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Tempo de meninas da Fundação Casa é para estudar, diz coordenadora pedagógica

As jovens internas têm acesso a mesma grade curricular da rede estadual de educação - UOL
As jovens internas têm acesso a mesma grade curricular da rede estadual de educação Imagem: UOL

Bruna Souza Cruz

Do UOL, em São Paulo

07/05/2017 04h00

Aulas do ensino fundamental, médio e profissionalizante de segunda a sexta-feira nos períodos da manhã ou da tarde. É assim que as adolescentes da Fundação Casa passam os seus dias durante a internação.

Frequentar as aulas é uma obrigação diária dentro da medida socioeducativa. Faltas não são permitidas a não ser em casos de licença médica, explica Maria Aparecida de Oliveira Costa, coordenadora pedagógica da unidade.

Além do currículo básico escolar, as jovens são obrigadas a participar de cursos culturais (dança, arte, capoeira, entre outros) e de iniciação profissionalizante. De acordo com a pedagoga, em geral são oferecidos mais de 12 cursos, com média de 15 adolescentes por turma-- a unidade Chiquinha Gonzaga possuía 124 meninas privadas de liberdade em abril.

Cidinha, como é conhecida, explica ainda que as turmas de alunas matriculadas na educação básica (ensinos fundamentais e médio) são multisseriadas--  estudantes de idades diferentes-- e têm cerca de 20 alunos cada sala. O currículo escolar é o mesmo usado nas escolas estaduais de São Paulo e os professores da rede vão até os locais para darem suas aulas.

O tempo delas é para estudar. É um trabalho que elas têm que dar valor a escola, elas estão aqui para estudar, elas têm que valorizar esse momento”

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Cidinha Costa, coordenadora pedagógica

Apesar de corrida, a rotina puxada parece se tornar uma espécie de refúgio e divisor de águas na vida dessas meninas. “Eu preciso estudar. É uma coisa que não tem jeito. Para tudo na vida, né? Então quero terminar os meus estudos”, afirmou Cristina, que largou a escola quando estava na 8ª série e retomou os estudos dentro da unidade. “Estou muito defasada em relação a isso, mas pretendo fazer faculdade futuramente.”

“É mais prazeroso estudar [aqui] porque eles dão uma atenção melhor para a gente. Lá fora tem alguns professores que passam a lição e deixam na lousa, não explica. Aqui eles se dedicam mais, têm mais paciência”, disse Cristina. “Quero me tornar uma cidadã melhor do que o que me trouxe aqui. Quero cuidar do meu filho, dar uma visão para ele para ele seguir como uma pauta.”

Audrey também compartilha da opinião de Cristina. A jovem concluiu o terceiro ano do ensino médio dentro da unidade e foi nela que diz ter descoberto o gosto pelos estudos. “Eu comecei a gostar da escola aqui dentro. Gosto de história, mitologia grega, astronomia. Achava que estudar aqui era ruim, mas parece que os professores aqui conversam mais, têm mais intimidade. Lá fora não ligava muito. Sentava lá no fundão, fone de ouvido. Mas aqui você é obrigada a prestar a atenção”, contou.

Para Maria, o ruim dos estudos dentro da Fundação é que as alunas não podem levar os materiais escolares para os alojamentos. “Às vezes é complicado porque você está aprendendo e você tem lição de casa para fazer. Aquilo fixa na sua mente. Aqui [a lição] é só na escola”, afirmou.

“Lá fora, se a professora está explicando algo e você tem dúvida, você chega em casa e procura no YouTube, pesquisa no Google. Aqui já não. Ou você entende o que a professora está falando ou você fica sem entender” acrescentou.

De acordo com a Secretaria de Educação de São Paulo, entre 2015 e 2016, nove alunas dos anos finais do ensino fundamental concluíram a etapa na unidade Chiquinha Gonzaga. Além disso, três alunas terminaram os anos iniciais por lá e 65 se formaram no ensino médio.

No mesmo período, as unidades da Fundação Casa somaram 18 formandos no fundamental I (1º ao 5ª ano), quatro no fundamental II (6º ao 9º ano) e 116 alunos no ensino médio.

Trabalhando na Fundação Casa há 13 anos, a pedagoga Cidinha diz que o trabalho é muito difícil, mas que as conquistas das jovens que deixam o local compensam todo o esforço.

“Eu acredito muito na educação e eu acredito na mudança. As meninas aqui são muito bem trabalhadas. A gente procura não deixar elas ociosas, procura ocupar o tempo delas integralmente. E elas conseguem sair bem melhores do que quando entraram, saem mais confiantes, mais preparadas para vida, para cidadania”, comentou. 

“A maior recompensa é vê-las felizes, com a mudança visível.”