Evasão escolar e o abandono: um guia para entender esses conceitos
Selecionamos os principais conteúdos do Observatório de Educação que abordam as razões apontadas e os contextos vividos por estudantes do ensino médio que aumentam as probabilidades da não continuidade dos estudos.
Introdução
A escola tem um papel social essencial quando se trata de potencializar vínculos sociais, desenvolver habilidades físicas e cognitivas e de tornar o aluno um agente social. No entanto, existem percalços e negações diárias do direito à educação que aumentam a probabilidade de os jovens não darem continuidade aos estudos.
Por trás de situações de abandono e evasão escolar existem motivações diversas Abre em uma nova guia, desde gravidez, falta de conexão dos conteúdos com os interesses dos estudantes, necessidade imediata de geração de renda, entre outros. A predominância de currículos e práticas pedagógicas que não incluem a perspectiva de grupos historicamente excluídos, por exemplo, acaba por aumentar os índices de evasão e exclusão escolar de estudantes negros, LGBTQIAPN+ e com deficiência.
As taxas de evasão consolidadas até 2023 mostram uma trajetória de queda nos últimos anos, totalizando 3,0% no ensino fundamental e 5,9% no ensino médio, conforme divulgado no Censo Escolar 2023. Um estudo assinado por Reynaldo FernandesAbre em uma nova guia, com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Ministério da Educação (MEC), traçou em 2011 um perfil dos jovens com maior risco à evasão: são os de baixa renda, em sua maioria negros, forçados precocemente ao mercado de trabalho ou que engravidam já na adolescência. Fernandes apontou que esses fatores “externos” à atividade propriamente escolar se articulam a um processo contínuo de desinteresse e desengajamento, levando, por fim, ao abandono.
Além disso, é na adolescência que o problema se apresenta com maior intensidade e por isso os índices de evasão no ensino médio são bem superiores aos do ensino fundamental. Segundo a edição 2023 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua Educação)Abre em uma nova guia, que é realizada pelo IBGE, a taxa de escolarização entre os jovens de 15 a 17 anos naquele ano foi de 91,9%.
A taxa de escolarização retrata a proporção de estudantes de determinada faixa etária em relação ao total de pessoas dessa mesma faixa etária. O dado indica, portanto, que 8,1% dos adolescentes com idade típica do ensino médio estavam fora da escola em 2023, fato que dialoga com as muitas deficiências dessa etapa de ensino na educação brasileira. Tem relação, também, com o impacto das questões sociais na vida dos jovens e com experiências escolares que podem ter sido negativas em suas vidas desde o ensino fundamental, conforme abordado no relatório disponível neste linkAbre em uma nova guia.
Ao longo deste especial, reunimos uma série de conteúdos, dados, informações e práticas de sucesso disponíveis no Observatório de Educação - Ensino Médio e GestãoAbre em uma nova guia, para apoiar gestores escolares a elaborar e aplicar ações para diminuir os níveis de evasão e abandono. Utilize os links distribuídos pelo texto para uma experiência ainda mais rica e completa sobre o tema.
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Infrequência e desistência: as diferenças entre abandono e evasão
Um jovem longe do sistema de ensino é um problema que vai muito além dos limites físicos da escola: se torna uma questão social. Para compreender melhor o problema e buscar a solução mais adequada, é preciso, primeiro, entender a diferença entre os conceitos de abandono e evasão escolar. Apesar de serem usados muitas vezes como sinônimos, eles têm características diferentes nos casos em que os estudantes deixam a escola.
Deixar de frequentar as aulas durante o ano letivo caracteriza o abandono escolar. Já a situação em que o estudante, seja reprovado ou aprovado, não efetua a matrícula para dar continuidade aos estudos no ano seguinte é entendida como evasão escolar.
A educadora e gestora da educação Macaé Evaristo explica com mais detalhes as diferenças entre estas duas situações de infrequência escolar. A entrevista foi concedida quando a especialista era Secretária de Educação de Minas Gerais, cargo que ocupou de 2015 a 2018. Confira no vídeo abaixo.
Assim, se a quantidade de adolescentes/jovens fora da escola aumenta conforme o passar do ano letivo, temos um aumento dos números de desistência, o que caracteriza o abandono escolar. Por outro lado, tratamos de evasão escolar quando o aluno frequenta um ano da escola, mas não se matricula no ano subsequente. Acontece a evasão quando não há registro de matrícula do estudante nos Censos Escolares nos anos após ao que ele frequentou. O Observatório de Educação fez um Roteiro de Análise de Indicadores Educacionais sobre Abandono e Evasão Escolar que você pode ler clicando aquiAbre em uma nova guia.
