Brasil Conte algo que não sei

Rachel Lotan, professora: ‘É preciso romper mitos nas salas de aula’

Americana veio ao Rio ministrar curso sobre reestruturação dos programas de formação de professores, tendo a igualdade de direitos como princípio
"O aprendizado nada tem a ver com o gênero, a raça ou mesmo a situação financeira do estudante", ressalta a professora Rachel Lotan. Foto: Leo Martins / Agência O Globo
"O aprendizado nada tem a ver com o gênero, a raça ou mesmo a situação financeira do estudante", ressalta a professora Rachel Lotan. Foto: Leo Martins / Agência O Globo

“Além de dirigir o Stanford Teacher Education Program (Step), da Universidade de Stanford (Califórnia), colaboro, em vários países, com a reestruturação de programas de formação de professores. Tenho como foco de estudo valores como emancipação, democracia, equidade e diversidade na educação.”

Conte algo que não sei.

Em uma sala de aula equitativa, os alunos enxergam-se como colegas e pares, competentes e capazes de contribuir para o aprendizado comum. Nesse tipo de sala de aula, eles resolvem problemas da vida real, tratam dos seus dilemas e trocam ideias, de forma democrática, de igual para igual. Esse modelo já é aplicado na Noruega, Suécia, Austrália, Hungria e no Chile.

Qual o primeiro passo para a implantação de tal método de ensino?

Para se alcançar a equidade em uma sala de aula, precisamos nos perguntar: “Com que se parece uma sala de aula equitativa? Como saberei que se trata de uma sala de aula equitativa quando estiver diante de uma?”. Uma das características de uma sala de aula desse modelo é que todos os alunos têm acesso a um currículo de qualidade, as atividades são intelectualmente desafiadoras e todos têm o mesmo status entre os colegas e com os professores, além das mesmas oportunidades de interação. Os materiais didáticos, como livros e textos, também são acessíveis a todos.

E quanto tempo é necessário para a formação dos professores?

Depende. Aqui, no Rio, temos quatro professores que estão conosco desde outubro do ano passado e já trabalham num programa piloto. Esses profissionais estão aprendendo as bases do método e sendo constantemente avaliados. Futuramente, eles também serão capazes de formar novos grupos.

Qual a idade ideal para os estudantes viverem essa experiência?

Não existe uma idade certa. Fizemos testes que vão desde o jardim da infância, passando pelo ensino médio, até a universidade. Para todos, aplicamos o mesmo princípio. O importante, independentemente da faixa etária, é não classificá-los em um ranking, que é o que a maioria das escolas faz. Precisamos virar o jogo, parar de ranqueá-los por meio da aplicação de testes. Essa é a primeira medida para a compreensão de que não são os estudantes que precisam nos provar o que sabem. Somos nós, os orientadores, que devemos oferecer condições para que eles mostrem, naturalmente, o que podem fazer.

Quais são os maiores obstáculos?

É preciso romper alguns mitos nas salas de aula. O aprendizado nada tem a ver com o gênero, a raça ou mesmo a situação financeira do estudante. Partimos do princípio de que todas as crianças podem aprender, se tiverem oportunidade. Todos são espertos e capazes, cada um com suas experiências de vida, seu conhecimento, seu interesse. Temos que acreditar neles. O aprendizado nada mais é que uma atividade social e, para o seu desenvolvimento, a sala de aula é o melhor lugar.

No Brasil, o que você identifica como barreira?

Durante meus 15 anos em Stanford, sempre ouvi dizer que o modelo de aprendizagem que aplicávamos nunca funcionaria no Brasil. Porque o país é muito grande, as coisas aqui são mais difíceis, não existe investimento nessa área, enfim, várias desculpas. Foi, então, que surgiu a oportunidade de vir para cá, trazendo o modelo de equidade. E o que prevejo é que mais um mito cairá por terra. A educação pode melhorar, sim.