhão Abre em uma nova guia
Este estudo, produzido pelo MCE, analisa em detalhes a situação histórica do regime de colaboração da educação maranhense e os inúmeros programas deste território para fomentar a colaboração entre o estado e seus municípios, com destaque para o programa de formação continuada de educadores realizado pela Secretaria de Educação estadual, a União dos Dirigentes Municipais de Educação e vários outros parceiros.
2 - O Arranjo de desenvolvimento da Educação do Noroeste do Estado de São PauloAbre em uma nova guia
Sistemas de colaboração também podem envolver múltiplos territórios de uma mesma esfera federativa. É o caso do Arranjo de Desenvolvimento da Educação do Noroeste do Estado de São Paulo, que reúne 65 municípios e cerca de 300 escolas públicas municipais. A iniciativa existe desde 2009 e promove periodicamente formação continuada de professores e gestores por meio de fóruns, troca de experiências e construção de conhecimento.
3 - O Guia de Regime de Colaboração - Estados e Municípios Abre em uma nova guia
Também produzido pelo MCE, este guia retoma os princípios gerais e as vantagens da atuação em regime de colaboração e aponta fatores de sucesso, sistematizados a partir de experiências em todo o país, com exemplos concretos para cada um deles. Apresenta também as principais etapas e subetapas que constituem a elaboração de políticas públicas em regime de colaboração, trazendo ferramentas e metodologias que podem ser úteis para o planejamento e implementação das mesmas.
4 - SNE em pauta Abre em uma nova guia
Acesse também o site do projeto SNE em Pauta, iniciativa que reúne conteúdos sobre o Sistema Nacional de Educação para subsidiar e fortalecer o debate público sobre o tema. Funciona como hub de conteúdo sobre o tema, o portal inclui conteúdos multimídia, textos, notícias e materiais em diversos formatos para agregar informações qualificadas e dinâmicas sobre o SNE, com diferentes abordagens.
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