É justo pensar que quando a Câmara dos Deputados põe em votação uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para tornar permanente o principal mecanismo de financiamento da educação pública brasileira a pauta cresça no país.

Como consequência, também é esperado que esse mesmo assunto se destaque na cobertura setorial de educação – e isso aconteceu na imprensa em julho com a aprovação, em dois turnos, da PEC 15/2015, a PEC do novo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb).

Ponto fora da curva, a seleção de clippings republicados pelo Radar de Imprensa no período totalizou 383 textos, considerando gêneros informativos e opinativos. Foi quase o dobro da média mensal de 200 clippings reproduzidos na seção, extraídos sempre dos mesmos veículos monitorados nas temáticas de interesse do Observatório de Educação.

Falou-se muito de novo em pandemia (cerca de um terço das inserções). E isso tem sido assim na imprensa desde março, quando as aulas presenciais foram interrompidas por causa da Covid-19 no Brasil. Desta vez, as atenções voltaram-se aos planos e discussões sobre a retomada das atividades presenciais. Logo atrás da pandemia, a segunda pauta mais trabalhada foi o Fundeb, com a maioria das publicações saindo a partir de 21 de julho, dia em que se votou a PEC 15/2015.

Junto com estes assuntos, a amostra do Radar de Imprensa do Observatório de Educação revelou que a cobertura também priorizou tratar de equidade na educação, da crise de liderança do Ministério da Educação (MEC) e das condições de realização da edição 2020 do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

Sob a ótica da equidade
A questão da equidade transversalizou muitas pautas relacionadas à pandemia, expondo os entraves para as crianças e os adolescentes pobres exercerem seu direito ao aprendizado no ensino remoto. Foi o que se leu, por exemplo, na entrevista que Maria Helena Guimarães de Castro, membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), deu à Nova Escola: “Os governos estaduais precisam investir no acesso à internet para todas as escolas públicas do país, alunos e professores”.

Em meio à redefinição da agenda do Enem para o ano, a busca de maior equidade marcou novamente as discussões. O caso do jornal O Globo em “Enem: entenda como novas datas podem aprofundar desigualdades educacionais” ilustra esta situação, bem como do portal Porvir com “Para ser inclusivo, Enem pós-pandemia precisa ir além da mudança de data”.

Numa terceira frente de cobertura, o assunto da equidade descolou-se das pautas ligadas à pandemia e retomou aspectos estruturantes da política educacional brasileira quando a imprensa repercutiu o resultado de estudos e pesquisas:

A educação no centro da política
O noticiário sobre a crise de liderança do MEC acompanhou o processo hesitante de definição, pelo presidente Jair Bolsonaro, do novo ministro da Educação. Um mês se passou entre a saída de Abraham Weintraub, em meados de junho, a quase posse de Carlos Alberto Decotelli, dias depois, o convite a Renato Feder, no início de julho, a posterior testagem do major Vitor Hugo e, finalmente, a nomeação efetiva de Milton Ribeiro.

As chamadas na imprensa deram o compasso do drama: “Educação à deriva” (Folha de S.Paulo); “Bolsonaro quer definir novo ministro da Educação nesta sexta-feira” (O Globo); “Olavistas e militares fazem pressão para Bolsonaro desistir de Feder para o MEC” (UOL); “O Brasil só fala do MEC” (O Estado de S.Paulo); “Ministério da Educação segue sem comando” (G1); “Professor Milton Ribeiro é o novo ministro da Educação” (G1); e “Novo chefe do MEC traz alívio por aceitar o óbvio” (UOL).

Depois da posse de Milton Ribeiro, em 16 de julho, o eixo da cobertura se moveu para a aprovação do novo Fundeb. Com raras exceções (Adriano Naves de Brito, em “Para um novo Fundeb, o tempo não é agora”, na Folha de S.Paulo), a principal mensagem veiculada era de apoio à PEC 15/2015. Além do endosso declarado de ativistas da educação e de Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara dos Deputados, muitas outras vozes na política e em diferentes segmentos da sociedade se manifestaram na imprensa em favor da proposta.

Com a confusão da troca de ministros, o governo de Jair Bolsonaro, que nunca se dedicara à questão do Fundeb, se pronunciou tardiamente sobre o tema. O fim de semana que antecedeu à votação foi cheio de notícias sobre a contraproposta apresentada pelo Poder Executivo via pasta da Economia. “Governo propõe Fundeb só para 2022 e quer metade do recurso extra para transferência de renda”, sintetizou O Globo.

