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Colunistas convidados escrevem para a editoria de Opinião do GLOBO.

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Artigos escritos por colunistas convidados especialmente para O GLOBO.

Por Fabio Campos, Mariana Lederman Edelstein, Renato Russo, Rodrigo Barbosa, Lívia Macedo e Paulo Blikstein

O grupo de transição da educação é motivo de entusiasmo para quem acompanha os desafios do setor. Diferentemente de quatro anos atrás, os participantes têm compromisso cívico e capacidade técnica. E, depois da pandemia, o grupo precisará enfrentar uma nova realidade: a educação de hoje carece de políticas sólidas para a tecnologia. O que antes era um adereço aos sistemas educacionais hoje é indispensável. Países como EUA, Uruguai e Inglaterra já possuem planos robustos de tecnologia educacional. O Brasil, ainda não.

O que a tecnologia pode fazer pela educação? Primeiro, ela permite novas formas de acompanhar a aprendizagem dos alunos, para além dos testes. Ela possibilita, também, novas formas de acesso a materiais educacionais. Mas, principalmente, as tecnologias permitem experiências de aprendizagem inovadoras, num tempo em que alunos estão cada vez mais propensos a abandonar a escola. É o caso dos laboratórios virtuais desenvolvidos pela Universidade Stanford (EUA), em que alunos podem manipular remotamente um microscópio real. Também é o caso de kits de robótica, simulações e laboratórios “mão na massa”, que promovem mais motivação e conexão com a comunidade. Laboratórios desse tipo podem existir em escolas públicas. Sobral, no Ceará, terá um por escola, transformando o ensino de ciências na cidade. O município nos mostra que manter a sala de aula apenas à base de papel e caneta é negar ao aluno uma preparação fundamental para o mundo.

Para chegar lá, não bastam exemplos isolados ou repetir chavões sobre escolas atrasadas. É necessário um plano nacional para tecnologia na educação. É preciso pensar de forma sistêmica, definindo de que tecnologias precisamos e o que esperamos delas, sem messianismo. Um plano nacional deve guiar e dar segurança a quem compra, implementa e usa tecnologia, minimizando promessas furadas, parcerias sombrias ou gastos extravagantes. Um plano robusto também significa formar mais gente para ciência e tecnologia e compartilhar com trabalhadores os meios para produzirem, eles mesmos, soluções tecnológicas. Um plano nacional abre portas para estratégias de contingência, garantindo que alunos não fiquem sem aula em situações extremas, como epidemias, desastres naturais ou violência urbana.

Mas nada disso funciona sem rever a formação de professores. Experiências de ensino remoto na pandemia mostraram que tecnologia não garante qualidade. É preciso formar educadores que ampliem práticas pedagógicas por meio dessas ferramentas, desenhando sequências didáticas focadas em grandes ideias, e não na tecnologia em si. Digitalizar a velha aula expositiva não resolve. Não precisamos que o educador brasileiro domine todas as ferramentas tecnológicas, mas sim que saiba a ferramenta adequada para cada momento pedagógico. Parece fácil, mas não é.

Por fim, é necessário ter clareza sobre o que não dá certo. Pesquisas mostram claramente que ações isoladas e tecnocêntricas não funcionam, como a distribuição em massa de tablets e chips de celular ou a aplicação simplista de softwares. Ao contrário do que sugeriu Bolsonaro, um simples aplicativo não opera milagres nem garante alfabetização em tempo recorde. Tampouco podemos acreditar que ampliar a conectividade nas escolas — ainda que fundamental — seja suficiente. Não se “aprende na internet”; o professor guia o aprendizado.

Haverá quem pense: “Mas, se não temos nem arroz e feijão, por que almejar a picanha?”. O sentimento é legítimo, mas a dicotomia é falsa. A escola do “básico” não funciona no mundo do século XXI, sobretudo com alunos a um passo da evasão. O governo federal, como destinador de recursos, deve olhar para a escola não só como o lugar do “básico”, mas como o lugar em que está sendo fabricada nossa ainda frágil democracia. Será que é hora de economizar?

*Fabio Campos, Mariana Lederman Edelstein, Renato Russo, Rodrigo Barbosa e Lívia Macedo são pesquisadores do Transformative Learning Technologies Lab (TLTL) da Universidade Columbia (EUA), e Paulo Blikstein lidera o TLTL e é professor da Universidade Columbia

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