Quem são os jovens que mais evadem e por quê?
Entender quem são os jovens que estão fora da escola e as razões que os levam a isso Abre em uma nova guiaé essencial para se chegar a um diagnóstico e, consequentemente, conseguir criar soluções para amenizar este cenário. Os indicadores da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua - PNAD (IBGE) mostram que o contexto familiar pode influenciar na decisão de abandonar a escola Abre em uma nova guia .
Quando o contexto familiar do aluno é de uma família chefiada por um homem branco, com pelo menos a escolaridade média completa, renda alta e residente de área urbana, a chance deste aluno frequentar normalmente a escola é de, no mínimo, 79%. Quando se trata de famílias chefiadas por mulheres negras, analfabetas e de área rural, o índice máximo é de 65% no Estado do Maranhão e de 21,7% em Santa Catarina.
De acordo com a Pnad Contínua Educação 2023, dentro do grupo de jovens de 14 a 29 anos de idade do país, 9 milhões não completaram o ensino médio, seja por terem abandonado a escola antes do término desta etapa ou por nunca a terem frequentado. Desses, 58,1% eram homens e 41,9% eram mulheres. No recorte de cor ou raça, 27,4% eram brancos e 71,6% eram pretos ou pardos.
O IBGE verificou que os maiores percentuais de abandono da escola se deram, em 2023, nas faixas a partir dos 16 anos de idade (entre 16,0% e 21,1%). E, ainda que exista abandono precoce na idade do ensino fundamental – era de 6,2% até os 13 anos e de 6,6% aos 14 anos –, foi na idade de 15 anos, que corresponde à entrada no ensino médio, que as taxas de abandono subiram à casa dos dois dígitos.
A Pnad Contínua Educação 2023 também avaliou os motivos do abandono ou infrequência à escola entre as pessoas de 14 a 29 anos e a necessidade de trabalhar foi o fator prioritário para 41,7% dos jovens. Esta é uma situação que parece estar se agravando nos últimos anos. Em 2022, 40,2% sucumbiam à pressão pelo ingresso no mercado de trabalho como principal motivo para abandonar a escola. Em 2019, eram 40,1%.
Estes dados indicam que o choque socioeconômico faz com que alunos deixem a escola não só por terem que sustentar suas famílias, mas também por não terem condições financeiras de manter a frequência escolar. Por sequer terem, por vezes, condições de pagar o transporte até a escola e sua alimentação, por exemplo.
Desta forma, pode-se entender que o avanço escolar está ligado às questões raciais e socioeconômicas. Inúmeros estudos demonstram que, enquanto pessoas brancas e de renda mais elevada alcançam níveis mais altos de escolaridade, pessoas negras e de renda mais baixa tendem a ter um menor índice de avanço escolar. E mesmo entre os mais pobres, os piores indicadores educacionais são observados entre os estudantes negros. Essas disparidades são fruto do racismo estrutural existente na sociedade brasileira, que é expresso pela desigualdade persistente nos indicadores educacionais e econômicos, refletidos nos ambientes familiares. A página especial Desigualdade Racial na Educação, publicada pelo Observatório de Educação, apresenta em detalhes o problemaAbre em uma nova guia.
A pandemia da covid-19, além de causar um aprofundamento dessas desigualdades socioeconômicas, se tornou mais um elemento que favoreceu o abandono escolar, uma vez que afastou os estudantes das instituições, enfraquecendo suas conexões com a educação. No webinário “Estratégias para a Redução do Abandono e Evasão”, que você pode assistir através deste linkAbre em uma nova guia, Julia Ribeiro, oficial de Educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef, na sigla em inglês) citou dados da Pesquisa Pnad Covid do IBGE para embasar seu raciocínio:
“a gente está falando de mais de 5,5 milhões de crianças e adolescentes que em outubro de 2020 disseram que não estavam tendo seu direito à educação assegurado. (...) Esses estudantes precisam ser identificados e esse vínculo com a escola precisa ser retomado.”
A desigualdade racial nos dados sobre abandono escolar no Brasil
Uma queda geral nos índices de abandono escolar foi registrada no Brasil por meio da série histórica do Censo Escolar até 2019/2020, quando os números tornaram a subir como reflexo da covid-19. Felizmente, a avaliação de 2023 voltou a aferir a retração desse indicador tanto para os anos finais do ensino fundamental quanto para o ensino médio (o abandono escolar nos anos iniciais do ensino fundamental havia subido em 2020, mas iniciara sua trajetória de queda já em 2021).
