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Rejeitado, Feder decide declinar de convite para o MEC

Secretário de Educação do Paraná foi convidado pelo presidente na quinta-feira, mas desistiu após ficar irritado com postura de Bolsonaro
Renato Feder é secretário de educação do Paraná Foto: Reprodução internet
Renato Feder é secretário de educação do Paraná Foto: Reprodução internet

BRASÍLIA — O secretário de educação do Paraná, Renato Feder, desistiu do convite feito pelo presidente Jair Bolsonaro para comandar o Ministério da Educação (MEC). Neste domingo, Renato Feder publicou em suas redes sociais que recebeu ligação do presidente na quinta-feira, mas que declina do convite.

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Na nota, Feder afirma que ficou "muito honrado com o convite, que coroa o bom trabalho feito por 90 mil profissionais da Educação do Paraná", mas que continuará conduzindo os trabalhos na secretaria estadual. O secretário desejou ainda boa sorte ao presidente e uma boa gestão no MEC.

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Fontes próximas a Feder revelam que a postura do presidente após o vazamento do convite para o MEC contrariou o secretário do governo de Ratinho Júnior (PSD). Depois do telefonema de quinta-feira, Feder já havia trocado mensagens com Bolsonaro e combinado ficar em silêncio até a nomeação. Mas o fato de Bolsonaro não ter se posicionado quando evangélicos e olavistas começaram a empreender ataques a Feder irritou o secretário, que considerou a atitude "desrespeitosa". O GLOBO apurou que Bolsonaro já tinha avisado a alguns parlamentares que o nome de Feder "estava fora”.

Interlocutores do ex-secretário dizem que ficou a impressão de que Bolsonaro deixou Feder "cozinhando em banho maria" enquanto o professor "apanhava" de aliados do próprio presidente.

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Mais cedo, Feder já havia se pronunciado no Twitter sobre acusações que vinha recebendo desde que seu nome foi anunciado. O convite provocou reação negativa em vários núcleos do governo, principalmente na ala evangélica, que reivindicou diretamente ao presidente que ele voltasse atrás.

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Neste domingo, Renato Feder postou no Twitter que gostaria de ser avaliado pelo que “pensa e faz hoje, como gestor público, ao invés de um livro escrito há quinze anos”. “Escrevi um livro quando tinha 26 anos de idade. Hoje, mais maduro e experiente, mudei de opinião sobre as ideias contidas nele... Acredito que todos podem e devem evoluir em relação ao que pensavam na juventude. Gostaria de ser avaliado pelo que eu penso e faço hoje, como um gestor público, ao invés de um livro escrito quinze anos atrás...”, escreveu na rede social.

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Ele se referia ao livro "Carregando o Elefante – Como transformar o Brasil no país mais rico do mundo", que escreveu em 2007 com Alexandre Ostrowiecki. Nele, Feder defendeu a proposta de utilizar "vouchers", ou seja, de financiar a educação dos estudantes em escolas privadas. Na publicação, também questionou se o Estado era de fato o ente ideal para conduzir a administração de escolas.

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Na sexta-feira, O GLOBO revelou que o pastor Silas Malafaia foi um dos que conversou com Bolsonaro e se opôs à indicação de Feder para o MEC. Na ocasião, embora já tivesse convidado o secretário, o presidente afirmou a Malafaia que a decisão ainda não estava tomada. De lá para cá, a incerteza em torno do nome de Feder aumentou, diante desse contexto, o secretário resolveu se antecipar a Bolsonaro e afirmar que recusava o convite.

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Aém dos evangélicos, a ala olavista do governo e parte dos militares também se opuseram a Feder, os motivos eram variados: desde sua ligação com o governador tucano João Doria (PSDB) no passado, de quem foi um dos principais financiadores de campanha em 2016; até sua suposta proximidade com o grupo Lemann, por conta de parcerias firmadas na secretaria de Educação do Paraná. O fato de ser um nome ligado à classe política, como possível aceno a partidos da base do governo, também incomodou aliados do presidente.

Em um ano determinante para a área, quando termina a vigência do Fundeb, principal fundo de financiamento da educação básica, o MEC enfrenta uma crise para a escolha de seu novo gestor. Além da  PEC do novo Fundeb, que aguarda votação na Câmara dos Deputados, o MEC precisa conduzir o processo de retorno às aulas após a pandemia e decidir a data do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que foi adiado devido ao novo coronavírus.

Desde de a saída de Abraham Weintraub,  há pouco mais de duas semanas, o governo tenta encontrar um substituto para a pasta. O presidente chegou a nomear o professor Carlos Alberto Decotelli, mas a permanência no cargo durou apenas cinco dias. Decotelli pediu demissão após a divulgação de que seu currículo continha informações falsas e depois de ser alvo de acusações de plágio em sua dissertação de mestrado. Após a saída de Decotelli, que causou constrangimento no governo, o presidente tenta encontrar um nome técnico, que tenha aceitação em todas as alas do governo. Mas o caso de Feder mostra que a tarefa não será fácil.

A decisão sobre quem deve assumir a pasta é esperada para a próxima semana. Uma parte do grupo militar no governo com interface com os evangélicos tenta emplacar Anderson Correia, ex-presidente da Capes e atual reitor do ITA, para o cargo. Outros nomes que ganharam fôlego são de Sérgio Sant'Ana, ex-assessor do próprio Weintraub; e de Ilona Becskeházy, atual secretária de Educação Básica do MEC.

Com a indecisão em relação à sucessão na pasta, o MEC se soma ao ministério da Saúde na falta de um titular no comando. Em meio à maior pandemia do século, a Saúde está sob o comando do general Eduardo Pazuello, que assumiu a pasta interinamente após a saída de Nelson Teich e acabou continuando no cargo. As pastas estão entre os três maiores orçamentos da esplanada, perdendo apenas para o Ministério da Economia.