Nesse diálogo entre educação, política e economia, prevaleceu a posição do Centrão. No editorial “Vitória da boa política”, o Estado de S.Paulo fez o registro: “A Câmara dos Deputados deu mais uma mostra de que não tem faltado ao País quando o que está em discussão são projetos de grande interesse nacional. Em rápida sucessão, graças a um acordo entre os partidos, a Casa aprovou em dois turnos a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que torna permanente o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e aumenta o porcentual de contribuição da União dos atuais 10% para 23% até 2026, de forma escalonada. (...) O governo Bolsonaro não fez rigorosamente nada pela educação. Durante mais de um ano, Dorinha Seabra [relatora da PEC] foi olimpicamente ignorada pelo ex-ministro de triste memória Abraham Weintraub. Até que na noite do sábado passado o governo resolveu ter ideias sobre o Novo Fundeb, para transformá-lo num instrumento eleitoreiro. Não sem razão, foi alijado dos debates na Câmara, que acabou por lhe impor uma derrota acachapante”.

Sobre veículos, editorias e fontes
Em um mês com pautas tão abrangentes, a cobertura esteve distribuída de forma equilibrada entre os diferentes jornais/portais da grande imprensa monitorados pelo Observatório de Educação. Tais veículos perfizeram mais de 80% dos textos clipados em julho.

Jornais/portais da grande imprensa

Fonte: balanço produzido a partir do clipping da seção Radar de Imprensa / julho de 2020

Do ponto de vista das editorias, tirando as páginas de Educação, que reuniram quase metade da cobertura, 20,89% das inserções totais do clipping foram veiculadas nas seções de Política/Sociedade/Nacional, enquanto 13,84% estavam em Opinião e 10,70% em Economia/Empreendedorismo.

Editorias

Fonte: balanço produzido a partir do clipping da seção Radar de Imprensa / julho de 2020

Dos 383 textos clipados no mês, 54,3% registraram consulta expressa a porta-vozes. Em linha com o perfil de pautas do mês, a análise de conteúdo demonstrou maior escuta a fontes do Poder Executivo, seguido de representantes de organizações da sociedade civil, do meio acadêmico e do Poder Legislativo.

Porta-vozes consultados


Fonte: balanço produzido a partir do clipping da seção Radar de Imprensa / julho de 2020

No Poder Executivo, as fontes mais ouvidas foram, na ordem, o presidente da República, Jair Bolsonaro; o presidente do Inep, Alexandre Lopes; e o secretário executivo do MEC, Antonio Paulo Vogel. Entre as organizações da sociedade civil, destacaram-se o movimento Todos pela Educação, com diferentes representantes advogando pelo novo Fundeb, e a Campanha Nacional pelo Direito à Educação, nas vozes da coordenadora geral, Andressa Pellanda, e do dirigente Daniel Cara.

No meio acadêmico, as instituições mais buscadas foram a Universidade de São Paulo (USP) e o Insper. Por fim, no parlamento, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, como já dito, foi o mais procurado para falar da tramitação da PEC do Fundeb, seguido da deputada Dorinha Seabra (DEM-TO), relatora da PEC na Câmara, e do senador Flávio Arns (Rede-PR), relator no Senado.

No jornalismo opinativo, foram capturados 99 artigos e 16 editoriais. Cerca de um terço dos artigos foi veiculado nas editorias de Opinião propriamente, sendo o restante abrigado junto às seções de Educação, Política, Economia e outras. Nas diferentes formas de posicionamento dos jornais, sobressaíram, em igual proporção, os editoriais em tom de controle social/fiscalização/cobrança de atitudes e aqueles dedicados ao reconhecimento de avanços e progressos na educação.

Entre os primeiros, há críticas contundentes como em “Educação à deriva”, em que a Folha de S.Paulo condena o Poder Executivo pela condução desastrosa do Ministério da Educação (MEC). “A passagem fugaz de Carlos Decotelli pelo Ministério da Educação revela mais que o tropeço indesculpável, para um intelectual, de fabricar títulos e realizações. Episódio tão canhestro ilustra, sobretudo, a disfuncionalidade do governo que o pôs em marcha. (...) Há largo consenso sobre o papel decisivo da educação para o desenvolvimento do país, mas o MEC se encaminha para o quarto ministro em 18 meses de governo; tamanho descaso rebaixou expectativas ao nadir —será um alívio se não vier outro desequilibrado.”

Já na valorização do que deu certo, o exemplo veio de novo da Folha de S.Paulo, que, vale citar, assinou metade dos editoriais reproduzidos pelo Radar de Imprensa no mês. Em “Sobral, mais uma vez”, o jornal enaltece práticas que induziram este município cearense a atingir o topo de avaliações nacionais como o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). “Entre as medidas adotadas figuram prioridade para a alfabetização na idade certa; produção de material didático com treinamento para os docentes aprenderem a utilizá-lo com eficácia; criação de bônus financeiro para mestres e escolas com bom desempenho; autonomia para que diretores escolham os meios de alcançar metas claras e mensuráveis.”