Este é um dado positivo particularmente porque tanto estudantes brancos quanto negros têm evadido menos das escolas em relação à situação pré-pandemia. No entanto, a desigualdade educacional ainda persiste quando comparada a cor ou raça dos estudantes, como se pode observar nos gráficos a seguir, construídos por meio do novo Painel Estatísticas Censo Escolar da Educação BásicaAbre em uma nova guia , do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
Diferenças de gênero no abandono escolar
O abandono e a evasão escolar entre indivíduos do sexo masculino e feminino têm cenários e motivações diversos no Brasil. Como se viu na Pnad Contínua Educação 2023, dos 9 milhões de jovens de 14 a 29 anos com nível de instrução inferior ao ensino médio, 58,1% eram homens e 41,9% eram mulheres. Ao analisar os motivos do abandono escolar ou da infrequência à escola, 53% dos homens apontaram a necessidade de trabalhar como principal justificativa, sendo que a falta de interesse em estudar veio em seguida (25,5%). Para as mulheres, o principal motivo foi também a necessidade de trabalhar (25,5%), seguido de gravidez (23,1%).
Já o levantamento das taxas de abandono específicas do ensino médio pelo Censo Escolar 2023 apontaram que 3,8% dos estudantes do sexo masculino deixaram de frequentar a escola naquele ano, ante 2,9% das estudantes mulheres. O histórico deste fenômeno desde 2014 pode ser visualizado a seguir, conforme imagem capturada no novo Painel Estatísticas Censo Escolar da Educação BásicaAbre em uma nova guia do Inep.
Para uma análise mais abrangente sobre as diferenças entre meninos e meninas quanto ao acesso e frequência à escola e a evasão escolar, acesse aquiAbre em uma nova guia. Você também encontra mais conteúdos sobre a temática na seção CEDOC, como no capítulo 4 da publicação Jovens e o Ensino Médio: desafios para a educação brasileiraAbre em uma nova guia, produzida pelo Instituto Unibanco.
Os jovens que não trabalham nem estudam
Estudos internacionais mostram que a escolaridade é uma variável-chave na obtenção de progresso econômico e de bem-estar para um país e seus cidadãos. Isso quer dizer que pessoas escolarizadas ocupam os melhores postos e têm menos probabilidade de se tornarem desempregadas.
Isso significa também que um nível maior de escolaridade faz com que o trabalhador tenha maiores salários e maiores taxas de crescimento econômico. E não só isso: para além de aspectos financeiros, a escolaridade é associada a benefícios não-econômicos: redução da criminalidade, segurança, saúde, redução dos números de gravidez na adolescência, etc. Nesse sentido, alguns números brasileiros preocupam.
Havia no país, em 2023, um total de 48,5 milhões de pessoas na faixa etária de 15 a 29 anos de idade. Dentre estas, 40,8% estudavam ou se qualificavam e uma parcela significativa desta juventude (15,3%) encontrava-se também inserida no mercado de trabalho, conforme exibe o gráfico a seguir, extraído da Pnad Contínua Educação daquele ano. Entretanto, 19,8% das pessoas de 15 a 29 anos não estavam ocupadas nem estudando, perfazendo cerca de 9,6 milhões de jovens dissociados de uma trajetória formativa ou produtiva. Para se ter uma ideia do que esse indicador representa, trata-se de um contingente que equivale à população inteira da Hungria.
Dados da PNAD 2023 Abre em uma nova guia, demonstram como os índices de desocupação dos jovens são mais preocupantes entre mulheres (52,8%, sendo que 25,6% não estudavam, além de não estarem ocupadas) e pessoas pretas ou pardas (47,3%, sendo que 22,4% também não estudavam). Ambas as incidências são superiores à média Brasil em termos do percentual de não ocupação, que era de 45,3% entre as pessoas de 15 a 29 anos, e também da condição de não trabalhar nem estudar.
Diante dos incontáveis benefícios futuros, é preciso que a escola, poder público e sociedade reforcem incansavelmente o valor da educação para sua população jovem. Ter quase um quarto desse grupo evadido da escola em casa e sem trabalhar mostra que, além de questões econômicas, uma possível falta de interesse pelo ambiente escolar, que não é atrativo para o aluno, tem pesado fortemente nas decisões dos jovens em parar de frequentar a escola.
