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Brasil

Um mês após massacre de Suzano, alunos tentam superar luto e retomar rotina

Escola reforçou medidas de segurança, e prefeitura afirmou que vai contratar 46 psicólogos para atendimento de estudantes
Muro grafitado com os rostos das vítimas do massacre na escola Raul Brasil, em Suzano, foi pintado de azul, após reclamação de pais e alunos; contornos ainda estão aparentes Foto: Edilson Dantas/9-4-2019
Muro grafitado com os rostos das vítimas do massacre na escola Raul Brasil, em Suzano, foi pintado de azul, após reclamação de pais e alunos; contornos ainda estão aparentes Foto: Edilson Dantas/9-4-2019

SÃO PAULO - Na volta às aulas regulares, nesta semana, na Escola Estadual Raul Brasil, em Suzano (SP), faltavam dois colegas na sala da estudante B.C., de 16 anos. As cadeiras vazias eram de duas vítimas do ataque que matou cinco alunos e duas funcionárias, além dos dois atiradores, há um mês.

— Não foi fácil voltar. Muita gente ainda não voltou. As pessoas estão tristes, mas um tenta ajudar o outro — diz B.C., aluna do segundo ano do ensino médio.

Ela conta que, desde o ataque, desenvolveu compulsão alimentar. Passou a frequentar semanalmente uma psicóloga oferecida pelo posto de saúde próximo. Agora, já não precisa de remédios para dormir.

— A terapia tem me ajudado bastante, consigo me expressar melhor. Outros amigos estão com crise de ansiedade, ou mais quietos. Nas semanas de acolhida, em que a escola estava aberta, mas sem aulas, só consegui ir dois dias. Eu não parava de olhar para a porta. Dava a impressão de que entrariam de novo e atirariam em todo o mundo.

A escola reforçou as medidas de segurança. O portão, aberto no dia do ataque, passou a ficar trancado. O acesso mudou para um portão lateral. E um segurança fica de olho em quem chega. Segundo os adolescentes, porém, os alunos ainda não se sentem completamente seguros. E rarearam os psicólogos e cachorros que ficaram na escola nas semanas após o ataque.

A prefeitura de Suzano afirma que vai contratar 46 psicólogos para atendimento de estudantes, professores e funcionários das escolas municipais e estaduais. Três ficarão na escola Raul Brasil. Os demais serão divididos entre a Diretoria Regional de Ensino, postos de saúde e Centros de Atenção Psicossocial (Caps). É um acordo entre a prefeitura e as secretarias de Estado de Educação, Saúde e Justiça e Cidadania, que prevê ainda a instalação de um Centro de Referência e Apoio à Vítima (Cravi). Na parte de segurança, planeja-se a instalação de 180 câmeras, botões de pânico e fechaduras eletrônicas nas 45 escolas estaduais de Suzano.

A Secretaria de Educação do Estado de São Paulo diz que tem atendido aos pedidos das famílias dos alunos. Segundo o órgão, elas pediram novos canais de comunicação, via e-mail e WhatsApp, para acompanhar as atividades da escola, além da permanência de psicólogos nos próximos dois anos para atendimentos individuais e coletivos.

Na época do ataque, a estudante I.C., de 16 anos, pensou em pedir à mãe para sair da escola. Mas mudou de ideia ao rever os colegas:

— Senti muita tristeza quando entrei. Agora pode ser que eu vá a um psicólogo. Estou melhorando porque meus amigos estão lá. Vejo que somos fortes.

Tratamento para todos

Pais e alunos pediram que o muro grafitado na época com as imagens das vítimas fosse apagado. Quem passa hoje por ali vê o muro pintado de azul, com os contornos dos rostos ainda aparentes.

Segundo a pesquisadora da Universidade Estadual Paulista (Unesp) e coordenadora do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral (Unesp/Unicamp), Luciene Tognetta, o atendimento emergencial é o primeiro que se oferece em uma tragédia da magnitude da de Suzano. Mas não é a única ação necessária.

— O caso de Suzano foi fora do comum. E acompanhamento especializado é essencial como plano emergencial. Mas não só. Existem pessoas que ficam. E com problemas que são anteriores ao ocorrido, e para além do ocorrido — afirma. — A saúde mental de uma escola não está associada apenas aos alunos. Também é preciso ver como estão os professores e funcionários.

Tognetta participa da coordenação das ações pedagógicas em Suzano. Nos dias seguintes à tragédia, ela e pesquisadores da Unesp, Unicamp e USP entraram na escola para acolher alunos, funcionários e professores. A preocupação era que os adultos estivessem fortalecidos na hora de receber os estudantes. Uma das propostas foi criar uma rotina de aproximação, junto com espaços para conversar sobre o que aconteceu. Quem não quisesse ficar na sala, não era obrigado.

— Muitos não queriam entrar na escola. Chegavam com os pais, choravam muito. Nosso trabalho era dizer que sabíamos desse sofrimento, e pedimos aos alunos que escolhessem qual professor ou funcionário queriam que fossem recebê-los na porta. Essa pessoa fazia o acolhimento, transmitia confiança — conta Tognetta.

Outros psicólogos, pedagogos e assistentes sociais rodavam o pátio e outros espaços da escola.

— Começávamos falando de filmes, séries de TV e em cinco minutos estávamos falando do que tinha acontecido. Para além das ações de psicologia clínica e terapêutica, nesses casos é preciso ter pessoas abertas a ouvir — diz.

Neste sábado, a Prefeitura de Suzano organiza o evento “Suzano pela paz”, com a apresentação de artistas no Parque Municipal Max Feffer.