Marcada pelo lançamento de vários estudos, cobertura de junho teve atenção dividida

A cobertura sobre a educação no mês de junho dispersou-se por uma miríade de pautas, sem que se possa afirmar que um assunto dominou a produção jornalística, ou se destacou verdadeiramente sobre os demais. Também se pôde constatar o lançamento simultâneo de vários estudos e pesquisas que orientaram os esforços de reportagem dos veículos.

Em separação didática, na amostra de 246 clippings analisados pela seção Radar de Imprensa, observou-se leve tendência para inserções relacionadas ao ensino médio e às juventudes, seguida por um segundo bloco voltado às políticas públicas educacionais e por um terceiro sobre os reflexos da pandemia na educação.

Do ponto de vista do tipo de cobertura realizada, os gêneros informativos, compostos por notas, notícias, reportagens e entrevistas pingue-pongue, somaram 82,1% das inserções. Os textos opinativos – notadamente artigos e editoriais – representaram 17,8% da amostra.

 

Fonte: Análise de clipping Radar de Imprensa (246 respostas)

 

A produção dos artigos de opinião acompanhou a dispersão geral da cobertura, tendo versado, na maioria dos casos, sobre os três assuntos citados. Os editoriais agregaram às notícias do momento o posicionamento dos jornais em favor de políticas públicas urgentes para reparar as perdas de oportunidade e de aprendizagem de crianças e jovens. Esta análise abordará os editoriais de junho em particular mais adiante.

Novo ensino médio, “nem-nem” e Enem

Com a proximidade da implementação do novo ensino médio, ganharam profundidade as discussões sobre como preparar melhor os jovens para o mercado de trabalho e para a vida. Em junho, houve vários artigos assinados por especialistas nesta direção:

A cobertura dos assuntos de interesse da juventude teve como reforço a divulgação de alguns estudos, entre os quais a pesquisa “Jovens: Projeções Populacionais, Percepções e Políticas Públicas”, do Centro de Políticas Públicas da FGV Social. O levantamento faz parte do projeto Atlas das Juventudes, que lançou um relatório em junho.

O estudo embasou a reportagem especial “Sem perspectivas, metade dos jovens quer deixar o Brasil” (Folha de S.Paulo, 20/06), assinada pelo colunista Fernando Canzian. “O Brasil nunca teve ou terá tantos jovens como agora. Mas o ápice dos cerca de 50 milhões de brasileiros entre 15 e 29 anos revela uma juventude decepcionada em níveis recordes, sem perspectiva de trabalho e insatisfeita com a condução do país”, pontuou o jornalista. O texto situa que nunca foi tão alta a proporção de jovens que nem trabalham nem estudam – há 27,1% dos chamados “nem-nem” – e  que 70% dos jovens têm dificuldade de encontrar trabalho.

Noutra vertente, a cobertura sobre o Enem 2021 cortou o mês fornecendo pílulas de informação sobre a próxima edição da avaliação. A maioria dos textos teve caráter de serviço, esclarecendo sobre as datas da prova, processo de inscrição, isenção de taxa, participação de treineiros, acessibilidade e o Enem digital.

No campo político, ressoou a declaração de Milton Ribeiro, ministro da Educação, indicando o desejo de conhecer previamente o conteúdo da prova para evitar o que ele chamou de “questões de cunho ideológico” (no UOL, em 03/06, “Contra ideologia, Ribeiro repete Bolsonaro e quer acesso antecipado ao Enem”).

A posição gerou polêmica e o ministro voltou atrás (“Ministro da Educação anuncia que abre mão de acesso às questões do Enem”, O Globo, 09/06). Dias depois, no que pareceu ser uma nova investida para a interferência na prova, a Folha de S.Paulo deu o furo de reportagem “MEC ignora área técnica e quer criar ‘tribunal ideológico’ do Enem” (17/06). A história fechou o mês de junho no ar.

 

Leis, políticas, equidade e o Plano Nacional de Educação (PNE)

O noticiário sobre políticas públicas educacionais captado pelo Radar de Imprensa refletiu assuntos controversos como o debate, em curso no Congresso Nacional, sobre a regulamentação da educação domiciliar (“homeschooling”); a indicação, pelo MEC, de cinco novos membros para o Conselho Consultivo do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) – entre os quais, um pastor e um militar; e a proposta do governo federal de se desfazer de parcela importante do acervo literário da Fundação Palmares.