Como forma de enfrentar essa situação, o MEC liderou o lançamento, em novembro de 2023, de uma ação interministerial e intersetorial chamada programa Pé-de-Meia. A iniciativa oferece incentivo financeiro para estudantes matriculados no ensino médio público beneficiários do Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), de modo a fomentar a permanência e a conclusão escolar de estudantes nessa etapa de ensino. O objetivo é democratizar o acesso e reduzir a desigualdade social entre os jovens, além de promover a inclusão educacional e estimular a mobilidade social.
O programa Pé-de-Meia funciona da seguinte maneira: ao comprovar matrícula e frequência, o estudante recebe sob forma de poupança o pagamento de um incentivo mensal de R$ 200, que pode ser sacado em qualquer momento. No caso da Educação de Jovens e Adultos (EJA), ao comprovar sua matrícula, o estudante recebe um incentivo de R$ 200 e o aporte mensal de R$ 225 pela frequência, ambos disponíveis também para saque. Além disso, o beneficiário do Pé-de-Meia recebe R$ 1.000 ao final de cada ano concluído, que só podem ser retirados da poupança após a formatura no ensino médio. Considerando as parcelas de incentivo, os depósitos anuais e o adicional de R$ 200 pela participação no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), os valores chegam a R$ 9.200 por aluno.
A evasão de jovens LGBTQIAPN+
O ambiente escolar é um microcosmos da sociedade, muitas vezes reproduzindo desigualdades e padrões sistêmicos de exclusão, que segrega os sujeitos e comunidades que não se adequam aos padrões de identidade de gênero e orientação sexual predominantes.
A discriminação sofrida pela orientação sexual de jovens é um dos motivos para o abandono escolar de pessoas LGBTQIAPN+. Segundo o pesquisador em diversidade sexual Toni Reis, a cultura heteronormativa prescreve que “a pessoa tem que ser heterossexual e quem rompe com essa barreira acaba sofrendo as consequências: chacota, preconceito, discriminação e a violência”.
Sendo a escola um reflexo do mundo, um espaço para o debate e o acolhimento da diversidade, como a educação pode colaborar para o enfrentamento da exclusão escolar de pessoas LGBTQIAPN+? Confira o vídeo completo do Conexão Futura sobre Evasão de Jovens LGBTs disponível no CEDOCAbre em uma nova guia.
Se observada a experiência vivida pelas pessoas trans e travestis, a valorização e respeito à diversidade se mostra ainda mais essencial. O respeito ao nome social e a garantia ao uso do banheiro próprio à identidade de gênero das pessoas trans e travestis, por exemplo, são medidas mínimas que podem auxiliar o enfrentamento à transfobia no espaço escolar. A transfobia caracteriza-se como todo ato, discurso, preconceito, política ou postura discriminatória contra pessoas trans e travestis.
Lamentavelmente, os dados oficiais do Censo Escolar e da Pnad ainda não incluem os indicadores de identidade de gênero e orientação sexual, dificultando ainda mais a elaboração de políticas públicas e estratégias pedagógicas adequadas. Contudo, diversas pesquisas e estudos alertam para a gravidade deste cenário. Com efeito, estimativa levantada em 2016 pelo defensor público João Paulo Carvalho Dias,Abre em uma nova guia que foi presidente da Comissão da Diversidade Sexual da Ordem dos Advogados do Brasil do Mato Grosso (OAB/MT), apontou que, no Brasil, 82% das pessoas trans e travestis tenham abandonado os estudos ainda na educação básica.
A gravidade dos índices de evasão da população trans é um dos indicadores utilizados por pesquisadores para definir esse processo como uma verdadeira exclusão, fruto de uma pedagogia da violência. O conceito de pedagogia da violência foi elaborado pela pesquisadora Luma Nogueira de Andrade, primeira pessoa trans a concluir o doutorado em rede pública no Brasil. Em entrevista concedida em 2019 à revista Capitu (grupo Estado), a especialista abordou a exclusão das pessoas trans do espaço escolar como um processo de “evasão involuntária”: Abre em uma nova guia
“Por não nos enquadrarmos dentro dessa ordem, passamos por um processo de exclusão tão bárbaro que passei a nomeá-lo na minha tese como pedagogia da violência. É um tipo de pedagogia que vai tentar ensinar as pessoas a ter uma forma de comportamento de acordo com os padrões conservadores, nem que precise usar de violência física, psicológica, moral e todos os outros seus aspectos. Quando fui a campo entender por que as meninas não iam à escola, descobri que aquilo se dava por elas não terem a oportunidade de ser elas mesmas. Nos dados da Secretaria de Educação, esses casos constam como evasão, o que culpabiliza a pessoa. Então, eu utilizo o conceito de ‘evasão involuntária’, porque não é algo desejado pela estudante, mas sim imposto.”
