Zona Sul
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Por — Rio de Janeiro

O celular está em todo lugar — e na sala de aula não seria diferente. O desafio agora é como lidar com essa ferramenta que ao mesmo tempo que abre um mundo de possibilidades é também uma grande distração e problema para o aprendizado. Nas escolas municipais do Rio, desde o mês passado, o aparelho só é permitido dentro da mochila e no modo silencioso, salvo em casos isolados. A cidade do Rio é a primeira capital do país a tomar medidas depois que o relatório de monitoramento global da educação, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), afirmou que a tecnologia pode ter um impacto negativo se for inadequada ou excessiva.

O uso dos celulares já é proibido em vários países, entre eles México, Portugal, Espanha, Suíça, Estados Unidos, Holanda, Letônia e Escócia. Por aqui, a situação preocupa. Segundo um levantamento realizado pela empresa McAfee, o Brasil foi líder entre os países com maior uso do celular por crianças e adolescentes. Cerca de 96% dos menores de idade brasileiros fazem ou já fizeram uso de smartphones, um número 19% maior que a média global da utilização entre os mais jovens.

Para diretor da Escola Americana, na Gávea, celulares não são ferramentas de ensino no ambiente escolar — Foto: Divulgação
Para diretor da Escola Americana, na Gávea, celulares não são ferramentas de ensino no ambiente escolar — Foto: Divulgação

Especialistas alertam ainda para prejuízos à saúde, como a dependência patológica, chamada de nomofobia, que interfere na equanimidade emocional e na capacidade de pensar independentemente e resolver problemas, além de contribuir para o distanciamento social.

Em algumas escolas particulares da Zona Sul, a postura é similar à da prefeitura. Por outro lado, há instituições em que o dispositivo é usado como um aliado no ensino.

Apesar do pouco tempo da publicação do decreto do prefeito Eduardo Paes que regulamenta a proibição dos celulares em sala de aula, o secretário municipal de Educação, Renan Ferreirinha, afirma que o retorno está sendo muito positivo entre professores, diretores e responsáveis pelos alunos.

— A tecnologia precisa ser utilizada de forma consciente e responsável. Ela é uma aliada, e cabe a nós não deixar que se torne uma vilã no processo de aprendizagem. Desta forma, teremos estudantes mais atentos e interessados, com maior capacidade de acompanhar o conteúdo pedagógico — diz.

Ferreirinha reforça que o uso de celulares em sala de aula atrapalha a concentração e prejudica diretamente a aprendizagem:

— É como se o aluno saísse de sala toda vez que vê uma notificação. Não tem como prestar atenção e aprender de forma plena assim. Além disso, a escola é lugar de socialização, e ficar no celular atrapalha a convivência social, deixa a criança isolada em sua própria tela.

No Colégio pH, com unidades em Botafogo e Ipanema, o uso do celular em sala de aula não é proibido — Foto: Divulgação/Rebeca Letieri
No Colégio pH, com unidades em Botafogo e Ipanema, o uso do celular em sala de aula não é proibido — Foto: Divulgação/Rebeca Letieri

Além de nomofobia, que é o medo irracional de estar sem o celular, Felippe Tribuzzi chama a atenção para outros problemas de saúde. Ele é head pedagógico da Academia Soul, empresa especializada em educação socioemocional.

— A exposição prolongada a telas de computadores, tablets e celulares pode causar ainda fadiga visual, dores de cabeça e uma série de outras patologias. O uso das novas tecnologias deve atender aos melhores interesses dos estudantes e complementar uma educação baseada na interação humana — afirma.

Na Escola Americana do Rio Janeiro (EARJ), com unidade na Gávea, os alunos até o 8th grade (cerca de 14 anos) devem manter seus celulares sempre desligados. Já no caso dos estudantes de séries posteriores, aplica-se algum relaxamento desta regra. Nigel Winnard, headmaster da EARJ, porém, é taxativo: para ele, celulares não são ferramentas de ensino em ambientes escolares, diferentemente dos computadores.

— Todos os nossos alunos têm acesso a laptops. Proibir computadores em um mundo dominado pela tecnologia não combina. É essencial que todos os alunos desenvolvam as habilidades para aproveitar o poder da internet para o aprendizado. Isso não significa que todo o ensino precisa ser baseado na tela, longe disso. Uma aula bem planejada é pautada no desenvolvimento da cognição hábil. Trata-se de inspirar e ampliar a capacidade de pensar. Isso não requer necessariamente um computador e certamente não requer um celular — diz.

Segundo Winnard, a abordagem desses temas em sala de aula tem se tornado cada vez mais relevante. O diretor acredita que pais de jovens precisam estar conscientes dos malefícios que o ambiente digital pode provocar.

