Musical inclusivo valoriza as diferenças
Resumo da solução
A inclusão de alunos surdos na Escola Estadual Cid Boucault, em Mogi das Cruzes (SP), esbarrava tanto no desconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras) por parte de colegas e professores quanto no despreparo docente para promover atividades inclusivas. Diante dessa realidade, a professora intérprete Kelly Cordeiro passou a ensinar Libras para os demais estudantes e educadores. Ao mesmo tempo, o núcleo de teatro da escola, que encena uma peça por ano, organizou um musical bilíngue com a participação de uma aluna surda. O resultado foi um enorme avanço em termos de integração e fortalecimento de laços entre toda a comunidade escolar.
Depoimento completo:
A escola Estadual Professor Cid Boucault fica no distrito de Jundiapeba, em Mogi das Cruzes, leste da grande São Paulo. Atendemos todas as turmas do Ensino Médio nos períodos da manhã, tarde e noite, com 1.800 alunas e alunos matriculados, dentre eles estudantes surdos.
Havia grandes expectativas em relação ao trabalho colaborativo das professoras intérpretes com os outros membros do corpo docente para a multiplicação de práticas inclusivas no cotidiano da escola.
Ao participarmos da formação Ensino Médio Inclusivo (EMI), do Instituto Rodrigo Mendes, também no ano de 2018, identificamos que, mesmo com 10 estudantes surdos matriculados em nossa escola, eles não estavam verdadeiramente incluídos: não havia socialização com os colegas, pois nenhuma das partes sabia como se comunicar com a outra. Além disso, os educadores ainda enxergavam a educação inclusiva como um tabu, algo que não tínhamos a capacidade ou a formação para realizar corretamente.
A aluna Bia*, do segundo ano, é surda e não conseguia fazer amigos, além de enfrentar preconceitos por parte de alguns estudantes. Ela não demonstrava interesse nas atividades escolares, tirava notas baixas e faltava com frequência. Além disso, outros estudantes também sofriam bullying e/ou estavam passando por quadros depressivos, tendo ocorrido inclusive tentativas de suicídio.
Como idealizamos o projeto
Nosso desafio se tornou elaborar um projeto que fizesse com que os alunos com e sem deficiência desenvolvessem um sentimento de pertencimento ao grupo escolar, como também identificassem e valorizassem as potencialidades de si mesmo e dos colegas. Decidimos então realizar o projeto a partir de um interesse dos estudantes.
Em nossa escola, os jovens demonstram muita riqueza em suas manifestações artísticas e já temos um programa cultural bastante consolidado. Há nove anos as turmas realizam peças teatrais anualmente.
Com o EMI, então, os projetos culturais começaram a ser pensados com acessibilidade, para que os alunos realizassem as atividades trabalhando em conjunto, para verificar que não existem diferenças e dificuldades em se expressar quando há igualdade de acesso e participação. O projeto almejou um trabalho colaborativo e interdisciplinar, aproveitando os diversos talentos dos estudantes para a execução de um musical inclusivo. Todo o corpo docente se comprometeu com estratégias pedagógicas inclusivas no ambiente escolar.
Desenvolvimento do projeto
A professora intérprete Kelly Cordeiro passou a dar aulas de Libras para todos o corpo discente e docente da escola. Essa prática despertou um interesse geral pela língua. Os estudantes com e sem deficiência começaram a ultrapassar a barreira da linguagem, aprendendo com as aulas e com a convivência.
Os alunos do segundo ano se organizaram e criaram uma peça musical inclusiva a partir de uma releitura de Romeu e Julieta, incorporando temas importantes para a turma, como a transexualidade, a migração nordestina, a desigualdade social, a depressão e o suicídio. A atuação na peça contemplava a interpretação em e português e em Libras pelos próprios atores, que também cantavam e dançavam.
Toda a escola vivenciou as ações desenvolvidas. Muitos professores compreenderam a importância de favorecer a equidade e o empoderamento dos jovens, valorizando as potencialidades e singularidades de cada um.
Em todas as ações, tivemos a cooperação de alunos que se esforçaram para que tudo saísse com maestria, o que de fato aconteceu, gerando reconhecimento até mesmo fora da comunidade escolar.
A aluna Bia se transformou no ambiente escolar: quando recebeu responsabilidades e encontrou maneiras de se comunicar com os colegas, demonstrou uma melhora excepcional em sua autoestima. Suas notas melhoraram e ela parou de faltar, ficando na escola por mais tempo do que o período obrigatório.
A experiência do musical foi maravilhosa! Esperamos continuar com a ação para que todos continuem treinando a língua brasileira de sinais e adquiram fluência. Agradecemos a oportunidade de termos testado nossos conhecimentos recém-adquiridos na formação e pretendemos multiplicar a ação para que se torne prioritária na rotina de nossa escola.
* nome fictício.
OBS.: Este relato de experiência é fruto da participação dos autores na edição 2018 do Ensino Médio inclusivo – formação oferecida pelo Instituto Rodrigo Mendes e pelo Instituto Unibanco, com objetivo de apoiar equipes multidisciplinares das redes de educação no planejamento de políticas públicas para a garantia de acesso, permanência e aprendizagem dos estudantes público-alvo da educação especial. O depoimento foi originalmente publicado na seção de relatos de experiências da plataforma Diversa, uma iniciativa do Instituto Rodrigo Mendes em parceria com o MEC e diferentes organizações comprometidas com o tema da equidade com o objetivo de apoiar redes de ensino no atendimento de estudantes com deficiência em escolas comuns.
Depoimento por: ELAINE CRISTINA DE SOUZA ALVIM, KELLY CORDEIRO, MÁRCIA ROSANA SOARES DOS SANTOS E RAFAEL ÂNGELO
Instituição: Escola Estadual Professor Cid Boucault )
TEMAS TRABALHADOS:
Educação inclusiva; Bullying
Para saber mais sobre o tema:
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