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‘Risco de criança ser internada por Covid-19 é menor do que por outros vírus com os quais convivemos’, diz infectopediatra

Luciana Becker Mau, representante do Ciências pela Escola, participa nesta quarta do encontro Classes Abertas, às 17h, que debate a volta às aulas
Sala de aula com protocolos na Escola Estadual Dom Agnelo Cardeal Rossi, em São Paulo Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Sala de aula com protocolos na Escola Estadual Dom Agnelo Cardeal Rossi, em São Paulo Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

RIO - Infectopediatra integrante da Comissão de Saúde da Secretaria estadual de Educação de São Paulo e do grupo Ciência pela Escola, Luciana Becker Mau defende que o Sars-CoV-2, causador da Covid-19, é menos perigoso para crianças do que outros vírus que as escolas convivem todos os anos. Por isso, ela defende que as escolas sejam reabertas, com os devidos protocolos e condições de segurança, para combater "problemas ainda mais graves causados nas crianças pela falta de aulas presenciais".

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— O risco de a criança ser internada por Covid-19 é menor do que por outros vírus com os quais sempre convivemos, como o Influenza e o Vírus Sincicial Respiratório (VSR) — afirma Becker Mau, também integrante do Ciências pela Escola, grupo de pediatras que lutam pela volta às aulas de forma segura e a partir de evidências científicas.

A especialista é uma das convidadas para o encontro virtual Classes Abertas, nesta quarta-feira às 17h, no YouTube do Canal Futura. O tema será “De volta na escola? A retomada das atividades presenciais nas escolas: Como? Quando? Por quê?”.

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A infectopediatra defende ainda que as escolas podem funcionar em qualquer nível de contaminação durante a pandemia — tendo, no entanto, que ajustar e deixar mais rígido os protocolos quando o nível de infecção crescer na comunidade. E  que o fundamental para as escolas é garantir locais com espaço para as aulas, mesmo com classes sejam improvisadas em quadras esportivas abertas, por exemplo.

Além de Becker Mau, o encontro conta com a secretária estadual de Educação do Mato Grosso do Sul e vice-presidente do Conselho Nacional dos Secretários de Educação (Consed), Cecilia Motta; a estudante de jornalismo Maria Lima, 19 anos, de Campo Grande (MS), jovem pesquisadora participante da pesquisa “Juventudes e a Pandemia”; o epidemiologista e secretário de serviços integrados de saúde do Supremo Tribunal Federal Wanderson Oliveira; o estudante de Fís ica Caio Henrique Santos, 20 anos, de Recife (PE), estagiário da rede pública de ensino e ativista em políticas públicas de educação e juventudes; e o estudante Cícero Igor dos Santos, 17 anos, de Aracaju (SE), integrante do projeto Jovens Porta-Vozes do Ensino Médio Integral. A mediação é do jornalista Bernardo Menezes, do Canal Futura.

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Dados apresentados pelo Ciências pela Escola apontam que são muito raras as complicações nessa faixa etária, representando apenas 0,6% dos óbitos, sendo que as crianças são 25% da população nacional. Mas por que os pais deveriam correr esse risco, mesmo mínimo?

No começo da pandemia, quando a gente começou a registrar o aumento do número de casos, não tinha como saber como o vírus se comportaria em crianças. As medidas tomadas foram baseadas no Influenza, um risco, aliás, maior para as crianças. Em fevereiro e março de 2020, isso fazia sentido. No entanto, descobrimos depois que as crianças são muito pouco acometidas pela Covid-19. E quando o são, em sua maioria as infecções são leves, só uma porcentagem muito pequena se agrava. Claro que ninguém quer ser a ponta ruim da estatística, mas podemos fazer um paralelo com os riscos que a gente corria antes da pandemia, e eles não são maiores agora com o coronavírus.

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Qual a comparação?

Com outros vírus, como o VSR, principal causa de internação respiratória na pediatria, e o próprio Influenza. O risco de uma criança ser internada por Covid-19 é menor do que por outros vírus com os quais sempre convivemos. E é preciso comparar o risco de aquisição da doença versus os problemas causados pela criança ficar em casa, sem ir à escola.

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Quais são esses riscos?

Prejuízos no desenvolvimento psicomotor, na aprendizagem pedagógica, e nas seguranças alimentar, social e contra violências. A escola oferece  uma série de benefícios conhecidos, que ficaram escancarados quando ela ficou fechada. Detectamos um aumento de casos de atraso de desenvolvimento, crianças sofrendo violência, crises de ansiedade, obesidade. E tudo isso levará anos para ser recuperado.

Num cenário de escassez de recursos, quais cuidados são os essenciais ao se fazer escolhas de onde se gastar o dinheiro da educação pública?

É preciso ter espaço. Salas muito pequenas não podem ser usadas. Precisamos olhar para outros equipamentos disponíveis, mesmo que for preciso adaptar locais para se ter um espaço ventilado. Aulas em pátios, quadras esportivas. Isso ajuda e acaba trazendo mais crianças para as escolas.

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Quais são os outros pontos fundamentais?

Afastar todos os sintomáticos, mesmo sem confirmação da doenç. Incentivar o uso de máscaras para todos acima de dois anos. Calcular a capacidade de espaço dos ambientes para manter as crianças afastadas o tempo todo. Garantir a higienização das mãos com álcool em gel ou água e sabão. E separar as crianças em grupos fixos, para diminuir o contato durante o dia. Isso ajuda muito no rastreamento de possíveis casos suspeitos.

Existe um nível de contaminação que justifique o fechamento das ecolas?

Não. O protocolo serve para evitar a contaminação dentro da escola. Se o nível de infecção na comunidade é alto, claro, terei alguém que adquiriu a doença em outros ambientes e será preciso fechar muitas turmas seguidas vezes. E, assim, menos alunos terão aula em casa. Quanto mais descontrolada a pandemia, portanto, menos aula presencial. Mas a experiência mostra que existe condição de manter a escola aberta em qualquer momento, o que temos  de fazer é ser rigorosos nos protocolos. As escolas têm influência muito pequena na piora da pandemia e por isso sempre devem ser priorizadas para funcionar.