Por Bárbara Muniz Vieira, G1 SP — São Paulo


Tablet usada na rede municipal de Educação da cidade de SP entre alunos e professores. — Foto: Divulgação/SME/PMSP

Um ano após o início das aulas online, a Prefeitura de São Paulo diz que entregou 94% dos tablets prometidos para os alunos da rede municipal, mas estudantes afirmam que não conseguem usar os equipamentos porque eles não funcionam ou por falta de internet. Uma escola da Zona Norte com 800 alunos recebeu apenas 16 unidades.

O fim de agosto foi o prazo dado pelo secretário municipal da Educação, Fernando Padula, para concluir a entrega dos aparelhos que possibilitam o acesso dos estudantes às aulas remotas. Até esta quarta-feira (1º), a prefeitura diz que foram entregadas 439 mil unidades das 465,5 mil prometidas.

Os aparelhos foram comprados no ano passado pelo valor de R$ 300 milhões e tinham a primeira previsão de entrega para outubro de 2020, o que não se concretizou por causa de problemas na fase de licitação e compra de chips (leia mais detalhes abaixo).

Na Escola Municipal de Ensino Fundamental (Emef) Marcílio Dias, na Zona Norte da capital, que possui 800 alunos, apenas 16 tablets foram entregues. Ana Laura, de 9 anos, está na quarta série e é uma das alunas que não recebeu o equipamento, de acordo com a mãe dela, a diarista Núbia Moura, de 27 anos.

"Está fazendo muita falta porque a semana ela não vai para a escola, fica sem estudar. Não temos computadores nem tablet em casa e pelo celular o login nunca dava certo. Acho que ela está perdendo muito conteúdo e isso vai ter muito impacto", afirma.

Núbia diz que nunca soube que poderia retirar material impresso na escola para a filha estudar. "Nunca me falaram isso, para ir lá retirar material."

Escolas municipais de SP relatam problemas com tabletes entregues pela Prefeitura — Foto: Reprodução

Receber o tablet, entretanto, não é garantia de que o aparelho vai funcionar. O G1 ouviu diversos relatos de professores de pelos menos cinco escolas diferentes, e que preferem não se identificar, que dizem que muitos equipamentos recebidos não funcionam. Há também casos em que as escolas receberam o aparelho, mas eles não estão funcionando e por isso não foram entregues aos alunos.

Em uma escola da Zona Sul com 1.200 alunos, 100 tabletes foram devolvidos um dia depois de entregues porque não estavam funcionando, de acordo com uma professora que prefere não se identificar.

Escolas municipais de SP relatam problemas com tabletes entregues pela Prefeitura — Foto: Reprodução

"O tablet trava, se descarregar totalmente. Se entra em um site que não pode, ele trava também. Tem dois tipos de travamento. Um dos tipos estão conseguindo destravar e tem até vídeo na internet para ensinar. O outro tipo de travamento ninguém descobriu ainda como fazer. Na minha escola, que é pequena, tem quase 30 aparelhos bloqueados", afirmou.

A prefeitura diz que, dos 26 mil itens que ainda não foram repassados aos alunos, 13 mil seriam destinados a estudantes que não foram localizados por suas escolas, mas que será feito um trabalho de busca ativa para que os equipamentos cheguem aos alunos. Destes 13 mil, cerca de 50% são destinados para os estudantes dos cursos da modalidade Jovens e Adultos.

Escolas municipais de SP relatam problemas com tabletes entregues pela Prefeitura — Foto: Reprodução

De acordo com a administração municipal, os itens seguem disponíveis aos alunos nas unidades para que possam ser retirados.

Outros 10 mil dispositivos, diz a gestão municipal, estão aguardando a entrega dos chips pela operadora de telefonia ou em substituição por terem apresentado algum defeito. A prefeitura também diz que 3 mil famílias optaram por não receber os tablets.

Sobre o caso da EMEF Marcílio Dias, a prefeitura disse, em nota, que aguarda a entrega de chips de internet pela operadora e que solicitou a substituição dos que estavam com defeito. Os responsáveis pelos estudantes serão avisados sobre as datas para retirada dos tablets, de acordo com a Secretaria da Educação.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), entrega tablet para aluno da rede municipal da capital paulista em 30 de junho. — Foto: Divulgação/Secom/PMSP

Promessa de entrega

Em 20 de abril, o secretário municipal da Educação, Fernando Padula, disse que a entrega de tablets para os alunos da rede municipal terminaria em agosto, um ano após o início das aulas online implementadas por causa da pandemia de coronavírus.