A evasão no período noturno
De acordo com o Censo Escolar 2023, das 7,7 milhões de matrículas contabilizadas no ensino médio, 1,1 milhão (15,2%) estão no período noturno. O jovem que se matricula no período noturno possui particularidades e um perfil diferenciado dos estudantes que estudam durante o dia. Entender as demandas destes casos é o primeiro passo para criar soluções na redução do abandono escolar.
Dados mais detalhados, coletados pelo Observatório de Educação em microdados do Censo Escolar 2020Abre em uma nova guia , indicam que a taxa de abandono do ensino médio noturno foi de 4,9% naquele ano. A 1ª série era a que apresentava a maior taxa de abandono dentro da etapa educacional, de 6,3%. Confira aqui mais dados a esse respeito em “Taxa de abandono noturno na rede pública de ensino médio”Abre em uma nova guia.
Que medidas o educador do período noturno pode tomar para que o aluno não perca o interesse na educação escolar? Sheylla Barros, coordenadora pedagógica da E.E. Santo Afonso, no CearáAbre em uma nova guia, explica no vídeo abaixo os principais desafios do ensino noturno e as medidas tomadas pelos professores para evitar a evasão dos estudantes.
Antes com turmas fechadas, os gestores da escola perceberam que demonstrar interesse na situação do estudante, tentar uma aproximação e monitorar a frequência, faria com que a escola mantivesse suas turmas noturnas abertas e em pleno funcionamento.
A exclusão escolar de pessoas com deficiência
Historicamente, pessoas com deficiência tiveram o acesso à educação negado ou muito restringido Abre em uma nova guia. Apesar dos avanços nas últimas décadas e do aumento progressivo de matrículas, a exclusão escolar ainda atinge desproporcionalmente as crianças e jovens com deficiência.
O Brasil tem mais de 47 milhões de estudantes matriculados na educação básica. Destes, 1,7 milhão estão na educação especial, segundo dados de 2023 do Painel de Indicadores da Educação Especial Abre em uma nova guia da plataforma Diversa. O novo Painel Estatísticas Censo Escolar da Educação BásicaAbre em uma nova guia do Inep mostra a evolução das matrículas da educação especial desde 2014:
Pensando nas implicações diretas desse debate para a educação, o Instituto Rodrigo Mendes , referência na promoção de práticas inclusivas, organizou uma pesquisaAbre em uma nova guia em parceria com o Instituto Unibanco, analisando os dados do Censo Escolar 2016, no que tange aos estudantes com deficiência.
“Sendo conservador, estou usando uma estatística da Organização Mundial da Saúde, temos 15% da população com alguma deficiência. Hoje, no ensino médio brasileiro, somente 0,68% das matrículas é ocupada por pessoas desse segmento social. Precisamos mudar esse cenário.”
As restrições se davam através de modelos educacionais de segregação – quando a criança ou o adolescente é apartado do convívio com a sociedade e com a família e confinado a uma instituição – ou de integração, modelo no qual a pessoa com deficiência frequenta uma classe ou escola especial. A inclusão garante direitos e promove a aprendizagem, estimulando a autonomia e a independência das pessoas com deficiência em todas as fases da vida. Dessa forma, o Brasil estabeleceu na Meta 4 do Plano Nacional de Educação Abre em uma nova guia o objetivo de universalizar para a população de 4 a 17 anos com deficiência o acesso à educação de acordo com o modelo de inclusão. A abordagem prioriza o direito de todos os estudantes frequentarem as salas regulares, combatendo qualquer discriminação.
O superintendente do Instituto Unibanco, Ricardo Henriques, em participação no podcast Conselho de ClasseAbre em uma nova guia, falou sobre a importância da educação inclusiva no combate ao abandono e evasão de estudantes com deficiência. Para ele, a previsão de escolas e classes especiais:
“vai completamente na contramão das conquistas da educação inclusiva dos últimos anos no Brasil e no mundo. Os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável ( ODSAbre em uma nova guia) caminham na direção da educação inclusiva. Em 1998, nós tínhamos 340 mil estudantes com deficiência matriculados na escola, somente 13% estavam em escolas inclusivas. Em 2008 entrou em vigor uma política de educação especial e, a partir desse ano, o número de matrículas de pessoas com deficiência nas escolas comuns superou o da educação especial. Agora, em 2020, chegamos a 90% dos estudantes com deficiência matriculados em escolas comuns. Estamos falando de mais ou menos de 1 milhão e 300 mil de estudantes matriculados nas escolas.”
