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Brasil Educação

Vacinação de profissionais da educação engrena, mas imunização completa ainda está longe

Segundo Ministério da Saúde, 247.379 já tomaram as duas doses da vacina. Outros 2,3 milhões só tomaram uma — número que dobrou nas últimas duas semanas
Simone Freitas, do colégio Mopi, está com saudade de abraçar seus alunos Foto: Leo Martins / Agência O Globo
Simone Freitas, do colégio Mopi, está com saudade de abraçar seus alunos Foto: Leo Martins / Agência O Globo

RIO, SÃO PAULO E BRASÍLIA - A vacinação de profissionais da educação engrenou, mas a imunização completa da categoria ainda está distante. Ontem, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, defendeu a volta às aulas presenciais já no segundo semestre , mesmo que ainda haja professores que não tomaram a segunda dose da vacina contra a Covid-19. Essa condição, no entanto, encontra muita resistência da categoria.

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— Nós estamos há mais de um ano sem aulas. Já distribuímos doses para os professores da atenção básica, para imunizar, com a primeira dose, cerca de 84% dos professores. No meu entendimento, não é fundamental que todos os professores estejam imunizados com duas doses para o retorno das aulas — afirmou Queiroga.

De acordo com o painel do Ministério da Saúde com base em dados do Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), 247.379 profissionais da educação já tomaram as duas doses da vacina. Outros 2,3 milhões só tomaram uma — número que dobrou nas últimas duas semanas.

Desses, a grande maioria foi imunizada com a AstraZeneca em junho. Isso significa que só em setembro o Brasil deve atingir a marca de 2 milhões plenamente vacinados. Ainda de acordo com o Ministério da Saúde, são 2,7 milhões de pessoas neste grupo. Isso significa que faltam apenas 168.921 para tomar a primeira dose.

— A posição da categoria é a de que, além de estarmos vacinados com duas doses, é preciso testagem em massa, rastreamento de doentes e efetivo cumprimento de todos os protocolos de segurança — afirma Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).

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Grupos de pesquisa brasileiros já definiram parâmetros de retornos às aulas que são seguros mesmo sem vacinação. De acordo com estudo da Fiocruz, por exemplo, a ocupação de leitos clínicos e de UTI Covid deve estar abaixo de 75%, e deve haver redução de ao menos 20% de óbitos e casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), comparados a duas semanas anteriores.

O último boletim do Observatório Covid-19 da Fiocruz mostra que as taxas de SRAG seguem em nível “muito alto”, e 19 estados possuem mais de 80% das UTIs ocupadas, patamar considerado crítico.

— Recomendo fortemente que se espere pelas aulas presenciais apenas com as duas doses. Apenas uma não confere imunidade permanente — afirma Raphael Guimarães, especialista em saúde coletiva e membro do Observatório Covid-19.

A pneumologista Patricia Canto Ribeiro, da Escola Nacional de Saúde Pública, também defende a volta às aulas com as duas doses aplicadas da vacina.

— Mas, mesmo com professores vacinados, o retorno às aulas precisa estar associada à uma boa vigilância,  com ampla testagem de suspeitos e comunicantes, cumprimento de quarentena para sintomáticos, casos e suspeitos — diz.

A posição dos pesquisadores, no entanto, não é unanimidade. Renato Kfouri, presidente do Departamento Científico de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria, defende que o “benefício da volta às aulas supera o risco”.

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— As crianças transmitem menos e, por isso, as escolas são ambientes mais seguros. Num momento de lockdown, elas devem fechar. Mas não é o caso. Já devíamos ter voltado a funcionar há muito tempo.

A diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações Flavia Bravo afirma que os adolescentes não precisam estar vacinados para o retorno às aulas.

— Nenhum país esperou isso. Sou favorável ao retorno às aulas o mais breve possível — diz a pediatra.

As escolas privadas já estão em funcionamento híbrido — parte do tempo presencial e outro à distância — em todo o país. Simone Freitas, professora do 2º e 3º anos do fundamental no Mopi, do Itanhangá, Zona Oeste do Rio, conta que sentiu receio quando voltou a trabalhar na escola, em setembro passado, mas se acostumou com as regras:

— Naquele momento, era o desconhecido, um ambiente modificado. Mas vivenciar as normas me trouxe segurança — conta ela, que espera a segunda dose e o fim da pandemia para poder voltar a abraçar seus alunos.

Problemas estruturais

Já a rede pública funciona majoritariamente com ensino remoto. Entre setembro e outubro, quando todos os profissionais da educação estarão plenamente imunizados com duas doses, só faltarão apenas de dois a três meses para o Enem, em 21 e 28 de novembro.

Profissionais da educação e especialistas apontam que as escolas estaduais e municipais têm mais problemas de infraestrutura básica para manter um ambiente seguro.

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— Não estamos falando das escolas da Finlândia ou da Dinamarca. As nossas estão sucateadas e sem ventilação adequada — afirma Izabel Costa, coordenadora do Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação do Rio de Janeiro.

Fora do país, especialmente em locais com a pandemia controlada e a vacinação avançada, já há um movimento de reabertura das escolas, inclusive com ensino presencial sem restrição de distanciamento.

Nos Estados Unidos, por exemplo, mais de 80% dos profissionais da educação já tomaram duas doses. No México, a volta às aulas aconteceu com protocolos rígidos após 21 semanas seguidas de queda nos índices da doença no país.

*Colaborou Melissa Duarte, de Brasília