Diagnóstico das desigualdades é tema de coleção
08/09/2020
CURADORIA: Instituto Unibanco
Introdução
A coleção Diagnóstico das Desigualdades na Escola convida os profissionais de educação a ampliar o seu repertório e refletir sobre algumas questões que deveriam perpassar a construção do diagnóstico escolar durante a etapa de planejamento.
No processo de elaboração de um diagnóstico aderente às necessidades pedagógicas dos estudantes, é importante que as equipes pedagógica e gestora da escola se questionem sobre os elementos que constituem o ambiente escolar e as relações com e entre os estudantes. Que aspectos podem contribuir para ampliar o conhecimento sobre os estudantes da escola? Em que medida a diversidade do corpo discente influencia a elaboração de estratégias pedagógicas? A escola reflete sobre a situação social do seu entorno e preocupa-se com a reprodução das desigualdades no espaço escolar? Essas questões contribuem para a construção do diagnóstico?
Por considerar que essas questões são relevantes para qualificar o diagnóstico escolar, selecionamos um conjunto de documentos nesta coleção, com contribuições distintas, que tratam: i) da correlação entre aprendizagem/escolarização e as identidades dos estudantes, principalmente vinculadas ao seu pertencimento étnico-racial e diversidade sexual; ii) das características e condições socioeconômicas do território do entorno da escola.
A discussão é um pontapé inicial para ampliar a visão sobre tais aspectos constituintes dos padrões de desigualdades em nossa sociedade, os quais precisam ser estudados e compreendidos pelas equipes pedagógica e gestora da escola com o intuito de não reproduzi-los nem aprofundar as disparidades de aprendizagem dos estudantes.
O conjunto de documentos reunidos nesta coleção é um caminho possível para iniciar pesquisas sobre as problemáticas indicadas e levanta evidências para a produção de um diagnóstico qualificado, que auxilie na fundamentação de ações pedagógicas mais assertivas, a fim de garantir o direito de aprendizagem de todos e todas estudantes. Trata-se de um repertório particularmente importante sobre as desigualdades que compõem a sociedade e se refletem no espaço da escola.
Para começar, indicamos o vídeo Gestão Escolar 28 - Importância do diagnóstico para a coordenação pedagógica, realizado pela Fundação Victor Civita. Nele, destaca-se que uma das funções do diagnóstico é conhecer quem são os estudantes da escola a partir de suas características de aprendizagem, verificadas pelas evidências dos indicadores educacionais e das avaliações internas e externas da escola. Segundo o relato de uma coordenadora pedagógica, “a escola não pode levar susto”. Além disso, o diagnóstico serve para disseminar a informação entre os professores. Dessa forma, é possível pensar coletivamente em melhorias no processo de ensino-aprendizagem e propor ações para compor um plano da escola focado em atender às necessidades de aprendizagem dos estudantes.
Na sequência, propomos incorporar ao diagnóstico escolar o recorte racial no levantamento das características dos estudantes, visando compreender como as desigualdades de performance entre estudantes negros e brancos são verificadas historicamente através dos indicadores sociais e educacionais. Essa é a abordagem do vídeo Conversa com Marcelo Paixão sobre Desigualdade Racial, produzido pelo Instituto Unibanco, no qual o professor da Universidade do Texas afirma que existem muitas evidências que ajudam os gestores a planejar a partir do reconhecimento das desigualdades entre negros e brancos na sua escola.
Ao longo do vídeo são indicadas diversas bases de dados produzidas no Brasil que devem ser acessadas pelos gestores escolares e gestores públicos da educação para qualificar o diagnóstico. Para auxiliar o gestor escolar, o vídeo é acompanhado de um roteiro de análise de indicadores educacionais (que pode ser baixado na seção Em Debate), com o qual é possível fazer um exercício reflexivo de análise de dados a partir do recorte racial. O argumento de Marcelo Paixão ressalta a importância de análises com esse viés para demonstrar que o racismo não está apenas no campo da percepção, pois existem dados que comprovam seus efeitos perversos na trajetória escolar dos estudantes negros na Educação Básica e Superior, perpetuando desigualdades de acesso e oportunidade aos direitos sociais, entre eles o direito à aprendizagem.
Um estudo sugerido para exemplificar a constatação das desigualdades de aprendizagem considerando o recorte racial é a dissertação Raça e desempenho escolar: uma análise comparativa do desempenho de crianças negras e brancas em escolas integrantes do Projeto Geres em Salvador – BA, de autoria de Andreia Cardoso Silveira e desenvolvido na Universidade Federal da Bahia (UFBA). A pesquisa está fundamentada em dados quantitativos e qualitativos (entrevistas com estudantes e professores). A leitura deste trabalho pode inspirar os gestores escolares do Ensino Médio a pensar sobre tais questões no seu contexto, na medida em que reforça a importância de compreender as relações étnico-raciais como um dos aspectos centrais para entender o processo de reprodução das desigualdades educacionais.
Recomendamos também o artigo Jovens em contextos sociais desfavoráveis e sucesso escolar no Ensino Médio, dos autores Fernando Tavares Júnior e Vanessa Gomes de Castro, da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). O texto explora os dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) relacionados ao capital social da família dos estudantes e algumas características dos jovens de contextos sociais desfavoráveis que tiveram sucesso escolar – compreendido como a conclusão da 3ª série do Ensino Médio. O argumento principal é o de que, apesar das condições desfavoráveis, muitos jovens avançam na sua escolarização contrapondo-se à perspectiva do determinismo social difundida no senso comum. O convite à leitura está resumido nesta passagem: "Conhecer melhor o perfil desses jovens pode ajudar as escolas a melhor se adaptarem a esses alunos, principalmente amortecendo os efeitos da origem social desfavorável sobre sua trajetória escolar".
Por fim, o território é uma dimensão extraescolar que não pode ser ignorada na construção do diagnóstico, pois as características socioculturais da população, a rede de serviços, as questões de segurança pública e infraestrutura do bairro podem interferir na qualidade da oferta da educação. A escola, a metrópole e a vizinhança vulnerável, dos autores de Mauricio Ernica e Antônio Augusto Gomes Batista, da Fundação Carlos Chagas, é um artigo que aborda de maneira ampliada o efeito do território sobre a qualidade da oferta educacional das escolas em áreas vulneráveis e, consequentemente, seu impacto sobre a aprendizagem dos estudantes. A pesquisa foi realizada em uma subprefeitura de São Paulo e usou dados do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e do Saeb das escolas.
A seleção de documentos desta coleção demonstra algumas conexões potentes entre as temáticas indicadas para aprofundar os estudos sobre elas, refina o olhar dos gestores e afirma o compromisso da escola para o enfrentamento das desigualdades educacionais baseada no uso de evidências, dando consistência ao planejamento pedagógico e reforçando o princípio da equidade na gestão escolar, de forma a buscar o desenvolvimento pleno de todos os estudantes.