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Volta às aulas presenciais um ano e meio depois: alunos e famílias se dividem entre alegria e ansiedade

Avanço da vacinação e desejo dos filhos pesaram na decisão dos responsáveis de autorizar o retorno à escola pela primeira vez desde o início da pandemia
Alunos chegam ao Colégio Inovar Veiga de Almeida, na Barra da Tijuca Foto: Divulgação
Alunos chegam ao Colégio Inovar Veiga de Almeida, na Barra da Tijuca Foto: Divulgação

RIO — Laura ficou bem em casa, apesar de pouco socializar. Chloe, Júlia, Odara Rafaela e Márcio Jorge também, embora sentissem muita falta da escola. Leonardo fez amigos pela internet. Maria Eduarda não gostou muito do ensino on-line. Guilherme tentava acompanhar os horários do pai. Mas o traço que mais une estes jovens cariocas é a expectativa provocada pela volta à escola, causa ao mesmo tempo de alegria e ansiedade. Há um ano e meio sem aulas presenciais, desde o início da pandemia, eles tiveram seu retorno às aulas presenciais adiado até que suas famílias se sentissem suficientemente seguras para permitir a volta, o que aconteceu após o avanço da vacinação contra a Covid-19.

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— Eles estavam me pedindo para voltar desde março, não aguentavam mais estudar em casa. Estão animados, mas, ao mesmo tempo, tensos. A volta das provas presenciais, por exemplo, está gerando uma insegurança — conta a médica Cláudia Furtado, de 51 anos, mãe de Laura, de 12 anos, e de Leonardo, de 14, alunos do Colégio Cruzeiro de Jacarepaguá.

Após ver toda a família contaminada pelo Sars-Cov-2 e perder a mãe para a Covid-19, no fim do ano passado, Cláudia preferiu adiar um pouco mais a volta dos filhos à escola. Agora que ela, o marido e parte dos professores já estão vacinados, sente-se mais segura. Os adolescentes tiveram experiências diferentes durante o período de ensino exclusivamente on-line:

— Minha filha teve um comportamento mais introspectivo, ficou vendo séries e se afastou dos amigos. Já meu filho aproveitou esse período recluso para fazer novas amizades nos jogos on-line.

O analista de sistemas José Adolfo de Lima Lozano, de 50 anos, também não autorizou seu filho a frequentar o Colégio Inovar Veiga de Almeida, na Barra da Tijuca, no início do ano. Além de ele próprio ser do grupo de risco, Guilherme, de 9 anos, já tivera uma crise de asma quando era mais novo. Agora, após tomar a primeira dose da vacina, prepara a volta do filho.

— Ele mesmo me pediu para voltar, e deixei-o participar de uma festa julina na escola como uma preparação. Depois disso, ficou ainda mais empolgado. Estava sentindo falta desse convívio social. E ter a rotina escolar de novo vai fazer bem para ele. O Guilherme estava com o dia a dia mais desorganizado, com os horários de dormir e de fazer as refeições desajustados. Eu trabalho em casa e ia adaptando minha rotina para ajudá-lo nos estudos, mas ele queria me acompanhar.

No 3º ano do ensino fundamental I, Guilherme é só expectativa:

— Gostei mais ou menos de ficar em casa. Estava com saudade da escola e dos meus amigos. Na festa, eu brinquei muito, e depois pedi ao meu pai para me deixar voltar. Agora estou ansioso.

Na série de Guilherme, só ele e mais um aluno não tinham retornado à escola. Diretora de Experiências e Aprendizagem do Inovar, Diana Magaldi afirma que o colégio tem se preparado para recepcionar esses alunos da forma mais leve possível:

— Antes das férias, conversamos com a família dos alunos que estão chegando sobre o rigor dos nossos protocolos de segurança. E dialogamos também com a turma que vai recebê-los, mostrando como recepcioná-los, onde vão sentar e como orientá-los em relação às regras da escola. Além disso, orientamos nossos professores a estarem atentos às questões socioemocionais desses alunos.

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Gestante quando as aulas presenciais voltaram, no início do ano, a empresária Cynthia Castelo Branco, de 37 anos, também achou que o segundo semestre letivo, depois do nascimento do bebê e de ela ter tomado a vacina, seria o momento mais adequado para deixar a filha Chloe, de 10 anos, aluna do 5º ano do PH da Barrinha, retomar as aulas presenciais.

— No primeiro ano de ensino remoto, ela conseguiu manter o foco. Nos últimos meses, porém, estava bem dispersa. E, à medida que estava vendo os colegas voltarem, já estava pedindo para ir à escola. Agora, está superempolgada e ansiosa, querendo comprar tudo novo, como se fosse uma volta às aulas de fevereiro — conta Cynthia.

Chloe, que não vê amigos e professores desde março do ano passado, explica:

— Eu gostei de ficar em casa, não foi chato, mas estou com vontade de voltar para a escola, porque eu não gostei muito do ensino on-line.

Crianças no ensino presencial na Rede Daltro Educacional do Recreio Foto: Divulgação
Crianças no ensino presencial na Rede Daltro Educacional do Recreio Foto: Divulgação

A advogada Roberta Magalhães, de 38 anos, além de ter comorbidade, optou por adiar o retorno de sua filha, Júlia, de 11 anos, por morar com a sogra, que também é do grupo de risco. Além disso, conta, como ela e o marido estavam em home office, não via sentido em apenas a filha sair de casa. O avanço da imunização mudou o quadro.

