Deborah Bizarria

Economista pela UFPE, estudou economia comportamental na Warwick University (Reino Unido); evangélica e coordenadora de Políticas Públicas do Livres

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Deborah Bizarria

Racismo afeta desenvolvimento de crianças negras desde a escola

Estudos mostram os vieses raciais na avaliação de alunos por professores

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Os ataques racistas sofridos pelo jogador Vini Jr., do Real Madrid, reacenderam o debate sobre o racismo no esporte e na sociedade como um todo. Esse acontecimento lamentável mostra como o racismo é uma realidade histórica e presente, que se manifesta nas relações sociais, afetando diversos aspectos da vida das pessoas negras. Qual a dimensão do dano ao desempenho profissional de um jogador que encara um estádio lotado proferindo ofensas racistas?

O impacto do racismo não se limita ao esporte. Em um país tão desigual como o Brasil, a maioria das crianças não têm acesso a uma educação de qualidade e acaba presa a um ciclo de pobreza. Para além dos fatores socioeconômicos, o viés racial que permeia a cultura piora as chances de aprendizado das crianças negras. Esse viés pode gerar barreiras e desafios para o acesso, a permanência e o sucesso escolar das crianças negras.

Estudo de Walter Gillian e outros autores evidencia o papel dos vieses implícitos dos educadores nas disparidades em expulsões e punições na pré-escola. Ao induzir os educadores a acreditar que as crianças apresentavam mau comportamento, observou-se, por meio de um rastreador ocular, que os educadores olhavam mais para as crianças negras do que para as brancas, em especial para os meninos negros. Isso indica uma tendência dos educadores em associar os meninos negros a comportamentos desafiadores, mesmo sem evidências de que esses comportamentos estivessem ocorrendo.

Os professores também participaram de uma leitura de um breve relato sobre o mau comportamento de uma criança em idade pré-escolar. Em seguida, eles deveriam avaliar a seriedade do comportamento e sugerir uma medida disciplinar apropriada. O relato indicava raça e gênero da criança, além de contexto familiar, embora essas informações não fossem necessariamente relevantes para a análise do comportamento específico.

Os resultados revelaram que os educadores avaliaram o comportamento das crianças de maneira diferente, dependendo tanto da raça da criança mencionada no relato quanto de sua própria raça. Embora não tenha havido diferenças significativas nas taxas de punição, os educadores atribuíram classificações menos severas quando a raça da criança era a mesma que a deles próprios e classificações mais severas quando a raça era diferente. Ou seja, os educadores demonstraram maior empatia pelas crianças de sua própria raça e menos empatia em relação às crianças de outras raças.

Outro estudo, conduzido por Marcos Rangel e Ying Sh, investigou como as disparidades raciais observadas no início da carreira dos professores afetaram sua percepção ao longo do tempo. Os resultados mostraram que as percepções dos professores foram sensíveis à convivência inicial com alunos negros que apresentavam desempenho abaixo da média. No entanto não demonstraram a mesma sensibilidade em relação aos estudantes negros com desempenho acima da média.

Essa assimetria sugere a presença de viés de confirmação, no qual os professores que possuem estereótipos preconcebidos sobre alunos negros com baixo desempenho tendem a dar mais importância às evidências que confirmam seus preconceitos. Essas expectativas podem influenciar os padrões de avaliação, classificação acadêmica e até mesmo as crenças e comportamentos dos alunos, contribuindo para a persistência das disparidades raciais na realização e no aproveitamento educacional.

Diante desses desafios, os autores dos estudos sugerem implementar soluções para lidar com o preconceito e o viés racial no sistema educacional.

Aula do ensino médio em escola estadual paulista - Bruno Santos - 12.ago.22/Folhapress

Uma delas é fornecer treinamento adequado para os professores reconhecerem e monitorarem seus próprios vieses em relação às minorias raciais. Além disso, sugerem promover uma maior compreensão da vida dos alunos fora da escola, especialmente quando há diferenças raciais entre professores e alunos, a fim de evitar julgamentos injustos. Também aconselham a adotar um processo de análise das taxas de expulsão e suspensão na educação infantil levando em consideração as disparidades raciais e de gênero, para garantir a igualdade de tratamento e punições justas e proporcionais.

Medidas como essas, aliadas a um compromisso contínuo da sociedade em combater o racismo e promover uma cultura escolar inclusiva e diversa, serão fundamentais para superar os desafios enfrentados pela população negra.

Somente assim poderemos criar um ambiente em que todas as crianças tenham igualdade de oportunidades e sejam capazes de desenvolver seu potencial plenamente, independentemente de sua raça ou origem étnica.

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