Leia mais sobre o processo histórico de exclusão escolar das pessoas com deficiência e a importância da Educação Inclusiva no conteúdo multimídia disponível na seção Em Debate sobre esse temaAbre em uma nova guia.
Qual o papel da gestão escolar para evitar o abandono e a evasão?
Conforme abordado anteriormente, os jovens que evadem a escola, em sua maioria, por razões econômicas ou familiares. Esses são fatores externos e que exigem uma abordagem ativa e direta dos gestores para evitar o abandono e a evasão.
Interações negativas com professores, dificuldade de aprendizado, repetências, preconceito e questões emocionais presentes na adolescência podem ser a causa destas evasões. Neste sentido, tornar a escola mais interessante e atrativa aos alunos é um passo fundamental para que o estudante se mantenha no ambiente escolar.
Um estudo realizado pelo Instituto Unibanco em parceria com a Universidade de São Paulo revela que escolas com sinais de depredação alcançam médias maiores de abandono escolar. Isso não significa que reformar a escola evitaria esse abandono, mas nos faz pensar sobre questões mais subjetivas como a capacidade de gestão do diretor da escola ou outras características não observáveis dos alunos. Leia o artigo "Ensino Médio: como aumentar a atratividade e evitar a evasão?" na seção CEDOCAbre em uma nova guia.
“A evasão não é um ato repentino, mas fruto de um processo lento de desengajamento do estudante da escola” Reynaldo Fernandes, autor do estudo “Ensino Médio: como aumentar a atratividade e evitar a evasão?”.
Maria do Socorro Lima de Freitas, diretora da E.E.F.M Professor Aloysio Barros Leal (Fortaleza-CE), fala sobre as ações que que implementou na escola para motivar estudantes.
Neste sentido, o papel da gestão escolar se mostra completamente necessário. As ações propostas vão muito além de medidas para gerar o interesse dos alunos. Desenvolvem também habilidades que causarão uma transformação social, um incentivo para que alunos queiram mudar sua realidade. A partir de um olhar que identifica e valoriza as diversidades que compõem sua escola, cada gestor pode atuar e implementar medidas que ajudem todo estudante a aumentar seu interesse nos assuntos relacionados à educação e entender sua função na construção de um futuro promissor. Tal papel mostra-se ainda mais relevante no atual contexto, que o distanciamento e a necessidade de utilização de meios e estratégias remotos acentuam as desigualdades e podem intensificar casos de evasão.
Pandemia de covid-19: abandono e evasão escolar em contextos de crise
A proporção que a pandemia de covid-19 tomou no Brasil afetou diretamente os calendários escolares, de modo que, enquanto a média mundial de paralisação das aulas foi de cinco meses e meio, por aqui permaneceu-se sem atividades presenciais por mais de um anoAbre em uma nova guia. De acordo com um estudo da Fundação Lemann , o Brasil foi o quinto país do mundo com maior número de dias de interrupção das atividades escolares presenciais. Ao todo foram 267 dias de fechamento das escolas, apenas 23 dias a menos que o Panamá, país que lidera o ranking.
No primeiro semestre de 2021, o Unicef elaborou um documento Abre em uma nova guia alertando para os efeitos da pandemia nos índices de exclusão escolar no Brasil. De acordo com o Censo Escolar, no final de 2020 mais de 5 milhões de crianças e adolescentes entre 6 e 17 anos estavam fora da escola. Desses, mais de 40% se encontravam na faixa dos 6 aos 10 anos, grupo etário no qual o acesso à educação era praticamente universal antes da covid-19.
A exclusão escolar, que esteve em queda entre 2016 e 2019, voltou a crescer, sobretudo entre os grupos etários de maior risco: entre 4 e 5 anos e de 15 a 17 anos. Além dessas faixas etárias, o Censo Escolar 2020 indicou que crianças e adolescentes negros e indígenas, os que viviam em áreas rurais e aqueles cujas famílias possuíam menor renda foram ainda mais afetados, constituindo mais de 70% daqueles que estavam fora da escola.