Do ponto de vista de equidade educacional, merece destaque a derrubada do veto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao Projeto de Lei 3.477/2020, que instituiu o fornecimento gratuito de internet, com fins educacionais, a alunos em situação de vulnerabilidade social e a professores da educação básica pública. O veto foi derrubado no dia 1º de junho e a notícia repercutiu nos principais veículos a partir de então. Exemplos podem ser lidos no UOL, O Globo, Folha de S.Paulo e G1.

Como de costume, a abordagem sobre equidade perpassou o clipping, sobressaindo em inserções como o artigo “Cota não é esmola” (Folha de S.Paulo, 28/06) e a notícia “Metade do gasto público com educação superior no Brasil beneficia alunos mais ricos, diz OCDE”(O Estado de S.Paulo, 30/06) – esta última, fruto das conclusões do relatório “A Educação no Brasil: uma Perspectiva Internacional”.

Contudo, deixou a desejar a cobertura sobre o balanço do sétimo aniversário do Plano Nacional de Educação (PNE), divulgado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação por ocasião do dia 25 de junho. Concebido como política de Estado, o PNE é, com seu conjunto de diretrizes e metas para a educação brasileira, um instrumento de equidade educacional por excelência. Na seleção do Radar de Imprensa, apenas G1, UOL e os portais RBA – Rede Brasil Atual e Centro de Referência em Educação Integral abriram espaço para o assunto.

Um parêntese sobre editoriais

Dos seis editoriais contidos na amostra do Radar de Imprensa em junho, três tinham como tom o apontamento de atrasos e retrocessos, dois centravam-se em destacar os resultados de estudos e pesquisas e um tinha como mote o exercício do controle social. Todos os seis, porém, convergiam para a implementação de políticas públicas que garantam o direito à educação de crianças e jovens.

  • Em “Recuperar o ensino” (05/06), a Folha de S.Paulo repercutiu o novo estudo “Perda de Aprendizagem na Pandemia”, preparado pelo Instituto Unibanco e o Insper. O levantamento buscou saber quanto os alunos das redes estaduais que irão concluir o ensino médio em 2021 deixaram de aprender no ano passado por causa da crise sanitária. O editorial da Folha advogou pela volta do ensino presencial.
“Resta evidente a irresponsabilidade de preconizar reversão do que for possível em tamanho prejuízo apenas quando a pandemia acabar. Não existe tal opção, em que pese a omissão de um Ministério da Educação desmontado pelo presidente Jair Bolsonaro a golpes de desvario ideológico.
Cabe a governadores e prefeitos conter o descalabro. Mesmo que isso só seja factível em esquema híbrido, modulando a proporção entre aulas presenciais e remotas conforme a gravidade da epidemia de Covid-19 e o avanço da vacinação, seria crime de lesa-juventude permanecer paralisado.”
“Num país com uma desigualdade abissal e histórica, a educação é chave na busca de igualdade de oportunidades para crianças e jovens pobres. Uma mão de obra com déficit educacional é certeza de baixa produtividade e também de um crescimento medíocre do PIB no futuro. Por razões econômicas, sociais e até morais, municípios e estados, sob a orientação do Ministério da Educação, têm o dever de encarar esse desafio como prioridade.”
  • Em “Resgate de alunos” (11/06), O Estado de S.Paulo retomou o estudo “Cenário da Exclusão Escolar no Brasil”, lançado pelo Unicef e Cenpec em abril último, e defendeu a busca ativa dos alunos que evadiram por causa da pandemia.

“Entre os desafios que o Brasil terá de enfrentar, após a pandemia, está o de recolocar na escola 5,1 milhões de crianças e adolescentes que desistiram de estudar. (...) São números alarmantes, o que obriga o poder público, gestores escolares e entidades da área educacional ‘a ir atrás de cada criança e cada adolescente que está com seu direito à educação negado’, afirma a representante do Unicef no Brasil [Florence Bauer].” 

