Vai se desenhando no debate público um raro consenso nacional, a unir esquerda, direita, pais e especialistas em torno de mudança significativa no ambiente escolar. Seja em salas de aulas, intervalos ou recreios, algum tipo de restrição ao uso de telefones celulares por estudantes já é realidade em pelo menos 16 redes estaduais antes mesmo de uma lei federal.
Com o apoio do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT), tramita na Câmara um texto único que reúne 14 propostas defendidas por deputados de diversas nuances ideológicas.
O projeto proíbe o uso dos aparelhos, à exceção para fins pedagógicos, por todo o período em que o aluno estiver na escola, do ensino infantil ao médio, e tanto para unidades públicas como privadas. Mas o uso pedagógico da tecnologia deve merecer debate mais exaustivo e ser estimulado.
A expectativa é que, aprovada na Comissão de Constituição e Justiça, a proposta siga logo para o Senado, sem votação em plenário, a tempo de a norma valer já para o ano letivo de 2025.
Levantamento da Folha também apontou que, entre as capitais, pelo menos 14 redes municipais, responsáveis pelo ensino fundamental, adotam alguma limitação, ainda que com níveis variáveis de adesão e sucesso.
De fato, a exposição desregrada, prolongada e até compulsiva às telas é desafio crescente para responsáveis, educadores e profissionais de saúde e atinge juventudes em todo o mundo —cada vez mais precoces e quase sempre em todas as classes sociais.
Em uma sociedade digital, o impulso pela conectividade exerce uma miríade de estímulos e consequências psiconeurológicas, sobretudo na saúde mental de cérebros ainda em formação.
Estudos apontam distração e perda de foco; aumento da ansiedade e do estresse; interferência nas relações interpessoais e baixo progresso de habilidades, incluindo queda no desempenho acadêmico. Aflições recentes abrangem incentivos à prática de cyberbullying e até apostas esportivas e jogos a dinheiro.
Como ocorre na maioria das proibições, a repressão, por si só, pode ensejar um efeito contrário, ou seja, gerar mais apelo e curiosidade pelo uso dos celulares no dia a dia escolar.
Uma nova lei federal não deveria ser aprovada às pressas, em busca de soluções simplistas para questões complexas. O celular muito provavelmente será parte da rotina desta e de próximas gerações, e a contenção de eventuais abusos não pode prescindir de flexibilidade e adaptação a diferentes realidades.
A mesma regra vale para os estudantes, principalmente pré e adolescentes, já cientes dos riscos da prática indiscriminada.
Eventual impedimento nacional não deve demonizar a tecnologia no âmbito didático, que apresenta resultados pedagógicos comprovados. O caminho para aliar formação de qualidade com desenvolvimento interpessoal passa pela conscientização.
Compreendo, porém legislação é uma coisa, fiscalização outra.