Alexandre Schneider

Pesquisador do Transformative Learning Technologies Lab da Universidade Columbia em Nova York, pesquisador do Centro de Economia e Política do Setor Público da FGV/SP e ex-secretário municipal de Educação de São Paulo.

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Alexandre Schneider
Descrição de chapéu desigualdade educacional

Todos contra a exclusão escolar

É preciso que a agenda de políticas públicas tenha como diretriz combater o nível de desigualdade educacional brasileira

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O Brasil tomou um trem veloz em direção ao passado. Inflação, juros, desemprego, desigualdade, fome, trabalho infantil, evasão escolar, desmatamento, agressões ao meio ambiente e pobreza crescentes ou em níveis presentes há 30 anos nos dão o tamanho do atraso e do desafio multidimensional que nosso país deverá enfrentar nos próximos anos.

​Na educação, palco dos maiores retrocessos, é preciso que a agenda de políticas públicas tenha como diretriz combater um mal que não é novo, mas que foi elevado durante a pandemia: o nível de desigualdade educacional brasileira. O retrato mais claro, além das diferenças no desempenho dos estudantes medidos por exames padronizados, está nos indicadores de exclusão escolar.

Em uma sala de aula, estudantes de costas estão sentados distantes um dos outros.
Sala de aula da Escola Estadual Leopoldo Santana, na zona sul de São Paulo - Rivaldo Gomes - 14.abr.21/Folhapress

Um estudo recente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (CENPEC) e do Unicef traçou o panorama da exclusão escolar e nos trouxe dados alarmantes. Em 2019, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, cerca de 1,1 milhão de crianças e adolescentes em idade escolar obrigatória estavam fora da escola, a maioria deles nas faixas etárias de 15 a 17 anos (629 mil) e de 4 e 5 anos (384 mil).

Pretos, pardos e indígenas formam o maior contingente de excluídos da educação, correspondendo a cerca de 71% dos estudantes que estavam fora da escola antes da pandemia. O principal motivo apontado pelos estudantes para abandonar a escola foi o de desinteresse em estudar (37% das crianças e adolescentes entre 11 e 14 anos e 38% dos adolescentes entre 15 e 17 anos).

No fim do ano letivo de 2020 o número de excluídos chegou a mais de 5 milhões de alunos. Temos, portanto, um quadro de desigualdade educacional pré-pandemia que se intensificou durante este período, com um maior número de crianças e adolescentes fora da escola. Garantir o direito à educação exigirá políticas educacionais e políticas de apoio à educação no curto e médio prazo nos três níveis de governo e nas escolas.

No curto prazo todas as redes públicas do país devem instituir uma política de busca ativa de crianças e adolescentes que estão fora da escola. Além da busca ativa, o desenho de protocolos simples de acompanhamento da frequência e da participação dos estudantes na escola, antecipando possíveis evasões é uma medida muito eficaz e fácil de ser implementada.

Investir em programas de saúde mental dos estudantes e educadores, na ampliação do acesso à internet e na organização dos tempos e espaços de aprendizagem para a garantia de apoio aos estudantes em situação mais vulnerável são estratégias capazes de fortalecer o vínculo destes estudantes com a escola e evitar sua exclusão. Também é fundamental a instituição de uma rede de proteção social articulando as áreas de saúde, educação e desenvolvimento social no acompanhamento dos estudantes e suas famílias.

A agenda educacional brasileira ainda está presa ao que foi proposto e implementado nas gestões de Paulo Renato Souza e Fernando Haddad. É inegável sua contribuição e o avanço promovido pelas políticas engendradas por ambos, mas hoje é necessário um passo além. Não vamos superar as desigualdades educacionais brasileiras com um sistema em que todos os incentivos existentes contribuem para manter ou até mesmo ampliar a exclusão.

Uma nova agenda exige a instituição de metas e indicadores voltados à redução das desigualdades educacionais e não à variação da média dos resultados, cujo sucesso muitas vezes se dá fechando a porta da escola aos mais vulneráveis.

Esta agenda requer a instituição de um Sistema Nacional de Educação, que organize um regime de colaboração entre a União, Estados e Municípios, dando aos últimos mais autonomia. O fortalecimento dos municípios e a ampliação da autonomia das escolas são medidas capazes de facilitar a aproximação entre a comunidade e a educação públicas. As pessoas “vivem nas cidades” e os professores de seus filhos às vezes habitam o mesmo quarteirão. O prefeito e os gestores educacionais são figuras mais próximas do que as autoridades estaduais e federais.

Por fim é necessário operar uma mudança que vá além da implementação dos currículos. Formar os professores para o uso de metodologias e práticas centradas no estudante, construir uma escola mais humana, que respeite os saberes comunitários, aproxima a aprendizagem da realidade de seus estudantes. Em um cenário de alta exclusão de pretos, pardos e indígenas, por exemplo, não basta cumprir a lei que obriga o ensino da história e cultura indígena e afro-brasileira. É preciso que as escolas sejam ativamente antirracistas e que todos os seus profissionais sejam formados para tal.

O combate à exclusão escolar, chaga antiga que ganhou contornos ainda mais inaceitáveis por conta da pandemia de Covid-19, deve ser a meta mais importante nos próximos anos. A missão da escola pública não é apenas alcançar excelência educacional. É a de garantir que todos estejam na escola, na idade certa, aprendendo. Apoiar a escola pública nessa missão deveria ser nosso mais importante compromisso como brasileiros. ​

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