  • Em “Retrato da juventude brasileira” (12/06), O Estado de S.Paulo se valeu do levantamento “Jovens: Projeções Populacionais, Percepções e Políticas Públicas” para analisar a bolha populacional de jovens do Brasil e as perspectivas de engajá-los com o futuro do país.
“A juventude brasileira se encontra num ponto de inflexão. A população jovem nunca foi e nunca será tão grande quanto hoje. São 50 milhões na faixa entre 15 e 29 anos (26% da população), mas nas próximas décadas a tendência, como no resto do mundo, é de redução. No caso do Brasil, há um complicador: a satisfação dos jovens, que já vinha piorando desde a recessão, se agravou com a pandemia. (...) Nesse sentido, o País ainda tem um recurso singular: o otimismo. Os indicadores mostram que, apesar das agruras do presente, os brasileiros, em especial os jovens, têm expectativas elevadas em relação à sua satisfação daqui a cinco anos. Se isso aumenta o risco de frustração, é também uma fonte de energia para a transformação. Alavancá-la dependerá de uma mobilização nacional pela melhoria da educação e da atração dos jovens para a vida pública.”
  • Em “Cerco ao Enem” (20/06), a Folha de S.Paulo partiu das apurações exclusivas do jornal para rechaçar a intenção do MEC de criar uma comissão para fazer revisão de cunho ideológico no Enem.
“A busca por aprimorar alguns de seus aspectos [Enem], assim, é não só legítima como desejável. Não é isso, contudo, o que vem fazendo o atual ocupante do MEC, Milton Ribeiro.
Conforme reportagem da Folha, a pasta está em vias de criar uma estapafúrdia comissão para fazer a revisão ideológica da prova. O dirigismo está longe de constituir novidade no governo Jair Bolsonaro. (...) Longe de estarem circunscritas ao Enem, a inépcia administrativa e a confrontação ideológica constituem a própria essência do MEC sob Jair Bolsonaro e explicam por que, passados dois anos e meio, o ministério segue sendo uma máquina inoperante e disfuncional.”
  • Em “O país que queremos ser” (28/06), O Estado de S.Paulo retomou dados reunidos pelo relatório do projeto Atlas das Juventudes para reforçar a necessidade, acentuada pela pandemia, de que se criem melhores perspectivas de vida para a população brasileira entre 15 e 29 anos.
“O Brasil estará condenado a um longo período de mediocridade caso o próximo governo não seja capaz de oferecer melhores perspectivas de vida para os 47,8 milhões de jovens na faixa entre 15 e 29 anos. (...) ‘As juventudes têm potencial para protagonizar agendas globais e locais de desenvolvimento social, mas, para isso, precisam do apoio de governos e de outros parceiros’, diz trecho do Atlas das Juventudes. Descuidar deste apoio é um crime contra o futuro do Brasil.”

Perdas na aprendizagem, evasão e a necessidade de volta às aulas

O clipping sobre educação na pandemia comportou, em junho, as mais diferentes notícias: de pais furando greve de professores ao uso de holografia para ajudar no ensino remoto, passando por problemas de fobia social por causa do isolamento. Os maiores esforços de reportagem, porém, voltaram-se às pautas sobre perdas de aprendizagem e evasão escolar no Brasil.

O tema das perdas de aprendizagem chegou à imprensa por meio do já mencionado estudo do Instituto Unibanco e Insper. Os achados do levantamento fizeram a chamada de várias matérias já no primeiro dia do mês. Por exemplo: “Com escolas fechadas na pandemia, geração de alunos perderá R$ 700 bilhões em renda” (O Estado de S.Paulo, 01/06); “Sem ações, aluno poderá concluir ensino médio em 2021 sabendo 20% do que deveria em português e matemática” (G1, 01/06); “Ensino híbrido e engajamento podem conter 40% de perdas em aula, diz estudo” (UOL, 01/06); e “Ineficácia do ensino na pandemia pode atingir geração de jovens, diz estudo” (UOL, 01/06).

Complementarmente, a imprensa publicou a conclusão de uma pesquisa internacional sobre avaliações diagnósticas encomendada pela Fundação Lemann: “Países que fecharam escolas por menos dias tiveram pouco ou nenhum déficit de aprendizagem”, revelou em reportagem O Estado de S.Paulo (11/06). O Brasil está entre os países cujas escolas têm estado fechadas devido à Covid-19 por mais tempo no mundo.

O anúncio de recomendações para reduzir os prejuízos causados pela pandemia à educação brasileira pelas organizações Human Rights Watch e Todos pela Educação também gerou bastante clipping. A tônica da pauta foi o combate  ao problema da evasão escolar que, segundo estimativas do Unicef/Cenpec, assombra cerca de 5 milhões de crianças e adolescentes no país.

Por fim, a pesquisa “Juventudes e a Pandemia do Novo Coronavírus”, assinada pelo Conselho Nacional da Juventude do Brasil (Conjuve), comunicou por meio da imprensa seus principais resultados: “Pesquisa: Maioria dos jovens prefere voltar à aula presencial após pandemia” (UOL, 11/06); “Quase metade dos alunos que abandonaram as aulas afirmam que voltarão após vacinação, diz pesquisa” (O Globo, 12/06); e “Com a pandemia, 43% dos jovens já pensaram em abandonar os estudos” (Agência Brasil, 14/06).