Brasil Governo Federal

Sob suspeita de sobrepreço em edital, pregão para a compra de ônibus escolares pelo MEC, marcado para 10h, pode ser suspenso

Senador Randolfe Rodrigues (Rede) pediu providências para TCU e CGU diante de noticias de compra de 3.850 veículos por mais de R$ 2 bilhões
MEC deu prosseguimento à licitação de compra de ônibus escolar mesmo com observações das equipes técnicas apontando um sobrepreço do edital Foto: DDUBARD / Agência O Globo
MEC deu prosseguimento à licitação de compra de ônibus escolar mesmo com observações das equipes técnicas apontando um sobrepreço do edital Foto: DDUBARD / Agência O Globo

RIO — O senador Randolfe Rodrigues (Rede) entrou com uma representação junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU) para tentar barrar a realizaçao de um pregão eletrônico, marcado para hoje, às 10h, em que serão escolhidos os fornecedores de 3.850 ônibus escolares pelo Ministério da Educação. O edital para a compra, estimada em mais de R$ 2 bilhões, estaria com valores acima do mercado autorizando a aquisição de veículos por até R$ 480 mil. De acordo com o jornal O Estado de S.Paulo, a pasta deu prosseguimento à licitação mesmo com observações das equipes técnicas dos dois orgãos de controle apontando um sobrepreço do edital já que os ônibus deveriam custar no maximo cerca de R$ 270 mil. É a primeira crise no MEC sob a gestão do novo ministro Victor Godoy, que substituiu MIlton Ribeiro, afastado do cargo logo após denuncías de lobby de dois pastores evangélicos para liberar recursos da pasta.

— As pessoas têm falado na existência de um gabinete paralelo no MEC. Mas, na verdade, não é paralelo, é oficial. É o próprio ministério operando - diz o senador, referindo-se à última crise da pasta, que envolve pastores ligados a Milton Ribeiro. — Espero que o TCU suspenda o pregão ainda hoje. Ao mesmo tempo, esses acontecimentos reforçam a necessidade de uma CPI para investigar o MEC. Acho que hoje ainda chegaremos a 15 assinaturas e, ao fim da semana, teremos o total necessário para abrir a comissão.

Sob suspeita de influência de pastores: MEC tem mais de 3,5 mil obras escolares atrasadas que já custaram R$ 1,3 bilhão

Coleta de dados: TCU determina inspeção no MEC após lobby de pastores no ministério

Veja também: Prefeitos que relataram irregularidades no MEC falam no Senado

O caso já vem sendo chamado de “onibaço”. O edital foi lançado dentro do programa Caminho da Escola com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educaçao (FNDE). Criado em 2007, o programa ja entregou cerca de 57 mil ônibus escolares. Atas de licitações semelhantes realizadas nos últimos anos, analisadas pelo GLOBO, mostram que as últimas concorrências tiveram valores que partem de cerca de R$ 140 mil — para ônibus de até 29 assentos —, até valores mais altos, sobretudo de automóveis com elevadores especiais para atender alunos com deficiência ou problemas de mobilidade, que podem chegar a R$ 280 mil.

De olho nos microdados: Tribunais de contas pedem que Inep revise restrições na divulgação de dados educacionais

O documento da área técnica de controle do governo federal, de acordo com o jornal Estado de S.Paulo, aponta que os valores mais altos deveriam ficar em R$ 270,6 mil. Ao todo, serão adquiridos 3.850 veículos por sistema de pregão para atender a alguns municípios e ao Distrito Federal. O preço final da compra, por conta dessas discrepâncias apontadas para os valores, pode pular de R$ 1,3 bilhão para R$ 2,045 bilhões, um acréscimo de 55% ou R$ 732 milhões. Em parecer, os valores exorbitantes foram questionados pela Controladoria-Geral da União (CGU), que criticou “a discrepância das cotações apresentadas pelos fornecedores em relação ao preço homologado do último pregão”

Especialistas: Despreparadas, escolas vão ter que lidar com mais casos de violências com alunos estressados após dois anos de pandemia

O deputado Ivan Valente (PSOL) tambem já encaminhou pedido para que o Ministério Público Federal investigue se houve irregularidades na estruturação da concorrência. O FNDE é presidido por Marcelo Ponte, indicado pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira. O fundo, que concentra a maior parcela de recursos da pasta, cerca de R$ 45 bilhões, está na mira do Centrão. Um dos diretores do fundo, Garigham Amarante, foi indicado por Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido do presidente Jair Bolsonaro. Em dois despachos sobre a compra dos veículos, é ele que opina pelo prosseguimento do processo de aquisição.

Migração ilegal para os EUA: Número de inquéritos da PF contra coiotes no Brasil cresce 446% em dois anos

No rastro das discussões, estão as políticas públicas para educação do ministério. Para especialistas, a possibilidade de uso político da verba da pasta coloca em xeque a legitimidade de programas extremamente necessários como o do transporte escolar. A consultora em educação Mariza Abreu diz que as ações do estado devem ser transparentes e visar a objetividade da aplicação do orçamento.

Lésbicas tardias: Mulheres contam como viram seus corpos descobrirem novos prazeres depois dos 30

— Se você não tem regras claras e automatizadas, como cálculos per capita, por exemplo, fica difícil acompanhar a execução orçamentária e saber se a divisão está sendo justa. Você pode tanto abrir margem para uso político dos recursos como também para corrupção. Na verdade, a defesa de critérios tem sido uma batalha antiga, não é um problema recente, mas ficou escrachado no governo Bolsonaro — observa Mariza.

Patroa convenceu a vítima: Doméstica mantida em situação análoga à escravidão por 40 anos é resgatada na Bahia

O Programa Caminho da Escola prevê a entrega de ônibus escolares para atender, sobretudo, municípios na região rural do país, que têm estradas precárias e sistema de transporte desorganizado, e garantir assim a permanência dos alunos em sala de aula. O edital, que vai escolher os fornecedores hoje, cria uma ata de preços para ônibus escolares de quatro tipos: com capacidade para 29, 44 e 59 assentos e modelos menores, inclusive com tração nas quatro rodas. Uma vez registrada a ata e com a adesão dos fornecedores, prefeituras podem adquirir os veículos pelo preço combinado, com recursos do FNDE e sem que seja necessária a realização de licitações próprias.