Sem computadores em casa e sem o equipamento prometido pela gestão municipal, parte dos alunos de baixa renda veem a desigualdade crescer, já que não têm como assistir aos conteúdos do ensino a distância (EAD).

O secretário municipal de Educação de São Paulo, Fernando Padula. — Foto: Acervo pessoal/Facebook

Segundo Padula, os equipamentos estavam passando por fase de configuração pelos funcionários das escolas antes de serem entregues aos alunos.

“Tem tablet que já foi entregue, tem tablet que precisa ser configurado. A equipe montou um vídeo tutorial para as equipes das escolas fazerem essa configuração. Além disso, tem uma equipe visitando as escolas para fazer a configuração. Tem um outro grupo que já tem o tablet, mas não tem o chip, e além disso, tem a configuração para que o tablet seja usado rigorosamente usado em questões pedagógicas e não consuma a banda que a secretaria paga para os alunos. Se não tiver nova restrição que impeça as fábricas de trabalhar em seu ponto máximo, em agosto estará toda completada a entrega", disse ele em abril.

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Problemas na fase licitatória

Só no final de outubro o TCM liberou o edital de licitação dos tablets após ajustes. O investimento da prefeitura foi de R$ 300 milhões.

As aulas presenciais foram suspensas no dia 17 de março de 2020 na cidade de São Paulo por causa do início da pandemia. Em abril de 2020, o ensino a distância foi implementado, mas muitas crianças de baixa renda deixaram de acompanhar as aulas por falta de aparelhos com acesso a internet na família.

Com o retorno das aulas presenciais no início de agosto deste ano, os tablets estão sendo usados para as atividades complementares de reforço fora do período de aulas ou por aqueles estudantes que as famílias optaram por manter em casa, já que a Lei número 17.437, de 12 de agosto de 2020, ainda torna o retorno presencial facultativo.

Bruno Covas anuncia retomada de setores da capital paulista em julho de 2020. — Foto: Reprodução/TV Globo

Aluna assiste à aula em celular

A estudante Clarice Vieira Leite, de 10 anos, conta que tem dificuldade para acompanhar as aulas da EMEF Infante D. Henrique, no bairro do Canindé, na Zona Norte. A mãe dela, Silvana Vieira, comprou um celular para a filha com o dinheiro do auxílio-emergencial no ano passado e colocou wi-fi em casa na ocasião.

"Dividi o valor com meu marido para não atrapalhar as contas da casa. Mas com certeza ela ficou para trás [em relação a alunos que possuem equipamentos]. Esse ano nem o livro didático recebemos ainda. É um material que nos ajudaria como reforço para estar estudando."

Clarice acredita que o tablet ajudaria a acompanhar as aulas no ensino à distância.

"O tablet facilitaria para mim e várias crianças, principalmente para quem não tem internet em casa. Às vezes eu não tenho facilidade para entender porque é muito diferente estar na escola e não estar. A professora quando está na escola para te ensinar está na sua frente para revisar até você entender. Online às vezes ela explica e faz uma confusão na cabeça", afirmou em abril ao SP1.

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Íntegra da nota da Prefeitura de SP

"A Prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Educação (SME), esclarece que aguarda entrega de chips de internet pela operadora na EMEF Marcílio Dias e solicitou substituição para os que estavam com defeito. Os responsáveis pelos estudantes serão avisados sobre as datas para retirada dos tablets.

Os equipamentos destinados às EMEFs foram adquiridos como forma de auxiliar na aprendizagem dos estudantes por meio do ensino híbrido, com atividades planejadas para o período presencial e o contraturno, além de ações de reforço escolar e recuperação.

A Prefeitura de São Paulo acompanha e trabalha para dotar o município de uma rede mais ampla para acesso à internet, tanto que apresentou, neste ano, Projeto de Lei à Câmara Municipal de São Paulo para modernizar a legislação para o setor. O texto prevê dispositivos que privilegiam a instalação de antenas em áreas periféricas. O PL está em tramitação na CMSP.

Essa preocupação se reflete, também, na expansão de pontos gratuitos disponíveis na cidade. O Programa Wifi Livre SP, coordenado pela Secretaria Municipal de Inovação e Tecnologia (SMIT), aumentou quase 10 vezes, de 120 (em 2016) para os 1.088 atuais. O Programa de Metas da Prefeitura prevê que, até o final de 2024, São Paulo terá 20 mil pontos de acesso à internet disponíveis pelo programa Wifi Livre SP.)"

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