Laura Mattos

Jornalista e mestre pela USP, é autora de 'Herói Mutilado – Roque Santeiro e os Bastidores da Censura à TV na Ditadura'.

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Você sabe o que o seu filho faz no intervalo das aulas presenciais?

Escolas adotam estratégias para manter protocolos contra Covid-19 no recreio

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Hora do intervalo, e alunos ficam nas carteiras, cada um com o seu celular. Ou até vão ao pátio, mas continuam sentados, imersos em redes sociais e videogames. Melhor assim na pandemia, né?

Não mesmo. O recreio é fundamental para minimizar sequelas físicas e emocionais deixadas por mais de um ano de fechamento escolar, e há como aproveitar esse momento de forma saudável, sem os ferir protocolos da Covid-19.

Das regras oficiais do governo de São Paulo às prestigiadas consultorias escolares dos hospitais Albert Einstein e Sírio Libanês, não há impedimento para tirar crianças e jovens do sedentarismo e das telas na retomada presencial. Ao contrário, as instituições consideram que as atividades físicas e a reconexão com amigos devem ser levadas em conta na equação da pandemia, ao lado de cuidados contra a transmissão.

A definição sobre os intervalos tem mais a ver com as convicções da escola, além, é claro, da estrutura. Espaços restritos exigem mais criatividade, mas não inviabilizam o respiro dos alunos. É possível, por exemplo, estabelecer dois intervalos, o de comer, que pode ser na sala de aula, e o de sair para o pátio, facilitando o revezamento de turmas. Faixas podem dividir quadras ou qualquer espaço aberto para separar grupos.

“Agora é hora do banho de sol”, brinca com os alunos a orientadora educacional Mara Pérez, do colégio Pentágono, de Perdizes, em São Paulo. “Precisamos garantir que eles não fiquem na sala de aula no intervalo ou não se justifica ir presencialmente à escola”, defende.

Ela conta que, em fevereiro, a opção foi por mantê-los nas salas. “Mas foi insano. Eles precisam sair e se reconectar com o ambiente escolar. Logo em março, assim que tivemos mais segurança sobre os protocolos, liberamos a saída.”

O Pentágono dividiu o intervalo de meia hora em dois de 15 minutos. Uma parte é dentro da sala, para comer o lanche. A outra, para circular por áreas abertas, sem a mistura das chamadas bolhas.

O colégio é um dos 154 que contam com a consultoria do Einstein. O médico sanitarista Felipe Almeida, gerente desse projeto do hospital voltado às escolas, diz que não há uma bula única. O Einstein avalia o prédio e propõe mudanças, como abertura de janelas e instalação de lavatórios, estuda processos como o de entrada e saída de alunos, treina equipes e monitora casos suspeitos.

Fora as regras obrigatórias, como uso de máscara, distanciamento e higienização, as soluções para cada escola dependem da estrutura e do perfil. Por ora, a orientação é para que não se misturem bolhas, mas estuda-se uma flexibilização na fase laranja.

A interação social e os exercícios físicos são relevantes nas decisões, e o médico dá como exemplo a liberação de atividades extracurriculares no Porto Seguro, do Morumbi, em São Paulo, como balé, atletismo, ioga, tênis e ginástica. Vetos ficam com práticas de maior risco, a exemplo de esportes coletivos e aulas de canto.

No recreio do Porto, alunos são estimulados a realizar brincadeiras nas quais se movimentem, e cada bolha recebe um kit com cordas, cones e bambolês, higienizados antes e após as atividades.

Na Stance Dual, na Bela Vista, até a bola, que tem sido tabu na pandemia, pode ser utilizada, desde que com a supervisão de um professor e em atividades sem contato. É possível, por exemplo, usá-la em um circuito com cones, como nos treinos de futebol.

Segundo a coordenadora pedagógica Ana Claudia Corrêa, o intervalo é chave para a reconexão entre alunos e deles com a escola. Justamente por isso, optou-se por seguir com a proibição do celular, que é anterior à pandemia e se deu em meio a um trabalho sobre o uso excessivo de tecnologia. Após o confinamento, alunos sentem mais falta, diz a coordenadora, mas, por outro lado, “estão com sede de conexão e de brincar”.

Com crianças menores, o cumprimento dos protocolos é mais desafiador. Na escola de educação infantil Espaço Ekoa, antiga Espaço da Vila, no Butantã, em São Paulo, almofadas, blocos de madeira e mesmo desenhos com giz no chão são usados para tentar garantir uma distância entre os alunos.

Fazer do respeito a essas regras algo mais lúdico é um caminho. E, quando necessário, segundo a coordenadora pedagógica Ana Paula Yazbek, deve-se conversar com a criança de forma tranquila e respeitosa.

Há colégios que optam por ser mais conservadores, como o Bandeirantes, no Paraíso, em São Paulo. Os estudantes têm só quatro aulas presenciais por dia para que não precisem de intervalo.

Guilherme Aguiar, gerente de desenvolvimento humano e de operações do colégio, diz que a intenção é flexibilizar as restrições com a melhora da pandemia. Segundo ele, além dos riscos, é preciso considerar que a escola está lidando com o medo das pessoas.

O Band conta com consultoria do hospital Sírio-Libanês, que funciona de forma semelhante à do Einstein. Até o ambulatório da escola passou a ser administrado pelo hospital.

A restrição ao intervalo, contudo, foi opção do colégio. Outras dentre as 22 escolas com consultoria do Sírio mantiveram os recreios, sendo que algumas começam a misturar de duas a três bolhas ao ar livre, com distanciamento monitorado, e há até as que realizam atividades em cozinhas e laboratórios, com materiais individuais.

“As soluções não podem ser engessadas, têm que caber na realidade das escolas para que haja engajamento de todos”, diz Carla Kobayashi, infectologista da consultoria do hospital.

Tanto nas regras do estado quanto nas do município de São Paulo, intervalos são permitidos, com os protocolos básicos. Assim, as escolas públicas podem, da mesma forma que as particulares, escolher o melhor formato do recreio, que deve ir se ajustando ao momento da pandemia e aos anseios da comunidade escolar.

Esses 15, 20, 30 minutos podem até parecer pouco, mas são fundamentais na reconstrução da relação com a escola e de tudo o que ela representa. Pais costumam perguntar aos filhos “Como foi a aula hoje?”. Já bateu o sinal para conversarmos sobre o intervalo.

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