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Dinheiro que falta para a Educação sobra para os militares

Jair Bolsonaro passa em revista a tropa Duque de Caxias, no Congresso Nacional - Reprodução
Jair Bolsonaro passa em revista a tropa Duque de Caxias, no Congresso Nacional Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

17/08/2020 16h25

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Alguém viu por aí o pastor Milton Ribeiro, quarto ministro da Educação nomeado por Bolsonaro, já faz mais de um mês?

Até agora ele não apareceu em público para comentar os cortes no orçamento do seu ministério nem para apresentar um plano de trabalho.

Só fui ver a cara dele domingo numa foto na capa da Folha, falando no telão da igreja presbiteriana Jardim da Oração, em Santos (SP), onde ele continua no seu ofício de pastor-titular.

Já tivemos ministro da Educação lunático; um colombiano que mal falava português; depois, veio um caçador de "comunistas" semianalfabeto, terraplanista alucinado, já despachado para o Banco Mundial; em seguida, um professor cheio de títulos fajutos que não chegou a tomar posse e, agora, professores, estudantes e pesquisadores estão nas mãos de um fantasma.

Isso explica muita coisa.

Se a Educação já estava jogada às traças, com seguidos cortes no orçamento, vai ficar pior ainda no ano que vem.

Vejam o absurdo: "Ministério da Defesa deve ter mais dinheiro do que a Educação em 2021", informa o repórter Mateus Vargas, no Estadão desta segunda-feira.

"Segundo a previsão, a Defesa terá um acréscimo de 48,85% em relação ao orçamento deste ano, passando de R$ 73 bilhões para R$ 108,56 bilhões em 2021. Enquanto isso, a verba do Ministério da Educação deve cair de R$ 103,1 bilhões para R$ 102,9 bilhões".

Para os militares, tudo; para o resto, "o cobertor está curto", segundo o presidente Bolsonaro em sua última live.

Por acaso o país está em guerra para destinar R$ 5,8 bilhões a mais para as Forças Armadas do que para a Educação?

"Pô, você é militar e esse ministério aí vai ser tratado dessa maneira? Aí tem de explicar. Para aumentar para o Fernando (referindo-se ao general Fernando Azevedo e Silva, ministro da Defesa), tem de tirar de outro lugar", justificou o presidente.

"Líder sindical" dos militares

Bolsonaro deixou de ser militar há mais de 30 anos — "um mau militar", como o definiu o ex-presidente Geisel — mas não esqueceu dos companheiros de caserna que o afastaram dos seus quadros quando planejava jogar bombas nos quartéis. Depois, seria absolvido pelo Superior Tribunal Militar.

Na Câmara dos Deputados, onde se alojou no baixo clero do Centrão, que agora levou para o governo, o ex-capitão sempre foi um líder sindical dos militares e defensor da ditadura e de torturadores.

É o caso de se perguntar por que e para que as Forças Armadas precisam de tanto dinheiro.

Numa rápida pesquisa, encontrei um levantamento do repórter Lúcio Vaz sobre gastos militares com pessoal.

Em 2018, o Brasil contava com 5.290 generais na reserva (aposentados) e apenas 140 na ativa.

Só com os generais de pijama o Brasil gastava na época R$ 1,7 bilhão por ano, antes dos benefícios oferecidos por Bolsonaro.

Quantos exércitos no mundo podem se dar a esse luxo?

Com as bonificações do "adicional de habilitação", que chegam a 73% dos salários, já incorporado no holerite de julho, o impacto na folha de pagamentos deste ano será de mais R$ 1,3 bilhão e, em 2021, chegará a R$ 3,6 bilhões.

O salário dos generais subiu de R$ 22,9 mil para R$ 30,2 mil. Qual é o professor do ensino público que pode sonhar com um salário desses?

A folha de pagamentos já consome 91% das despesas da Defesa. Não sobra quase nada para comprar tanques, baterias antiaéreas, submarinos nucleares, canhões, aviões e munições. Mas também não precisa.

O que ameaça o futuro do Brasil não são inimigos externos, mas a ignorância, a falta de recursos e de um projeto para a Educação, a Ciência e a Saúde, a proteção da Amazônia e do Pantanal.

Não será certamente taxando os livros, que para o ministro da Economia, Paulo Guedes, "são coisa de rico", que nossa Educação vai melhorar.

O ministro-fantasma da Educação ainda não se manifestou sobre o assunto. Quantas audiências ele já teve com o presidente? O que foi decidido?

Diante desse cenário, Edson Fachin, ministro do STF e vice-presidente do TSE, não está nada otimista. Ele vê uma "escalada autoritária" no Brasil, como disse numa videoconferência nesta manhã:

"O futuro está sendo contaminado de despotismo e lamentavelmente nos aproximamos de um abismo".

Vida que segue.