De acordo com nota técnica divulgada pelo Todos Pela EducaçãoAbre em uma nova guia, a experiência de redes escolares de diferentes países e regiões que passaram por longos períodos de interrupção forçada demonstrou que os efeitos daquele momento serão não apenas múltiplos, como duradouros e transversais à comunidade escolar, afetando famílias, estudantes e profissionais da educação. Mesmo com ações estratégicas de mitigação, impactos cognitivos, físicos e emocionais de longo prazo devem ser esperados, afetando não apenas os índices de aprendizagem, mas principalmente o engajamento dos estudantes.
No cenário de volta das atividades presenciais, as comunidades escolares se viram diante de grandes desafios e a comunicação Abre em uma nova guia se transformou em uma ferramenta-chave para mitigar os efeitos da crise na educação. Estreitar ou até mesmo recuperar vínculos perdidos, garantir a segurança de todos e retomar os processos de aprendizagem, enfrentando os riscos do retrocesso, do abandono e da evasão, foram e ainda são questões que se colocaram aos gestores nos diferentes contextos do nosso país.
Para aprofundar o debate sobre os impactos da pandemia nos índices de abandono e evasão escolar e os caminhos para o retorno seguro às atividades presenciais, assista à videoconferência “Desafios Para a Reabertura Segura Das Escolas”Abre em uma nova guia, promovida pelo canal Conviva Educação. Acesse também o conteúdo multimídia da seção Em Debate sobre o tema.
Além disso, confira o webinário promovido pelo Instituto Unibanco em parceria com o Unicef, que reuniu especialistas e gestores para debater quais estratégias são fundamentais para reduzir o abandono e a evasão no contexto da retomada das atividades presenciais.
Busca Ativa: intersetorialidade para combater a evasão escolar
Como vimos, muitos são os fatores que contribuem para o abandono e a evasão, sempre articulados às desigualdades estruturais de nosso país. E, com o advento da covid-19, a situação se complicou ainda mais. Foi em resposta a esse cenário que o Unicef criou a Busca Ativa EscolarAbre em uma nova guia, uma metodologia intersetorial de enfrentamento e prevenção ao abandono e evasão de crianças e adolescentes da educação básica, em parceria com secretarias municipais tanto de Educação quanto de Saúde e Assistência Social.
Como destacado em um dos guias da Busca Ativa, a complexidade dos fatores que impedem o acesso de crianças e jovens à educação demanda uma resposta integrada dos serviços e agentes públicos. Nesse sentido, o método consiste em formar gestores e educadores enquanto agentes comunitários capazes não apenas de monitorar estudantes em risco e abandono como também de desenvolver estratégias coerentes com as realidades locais.
Além de ser uma metodologia integrada entre serviços públicos, a Busca Ativa compreende uma plataforma on-line e gratuita que desde 2017 mobiliza setores do poder público e da sociedade para garantir o acesso à educação. Ao compreender que as razões que mantêm crianças e adolescentes fora da escola não estão reduzidas a fatores meramente pedagógicos, a metodologia da Busca Ativa propõe respostas multissetoriais, qualificando os gestores para a identificação das causas da evasão e para a elaboração de estratégias eficazes.
Atualmente, a iniciativa está presente em cerca de 3,5 municípios de 20 estados do país, além de ter elaborado uma estratégia específica para atuação no contexto da pandemia de covid-19 através do Guia Busca Ativa Escolar em Crises e Emergência. Desde que a estratégia foi lançada, em julho de 2017, até julho de 2024, os municípios e estados que aderiram à Busca Ativa Escolar registraram mais de 530 mil casos de crianças e adolescentes em risco de abandono ou que já estavam fora da escola. Destes, 292.833 foram matriculados ou rematriculados, sendo que 12.800 tinham de 0 a 3 anos; 39.350 de 4 e 5 anos; 96.943 de 6 a 10 anos; 71.141 de 11 a 14 anos; 56.617 de 15 a 17 anos; e 15.982 acima de 18 anosAbre em uma nova guia.
Cada rede de ensino adotou ao longo da pandemia estratégias próprias para alcançar os estudantes, levando em conta as peculiaridades de cada região, seja ela urbana ou rural. Essas estratégias englobam desde a parceria com o Unicef até o uso de algoritmos para a identificação de alunos em situação de risco e a contratação de empresas de transporte para buscar e entregar material didático impresso na casa dos estudantes.
A websérie "Nunca Me Sonharam" abordou o impacto desta metodologia para as comunidades escolares, com foco no Ensino Médio. Quando a gestão educacional empreende a Busca Ativa pelos que desistiram da escola, isso tem uma força que contagia a comunidade e explicita que a escola se importa com a vida e a trajetória de cada um deles. Você pode assistir abaixo o episódio sobre o combate à evasão e ao abandono e as estratégias para a manutenção dos estudantes na escola.
