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Antônio Gois, colunista Foto:  

Sobre pessimismo e realidade

Pesquisa mostra que brasileiros têm percepção da escola pública mais negativa do que indicam os dados oficiais

Em quase todas as cidades do país, hoje é o dia em que alunos, pais e professores voltam à rotina diária de estudos. O início do ano letivo é sempre um momento propício para realimentar nossa esperança de que todo esse esforço, individual e coletivo, será recompensado com uma geração mais preparada para lidar com os desafios que terão no futuro. Uma pesquisa de opinião feita pelo instituto Ideia Big Data para o movimento Mapa Educação mostra, no entanto, que os brasileiros são pessimistas com o ensino público. A maioria (57%) diz ter a percepção de que as escolas estão piorando, e só 11% afirmam sentir que o sistema está melhorando.

Em outras questões do levantamento, é possível comparar as respostas com dados mais objetivos. Uma delas primeiro explica ao entrevistado que o Ideb é um indicador de qualidade da educação brasileira que varia de 0 a 10, e que a meta traçada para o ano de 2021, para o primeiro ciclo do ensino fundamental, é chegar a 6,0. Em seguida, é perguntado: “baseado em sua opinião e nos seus conhecimentos, qual é a média nacional para os anos iniciais do ensino fundamental no Brasil?". A maioria (60%) dos brasileiros afirma que esta nota está abaixo de 5,0. O dado oficial mostra, porém, que a média em 2015 foi de 5,5. Ao menos neste nível de ensino, o que temos visto desde 2005 é uma melhoria constante no percentual de alunos com aprendizado adequado em português e matemática, situação bem diferente da verificada no ensino médio.

O mesmo fenômeno aparece quando os brasileiros estimam o número de analfabetos adultos, o salário médio no magistério ou o percentual de professores com formação superior. A maioria das respostas indica uma percepção mais negativa do que a verificada pelos indicadores oficiais, e o pessimismo é maior entre os brasileiros das classes A e B, que frequentam menos a escola pública.

Isso não esconde o fato de que temos números ainda inaceitáveis de analfabetismo adulto, ou que o salário e a formação dos professores continuam muito longe do ideal, raciocínio que vale também para nossos indicadores de aprendizagem em geral. Nosso sistema educacional tem muitas mazelas, e minimizá-las em nada favorece a missão de melhorar sua qualidade. O problema é que por vezes vamos ao extremo oposto, igualmente infrutífero: ser exageradamente pessimista em relação à real situação do ensino público no país.

Parte desse pessimismo elevado é alimentado pelo mito de que, ao contrário de hoje, no passado tínhamos uma educação pública de qualidade. Uma análise menos subjetiva e saudosista revela, porém, que o ensino público do século passado era na verdade uma máquina de exclusão. Segundo o Censo do IBGE, 70% das crianças de 7 a 14 anos estavam fora da escola em 1940. Cálculos feitos na época pelo estatístico Mario Augusto Teixeira de Freitas (um dos nomes mais importantes na história do IBGE) mostram que a maioria das crianças que ingressavam no primeiro ano do então ensino primário eram reprovadas.

Isso não invalida o relato pessoal daqueles que estudaram em boas escolas públicas. Da mesma maneira que há hoje pequenas ilhas de excelência (geralmente escolas federais altamente seletivas), alguns brasileiros de fato tiveram no passado uma educação pública da qual podem se orgulhar. O problema é que ele era para os poucos que sobreviviam no sistema. Nosso desafio, e ainda estamos muito longe disso, é garantir o mesmo para os 49 milhões de alunos que nesta semana voltam às 184 mil escolas de educação básica no país.

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