Educação

Por Raquel Lopes, A Gazeta


Professora Eduarda Rossana não quis mostrar o rosto, mas falou sobre projeto em escola — Foto: Guilherme Ferrari/ A Gazeta

Após a polêmica envolvendo um painel com bonecas afro no Centro Municipal de Educação Infantil (Cmei) Cida Barreto, em Jardim da Penha Vitória, a professora Eduarda Rossana, responsável pelo mural, afirmou que irá manter o projeto, chamado de Abayomi, até novembro. “O projeto é institucional, aborda a história do negro e não tem relação com religião.”

A declaração foi dada após o pastor João Brito, da Igreja Evangélica Batista de Vitória, mandar retirar um painel com bonecas africanas da escola e chamá-las de “símbolo de macumba, por se originar de uma religião africana”.

A professora responsável pela confecção do painel disse que não associou o projeto à religião. Ela afirma que foi a segunda vez que um painel foi retirado. A primeira foi em maio.

“A abayomi (boneca) faz parte da cultura africana, não tem relação com religião. O objetivo é fortalecer as relações étnico-raciais e o combate ao racismo, e garantir o conhecimento da nossa origem”, disse.

A abayomi é uma boneca africana símbolo de resistência negra.

Boneca africana que pastor retirou de escola em Vitória — Foto: Internauta/ Gazeta Online

Preconceito

Eduarda disse que sofre preconceito até mesmo dentro da escola. “Algumas pessoas não concordam, mas é meu dever como cidadã tentar combater o racismo e ensinar sobre o tema. A questão racial não deve ser discutida apenas para negros, mas com todos”, diz ela, que é pós-graduada em cultura afro-brasileira e que, em 2011, ganhou o prêmio Olga Maria Borges de igualdade racial, dado a pessoas que têm relevância em trabalhos raciais.

Prefeitura

Segundo a secretária de Educação da Prefeitura de Vitória, Adriana Sperandio, o projeto institucional irá continuar, pois está associado à educação para as relações étnico-raciais.

“A escola vai desenvolver as ações apontadas no processo pedagógico. Vamos realizar uma reunião com o pastor para dialogar e fazer esclarecimentos. A escola pública é laica e não trabalha as religiões”, aponta.

O que diz a professora

A professora Eduarda Rossani falou sobre o painel desenvolvido por ela e pelos alunos:

  • Você acredita que seja preconceito?

Sim. Tudo que veio do negro é pejorativo. O cabelo é ruim, a religião é do mal e é feita uma demonização. Quando eu discrimino a cultura do outro, é um tipo de preconceito.

  • É necessário estudar a cultura africana?

Sim. É necessário para evitar preconceito e para que as pessoas tenham conhecimento.

  • Você passou por algum preconceito?

A agressão não foi contra mim, mas contra os negros e as crianças. Elas me perguntaram porque as bonecas foram tiradas do painel. O pastor nunca me procurou para falar sobre o assunto.

João Brito, pastor daIgreja Evangélica Batista de Vitória (IEBV), Jardim da Penha — Foto: Ricardo Medeiros/ Arquivo A Gazeta

O que diz o pastor

O pastor João Brito, que retirou o painel, ao ser questionado sobre a continuidade do projeto apenas informou: “Veremos”.

Ele reafirmou que a boneca tem ligação com religião africana e que não aceita outro tipo de crença no local. “O comportamento dela não é digno porque está usando de uma figura que é símbolo religioso. Em nenhum momento falei da cor da   boneca.”

Ele diz que nunca procurou a professora para falar sobre o painel porque não pula hierarquias. “Não passei por cima das pessoas que estão acima dela. A professora deveria ter o mínimo de dignidade de me procurar.”

Conselho apresenta denúncia

A presidente do Conselho Municipal de Educação de Vitória afirma que o Cmei Cida Barreto funciona de forma irregular e diz que, desde julho, enviou um pedido ao Ministério Público do Estado para que as crianças sejam retiradas do local.

“O Cmei não atende aos padrões nacionais para funcionamento. Foram verificadas irregularidades relacionadas à acessibilidade, segurança das crianças, estrutura do prédio e na defesa da laicidade da educação. Por ser no prédio da igreja evangélica, há interferência de uma religião”, disse.

A secretária de Educação da Prefeitura de Vitória, Adriana Sperandio, informou que não chegou ao conhecimento da pasta nada sobre mudança. “Cada escola tem um conselho representado por pais, professores, direção da escola e da comunidade, a demanda de mudança de local nunca apareceu”, disse.

Procurado para falar sobre o caso, o Ministério Público não respondeu até o fechamento desta matéria.

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