Confira também nosso conteúdo sobre Busca Ativa na seção Em Debate.Abre em uma nova guia
Bons exemplos de estratégias para evitar o problema da evasão e do abandono
A decisão de evadir a escola não acontece de uma hora para outra. Evadir é um processo lento de desinteresse em relação à escola. Faltas, repetências, deixar de realizar tarefas, são demonstrações de desengajamento que podem identificar os alunos que precisam de um cuidado especial neste sentido e demonstrar uma necessidade de atuação direta com eles.
Desenvolver e implementar ações de busca ativa, incentivar e possibilitar maior participação juvenil – com consequente melhoria do clima escolar –, aproximar e envolver a comunidade escolar, promover maior diálogo com as famílias, além de desenvolver ações focalizadas na questão racial, são alguns dos exemplos das ações de combate ao abandono e à evasão.
Evandro Souza, Diretor da Unidade Escolar Benjamin Batista, de Teresina - PI, afirma que medidas adotadas fizeram com que a evasão escolar reduzisse de 19% para pouco mais de 1% em nove anos. Neste vídeo, ele explica sobre como uma gestão participativa na escola influencia na permanência dos estudantes e diminui os casos de evasão e abandono escolar:
As monitorias também foram de extrema importância para a redução da evasão escolar na Unidade Escolar Dona Rosaura Muniz Barreto, localizada em São Miguel do Tapuio-PI. A gestora Maria Deusilene Marques Gomes conta no vídeo como projeto de monitoria contribuiu para a mudança deste cenário.
Já o gestor Aziz Ramos, da E.M.E.F. Oziel Alves Pereira, localizada em Campinas-SP, implementou em toda a escola projeto de valorização da identidade negra e promoção de diálogo sobre o racismo. Ele descreve no vídeo como o projeto nasceu e os impactos positivos gerados no clima, medida que combate e previne possíveis casos de abandono.
Uma das questões que pode mitigar a evasão escolar é a melhora da comunicação entre a escola e a família do estudante. Vários estudos mostram que, também em virtude de características socioeconômicas, estudantes que têm pais mais envolvidos em suas vidas escolares possuem melhor desempenho escolar. Ricardo Paterlini, gestor da E.E.E.F.M Coronel Gomes de Oliveira, de Anchieta-ES, mostra como a escola melhorou a relação com as famílias dos estudantes:
Este é um momento importante para pensar nestas questões, já que a pandemia da covid-19 tirou os jovens de dentro do ambiente físico escolar. E a volta deles para dentro da sala de aula ainda é recente. Neste sentido, as ações intersetoriais e comunicação podem ser chaves para mitigar o aumento do abandono e da evasão. Confira no texto do Observatório de Educação, na seção Em DebateAbre em uma nova guia. Leia também o texto “O delicado percurso de volta à escola em tempos de pandemia”Abre em uma nova guia.
Em 2008, o índice de evasão da E.E.M Liceu do Conjunto Ceará chegou a 10,5%, um dos piores índices do estado. Maria do Socorro Nogueira de Paula, diretora da escola, se dedicou a mudar este patamar. Realizando as chamadas e incentivando colegas de turma a contatar estudantes com maior número de faltas, falando com as famílias e realizando visitas presenciais a escola conseguiu reverter este quadro.
Tornar o clima da escola mais agradável e bem cuidado é parte de um plano para manter os alunos dentro do ambiente escolar. Envolver estudantes e a comunidade escolar foi a forma que a gestora do E.E.F.M Visconde do Rio Branco, Alnedi Costa Lima, encontrou para evitar a evasão e o abandono. No vídeo, ela explica a prática adotada para tornar a escola mais atrativa.
O diretor José Idelson Escorcio, do colégio Hesíchia de Sousa Brito, em Piracuruca no Piauí, conta que estratégias usou para levar a educação não presencial aos estudantes mesmo em áreas distantes da cidade. Fala também da importância da valorização dos estudantes para que atravessem o tempo afastado estimulados com o estudo e o preparo para o ENEM e de ações para que no retorno não haja evasão e a perda deste período seja minimizada.
Quer saber mais sobre evasão e abandono escolar? Confira os links ao longo desta página e acesse com mais profundidade cada tema abordado nos conteúdos do Observatório de Educação. Confira outros conteúdos exclusivos no nosso Instagram @institutounibancoAbre em uma nova guia.
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