— Já é complicado para adultos maduros demonstrarem autorregulação e autocontrole quando se trata de celulares. E é mais difícil ainda para crianças e adolescentes. Devemos nos perguntar por que nós, como pais, permitimos que nossos filhos acessem a internet à noite sem supervisão. Quando os pais permitem que isso aconteça em suas próprias casas, eles não estão apenas expondo seus filhos a ameaças, mas também estão contribuindo para o vício que desejam que as escolas evitem — reflete.

A economista Karina Huffard, mãe de Felipe e Gabriela Gonçalves, de 11 e 10 anos, respectivamente, e alunos do 6th e do 5th grade da Escola Americana, conta que vê a proibição do uso de celulares na escola como benéfica.

— Aqui em casa, rede social apenas do 9th grade em diante. Assim como na escola, incentivamos o esporte. O relacionamento entre pais e instituição de ensino deve ser de confiança, e o papel do colégio nessa fiscalização cuidadosa é muito importante. Houve uma vez em que meu filho estava buscando o resultado de um jogo de futebol durante a escola em seu computador. A professora viu e retirou o computador dele. Certíssima. Parceria é tudo, e educar é dar limite — relata.

Pensi: ‘Veto é um tanto utópico’

De acordo com o diretor do Colégio Adventista de Botafogo, Leonardo Bernardo, na instituição o celular também fica desligado em sala de aula. A regra é aplicada em todas as séries, até o ensino médio. A exceção acontece quando o aparelho é solicitado pelos professores como um auxílio no ensino ou pelos pais, em casos específicos.

— Pode acontecer quando se propõe uma pesquisa em sala de aula utilizando o celular, ou uma atividade mais lúdica, com aplicativos de quizz on-line, geralmente com alunos mais velhos. Entretanto, a orientação é não usar o telefone durante as aulas para atividades pessoais. Entre os aspectos negativos podemos elencar, por exemplo, a tentação de extrair da internet textos inteiros prontos ou utilizar aplicativos como o ChatGPT para criar trabalhos e conteúdos sobre pesquisas, sem que o aluno tenha agregado conhecimento pessoal ao que foi proposto pelo professor — explica Bernardo, acrescentando que a proibição tem o apoio da maioria dos pais.

Aluna do Pensi, Amanda Mendonça (com o celular) e colegas de classe: “Depende de como é usado” — Foto: Divulgação
Aluna do Pensi, Amanda Mendonça (com o celular) e colegas de classe: “Depende de como é usado” — Foto: Divulgação

Já no Colégio pH, localizado em Botafogo, o uso do aparelho celular em sala de aula não é proibido. O diretor pedagógico geral da instituição, Filipe Couto, ressalta, porém, que a tecnologia é voltada para a aprendizagem, e que a discussão não gira em torno de indisciplina, mas do bem-estar psíquico.

— Estudos recentes mostram que cerca de 40% dos jovens não suportam a sensação de ficar distantes de seus smartphones. Mais que não prestar atenção às aulas, o uso compulsivo desses aparelhos tem afetado a qualidade de vida, sendo associado a vários problemas. Aqui no pH dispomos de instrumentos específicos, como tablets e chromebooks, para a realização de tarefas que exigem conexão. Eles são mais eficientes que os smartphones porque estão configurados para fins educacionais, sem as notificações das redes sociais de cada aluno. Mas, por vezes, os professores também se valem dos celulares dos alunos para algumas atividades — detalha.

No Pensi, com unidades em Copacabana e no Flamengo, a norma é parecida com a do pH. Segundo o diretor de ensino da instituição, Pedro Rocha, a recomendação da escola para o uso dos celulares é que sejam utilizados para fins pedagógicos. Ele admite, no entanto, que é natural que em alguns segmentos, dada a maior necessidade dessas ferramentas, elas sejam permitidas.

— De um modo geral, a orientação é que no caso dos pequenos não haja o uso, e que a partir do 6º ano seja estritamente para o ensino. Dos 14 anos de idade em diante faz muito sentido que haja o uso pedagógico dos aparelhos eletrônicos. A verdade é que na sociedade em que vivemos, tão informatizada e conectada, fazer vetos e proibições é um caminho que talvez seja um tanto utópico, por isso tentamos buscar o equilíbrio para um emprego saudável das ferramentas tecnológicas — justifica.

Aluna do 7º ano do Pensi Flamengo, Amanda Mendonça acredita que o celular em sala de aula pode ser benéfico ou maléfico, dependendo da forma como é usado.

— O celular pode ser uma boa ferramenta de aprendizado, mas se a utilização for em excesso acaba prejudicando o desenvolvimento em sala de aula — resume.

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