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Descrição de chapéu desigualdade educacional

Um cavalo de troia se aproxima dos portões de instituições federais de ensino

Com cortes de orçamento e ataques à educação pública, União Nacional dos Estudantes e jovens se manifestam em todo o país

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Marcelo Borges

Estudante de jornalismo e vice-presidente do Diretório Central dos Estudantes da UFMT Araguaia, é Jovem Transformador Ashoka e membro da rede de Líderes Politize!

Não é de hoje que a educação vem sofrendo desmontes. Mas, desde que me tornei estudante do Ensino Médio e passei a acompanhar as reformas educacionais de perto, sinto na pele o descaso com a educação pública e o ataque deliberado a professores e instituições de ensino.

Os problemas são visíveis em todas as esferas, embora piores no âmbito federal, onde se empreende uma verdadeira guerra contra universidades e institutos. Os recorrentes cortes orçamentários podem levá-los a fechar as portas.

Dezenas de jovens sobem passarela azul
Jovens se direcionam às salas de aula para vestibular 2022 da Unicamp, em Campinas - Antonio Scarpinetti/SEC Unicamp

Grande parte dos recursos que vêm sendo cortados são verbas discricionárias, aquelas que cobrem despesas básicas, como contas de água, energia, limpeza, bolsas acadêmicas, e os investimentos em melhorias das instalações e edificações.

Estando dentro de uma universidade, como estou agora, é fácil de notar esses cortes. Muitos prédios precisam de reformas e em cada canto tem uma obra inacabada, que está ali há anos esperando a disponibilização de recursos.

No final de maio, o Governo Federal atacou a educação mais uma vez. Publicou um bloqueio de verba de R$ 3,2 bilhões do orçamento previsto para o Ministério da Educação em 2022, com impactos diretos nos institutos e universidades federais. Poucos dias depois, anunciou uma redução nesse corte, que agora é de R$ 1,6 bilhão.

Mas a realidade é que as instituições federais não podem suportar nem mais um centavo em redução de verbas. Os estudantes voltaram às aulas presenciais com muitas demandas de aprendizagem, acolhimento, planejamento de futuro.

Com tal medida, reitorias de universidades federais do Rio de Janeiro anunciaram que não terão dinheiro para pagar despesas básicas, como água e luz.

Na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), há muitos exemplos de falta de manutenção, e uma delas é na própria reitoria, com paredes com infiltrações depois do incêndio de 2021.

Na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), os cortes impactam auxílios e bolsas a estudantes, assim como as obras inacabadas do centro de convenções e a reforma do ginásio de esportes do campus Araguaia, há anos parada por falta de recursos.

Outra ameaça recente que a educação pública sofreu foi o início da tramitação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 206/2019, de autoria do deputado federal General Peternelli (União Brasil-SP), que pretende tornar possível a cobrança de mensalidades nas universidades federais, tendo como justificativa as dificuldades financeiras que essas instituições têm enfrentado.

Deputado Kim Kataguiri em audiência sobre a PEC 206/2019, que trata da cobrança de mensalidade pelas universidades públicas
Deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP) em audiência sobre a PEC 206/2019, que trata da cobrança de mensalidade pelas universidades públicas - Elaine Menke/Câmara dos Deputados

A PEC ainda é defendida sob o pretenso argumento de que reduziria a desigualdade, pois quem é mais rico pagaria para estudar na universidade pública.

Mas sabe quem vai definir quem pagaria e quem não pagaria pela universidade? Ninguém sabe e aí é que está o problema.

A PEC não define os critérios da gratuidade. Apenas diz que isso seria uma responsabilidade do Ministério da Educação, conforme o trecho: "[...] garantindo-se a gratuidade àqueles que não tiverem recursos suficientes, mediante comissão de avaliação da própria instituição e respeitados os valores mínimo e máximo definidos pelo órgão ministerial do Poder Executivo."

Como seriam definidos esses valores? Que controle social haveria sobre esses critérios? A PEC é um cavalo de troia que se acerca dos portões das instituições federais de educação.

Depois de aprovada, tendo alterado a Constituição, nos deixará à mercê de mais uma comissão avaliadora. E poderá tomar rumos inesperados, prejudicando aqueles que precisam desse direito para acessar universidades e institutos federais.

Por que imputar mais esta incerteza às juventudes do Brasil? Nosso futuro já não está sobrecarregado delas? A universidade pública e gratuita não deveria ser um dos caminhos a nos fortalecer no enfrentamento das profundas crises que já estão aí?

O projeto que estava em análise na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados foi retirado da pauta porque o relator, deputado Kim Kataguiri (União Brasil-SP), não estava na sessão. Mas a PEC continua em tramitação.

Tendo em vista esses ataques recentes que a educação pública vem sofrendo, a União Nacional dos Estudantes (UNE) mobilizou 500 mil estudantes no dia 9 de junho. Em mais de cem cidades, eles se manifestaram contra a PEC 206 e os cortes no orçamento.

Os atos vão continuar, com cartazes e baterias de atléticas entoando no batuque um "tira a mão da federal" e "A nossa luta, é todo dia, educação não é mercadoria."

Nem a música alta nos carros que passam alheios às demandas dos estudantes nem os xingamentos de quem vê a educação como ameaça intimidam os jovens. Nunca estivemos tão juntos.

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