— Ela sentia falta da escola, mas sempre foi muito compreensiva, sabia dos riscos envolvidos. Então, para nós esse período em casa foi tranquilo. Ela sempre foi muito responsável e conseguiu manter uma rotina dedicada de estudos. Também por causa dessa segurança que ela me passou eu a mantive em casa — explica Roberta.

Júlia, do 5º ano, está animada para reencontrar amigos e professores:

— Eu estou querendo muito voltar para o presencial, mas estudar em casa não foi tão ruim, porque eu consegui conciliar os estudos com outras atividades, como aulas particulares de tênis.

As filhas do produtor artístico Hugo Pereira Silva, de 37 anos, chegaram a frequentar a Escola Parque por duas semanas no início do ano, mas o recrudescimento da pandemia o fez levar as filhas Maria Flor, de 2 anos, e Maria Eduarda, de 6 anos, de volta para o ensino on-line. Com os avós das meninas imunizados, elas agora voltarão ao ambiente escolar.

— O ensino on-line para a minha filha mais velha foi muito desafiador no início. Ela não tinha paciência, e o acesso a brinquedos em casa acabava tirando o foco. Ela quer voltar, mas sinto que vive um dilema: ao mesmo tempo em que quer sair de casa, tem um bloqueio por conta da adaptação que foi interrompida — analisa o pai.

Maria Eduarda, que está na pré-escola, diz que não parava de pensar na volta:

— Achei muito legal esse tempo em que eu estudei em casa, mas sinto muita saudade da minha turma. O que mais espero é que chegue logo minha aula presencial!

Aprender em sala de aula é melhor

Após um ano e meio em casa e diante do desejo comum de voltar ao ensino presencial, os estudantes já conseguem fazer um balanço sobre as vantagens e desvantagens de cada sistema. Aluno do 9º ano do Cruzeiro, Leonardo Furtado acha que o ensino on-line é uma boa opção quando se está doente.

— Mas no presencial é mais fácil aprender e se concentrar, já que o ambiente de casa tem muita distração. Sinto falta do ambiente escolar, de poder estudar com meus colegas e de tirar dúvidas com o professor na hora, sem ter que ficar marcando reuniões. A série em que estou é a primeira que tem física, e fica difícil aprender on-line, principalmente porque não tenho facilidade com matemática — diz.

Estudantes do Colégio Inovar Veiga de Almeida, na Barra da Tijuca Foto: Divulgação
Estudantes do Colégio Inovar Veiga de Almeida, na Barra da Tijuca Foto: Divulgação

A irmã de Leonardo, Laura Furtado, do 7º ano, afirma que a única vantagem do ensino remoto para ela foi lhe dar mais tempo para ler livros e assistir a filmes:

— Porém, prefiro o ensino ao vivo. É melhor para aprender matérias mais difíceis para mim, como filosofia e história. E estou sentindo falta de ver meus amigos todos os dias.

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Aluna do 3º ano do ensino médio na Rede Daltro Educacional do Recreio, Odara Rafaela, de 17 anos, considera como um dos principais benefícios do on-line a flexibilidade:

— Consigo fazer várias coisas ao mesmo tempo, e o dia fica mais dinâmico. Mas sinto falta das conversas e do convívio com meus amigos, dos quais acabei me afastando, porque a maioria voltou para o presencial e eu não. Os assuntos não coincidiam — diz. — Não sei nem se vou saber conviver socialmente, mas quero voltar. Até porque o ensino presencial de algumas matérias faz diferença, principalmente física.

Irmão de Odara, Márcio Jorge, de 9 anos, do 4º ano do fundamental, conta que prefere estudar ciências, sua disciplina preferida, presencialmente:

— Estou com saudade de todos os professores e com vontade de encontrar os meus amigos, mas até que gostei de estudar on-line.

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Pai de Odara Rafaela e Márcio Jorge, o gestor ambiental Márcio Coelho, de 44 anos, cujos filhos não voltaram antes por terem muito contato com os avós, diz que uma das maiores dificuldades de tê-los estudando em casa foi ter de exercer o papel de professor:

— Não sou educador. No caso do meu filho, que está em processo de formação, é uma dificuldade imensa ser didático ao ensinar. Tem conteúdos dos quais nem me lembro mais. E é muito difícil chegar do trabalho e ter que dar essa atenção, ajudá-lo a fazer uma série de coisas que ele já teria feito na escola. Já a minha filha chegou a ter queda nas notas, mas recuperou.

Diretora da Rede Daltro Educacional do Recreio, Mirian Aguiar afirma que pelo menos 18 alunos voltarão às salas de aula este mês pela primeira vez desde o início da pandemia:

— A formação do aluno passa pelo relacionamento com o outro. Por isso, é importante voltar. Estamos conversando com os pais, para saber como essas crianças estão, qual é a expectativa delas, se estão vindo por influência familiar ou por vontade própria, tratando o cenário a partir dessas informações. Vamos recebê-los com afeto e segurança, para que se desenvolvam. Na capacitação dos professores, o retorno desses alunos foi uma das pautas.