Educação
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Por — Rio de Janeiro

Com apenas 5 anos, o filho da estilista Claudete Alphonsus teve a cor da pele comparada a fezes em uma escola particular de São Paulo. A mãe só descobriu a injúria racial após o menino ter febre e se recusar a ir para o colégio, que sequer oferecia lápis coloridos para representar os muitos tons da pele negra nas aulas de pintura.

— Foi desolador ver meu filho passar por isso e saber que ainda hoje esse é um tema tabu em casa e na escola. Sempre ensinei que a pele e o cabelo crespo dele são lindos, a partir de referências em desenhos, filmes e na família. Mas, por ele ser um dos únicos negros da escola, a influência das crianças brancas era grande e ele me questionava porque não tinha o cabelo liso — diz Claudete.

“Feia”, “cabelo de palha” e “pele de cocô” são alguns dos comentários racistas mais falados por crianças nas escolas nos primeiros anos de vida, quando ainda nem sabem o significado da palavra “preconceito”. Entre 3 e 7 anos são comuns dúvidas sobre o motivo de muitas pessoas da área da limpeza e em situação de rua serem negras. Por não saberem ou se interessarem em explicar, os questionamentos por vezes são ignorados pelos adultos, o que perpetua estigmas sociais entre crianças brancas e negras.

Trabalho de formiguinha

Especialistas em educação defendem que não há idade mínima para falar do tema, porque as crianças já nascem em uma sociedade marcada por preconceitos e os reproduzem no dia a dia. Para identificar atos racistas, que por vezes são sutis, no entanto, é importante que pais e professores se empenhem em adquirir o letramento racial, por leituras e debate em grupo.

Referência em educação antirracista com crianças entre 4 e 6, a Escola Municipal de Ensino Infantil Nelson Mandela, em São Paulo, é adepta de ensinar brincando. Uma família interracial de bonecos de pano do tamanho das crianças são personagens de histórias que pregam o respeito à diversidade. Este ano, a prefeitura destinou 128 mil bonecas e bonecos negros e migrantes às escolas de educação infantil para atividades de cunho pedagógico.

— Quando percebemos que um aluno não quer dar a mão a um colega negro com recorrência, usamos os bonecos para contar essa situação, mas sem expor as crianças envolvidas. Eles desenvolvem a empatia por meio da fantasia — explica a coordenadora pedagógica da Emei, Alice Gomes. — Mas é um processo que leva meses, às vezes um ano inteiro, e deve ser aliado ao diálogo individual com os alunos, quando o caso for mais grave.

Outra forma de combater o preconceito é recontar a história de personalidades negras e indígenas. Este ano, a creche batizou as sete turmas com nomes como a escritora Carolina Maria de Jesus, a ativista ambiental Wangari Maathai, primeira mulher africana a receber o Prêmio Nobel da Paz, e Ailton Krenak, o primeiro escritor indígena eleito para a Academia Brasileira de Letras.

— Não contamos a história dessas pessoas pela perspectiva do racismo, mas pela potência de cada uma para a história. É importante trabalhar esses temas todo o ano e não só em novembro, no mês da Consciência Negra — recomenda Alice.

A lei 10.639 estabelece o ensino de história e cultura afro-brasileira com o objetivo de resgatar a “contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à História do Brasil”. O Espaço Cria, criado no Rio com propósito inclusivo, transforma a lei em prática ao diversificar livros didáticos com histórias de cada um dos países africanos e seus muitos reis e rainhas.

— É importante deixar claro que somos diferentes e que essas diferenças são boas. Ao contar a história de países da África abordamos aspectos culturais mas também físicos, explicando que o cabelo crespo se deve a um clima que tem sol mais predominante, por exemplo — relata a coordenadora pedagógica Dandara Aquino, acrescentando que por ser uma escola majoritariamente composta por alunos brancos, o espaço tem a preocupação de mesclar estudantes de diferentes etnias em cada sala, assim como os professores. Hoje, metade dos funcionários são negros.

Ter profissionais aliados na causa evita casos como o do Colégio Ágape, escola particular em Goiana, na Zona da Mata Norte de Pernambuco, em que palha de aço foi usada para representar cabelos afro em uma atividade extracurricular para uma turma de crianças de 3 anos no Dia da Consciência Negra. Diante da repercussão nas nas redes sociais de como essa abordagem ridiculariza fenótipos negros, a escola pediu desculpas e informou que advertiu as profissionais envolvidas no episódio. A Secretaria de Educação de Pernambuco informou que fará uma inspeção no colégio.

Mas a responsabilidade não está apenas na escola e deve merecer também a atenção dos pais. Desde a primeira infância, dizem os especialistas, a família deve ensinar o que é racismo e inserir representações de pessoas negras no ciclo social de amigos e em espaços de poder no cotidiano. Entre as famílias negras, é preciso prestar atenção aos sinais de desânimo das crianças e aversão à própria imagem, um indício de que estão sendo vítimas de racismo. O indicado é encorajar a criança a conversar sobre seus sentimentos, direcionando-os para um campo de valorização do que tenha sido motivo de preconceito.

Foi assim que a jornalista Letícia Costa descobriu que a filha de 3 anos era vítima de discriminação por colegas de turma. A menina não deixava ninguém encostar em seu cabelo, o que levou os pais à escola, onde o problema foi confirmado. Decidida a transformar a situação em algo que pudesse fazer a filha se orgulhar de suas origens, Letícia criou um grupo no WhatsApp para mães pretas.

— É preciso criar uma rede de apoio para mudarmos essa realidade — afirma.

O Centro de Desenvolvimento Infantil da Universidade Harvard compilou estudos sobre o racismo estrutural e constatou que lidar com o preconceito diariamente tem efeito sobre a saúde, o corpo e o cérebro de crianças, além de impactar o aprendizado e o comportamento.

— O primeiro impacto é na construção das subjetividades das crianças negras e brancas. O olhar para essas duas perspectivas é preciso para que as crianças negras não cheguem à vida adulta com uma representação de si que cotidianamente nega o seu valor — explica a especialista em educação do Projeto Seta, Luciana Ribeiro.

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