Campanha antecipada

Zema distorce causas dos ataques a escolas para defender redução da maioridade penal e é rebatido

Fala do governador de Minas Gerais é classificada como “cínica” e “oportunista” diante do ataque a escola de Poços de Caldas, que matou um aluno e deixou três feridos

Reprodução
Reprodução
De acordo com especialistas em educação, o aumento dos atentados em escolas está, na verdade, diretamente relacionada à circulação dos discursos de ódio

São Paulo – O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), distorceu e minimizou as causas dos ataques a escolas para defender a redução da maioridade penal, atualmente de 18 anos. “É inaceitável qualquer atentado contra a vida de nossas crianças. Temos que combater o bullying nas escolas, mas o Congresso tem que ter coragem para discutir a redução da maioridade penal, pra acabar com eventos como esse de Poços de Caldas”, escreveu em redes sociais. A declaração foi feita em referência ao mais novo caso de violência em uma instituição de ensino, ocorrido ontem (10), na Escola Profissional Dom Bosco, em Poços de Caldas, sul mineiro.

Um adolescente de 14 anos, ex-aluno da unidade, matou a facadas um estudante também de 14 anos e feriu outros três, sendo dois de 13 e uma de 17 anos. Dois deles estão internados em estado gravíssimo. Em depoimento à Polícia Militar, o autor do ataque afirmou que foi transferido da escola em 2021 após ser vítima de bullying e que queria se vingar. Ele disse também ter a intenção de “ceifar a vida dos alunos de sua antiga sala”, mas percebeu que eles estudavam apenas no período matutino e que por isso atacou todos os alunos que conseguiu encontrar.

O crime ocorreu por volta das 16h30, durante a saída dos estudantes. O agressor chegou a tentar entrar na unidade de ensino, mas foi impedido por adultos e passou desferir os ataques do lado de fora. A PM foi acionada e apreendeu o estudante. Ele foi levado à delegacia ferido, após ser contido por populares.

Fala de Zema é rebatida

De acordo com especialistas em educação, o aumento dos atentados em escolas está, na verdade, diretamente relacionada à circulação dos discursos de ódio, fomentados pela extrema direita principalmente nas redes sociais. Para educadores, o enfrentamento passa sobretudo por medidas de prevenção e melhorias urgentes na estrutura, principalmente das escolas públicas.

“Infelizmente, agora são 26 ataques a escolas com mortes no país. Enquanto o Brasil não assumir que precisa enfrentar o extremismo e o ódio, os ataques continuarão. Expresso minha solidariedade às três mulheres e ao adolescente que sobreviveram e à toda a comunidade do Colégio Dom Bosco. Lamento profundamente a morte de um jovem, covardemente assassinado. Há possibilidades de ação por parte das autoridades, mas ainda falta consciência sobre o fenômeno dos ataques e coragem para enfrentá-lo. Por sorte, há exceções: os ministérios de Flávio Dino e Silvio Almeida”, afirmou o professor e pesquisador na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Daniel Cara.

A declaração do governador também foi alvo de críticas nas redes sociais. O advogado, doutorando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB) e professor universitário Thiago Viana classificou como “cínico” o discurso. “Zema diz tem que ‘combater o bullying nas escolas’ e o Congresso aprovar a redução da maioridade penal. Nada sobre liberou geral de armas de Bolsonaro e sobre desmonte de políticas pra cultura de paz e respeito às diversidades. Cinismo não tem limite”, escreveu.

Notas de solidariedade

Autor do livro A Arte da Guerra Online: Como Enfrentar as Redes de Extrema Direita na Internet (Autografia, 2022), Vinicios Betiol também destacou a fala, que chamou de “oportunista”. “No mesmo dia em que o líder do PL, Altineu Côrtes, comparou professores com o Hamas, um adolescente promoveu um ATAQUE A UMA ESCOLA em Minas Gerais, matando um estudante e ferindo outras quatro pessoas. Esses ataques só acontecem porque os criminosos enxergam nas escolas um ambiente que precisam combater e, sem dúvidas, o discurso de ódio de alguns parlamentares tende a contribuir para esse clima hostil com o ambiente escolar. Chega de oportunistas usando as escolas como promoção política sensacionalista”, reagiu o mestre em Geopolítica pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), que se referiu ao deputado federal bolsonarista Altineu Côrtes (PL-RJ).

Professora da educação básica da rede pública, a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT-MG), ex-presidenta da CUT-MG, também lembrou que ataque é mais um caso “devastador” e se solidarizou com as vítimas. “Meu abraço e apoio à comunidade escolar vítima desta cruel violência”.

Desde abril, o país conta com a cartilha Recomendações para Proteção e Segurança no Ambiente Escolar, criada pelo governo federal. A elaboração foi motivada pelo crescimento de casos de violência nestes ambientes. Também se trata de uma das primeiras respostas da gestão após a instalação de um comitê interministerial para elaboração de políticas públicas de prevenção e enfrentamento à violência em escolas e creches. A cartilha propõe uma série de ações focadas em três momentos: prevenção, intervenção e posvenção. “Os programas exigem das instituições de ensino esforços colaborativos em toda a comunidade”, afirma o material.

Confira outras repercussões:


Leia também


Últimas notícias