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Presidência do Inep decidiu que não atuaria no dia do Enem e problemas teriam que ser resolvidos em votação entre servidores, diz denúncia

Relatório elaborado pela associação de servidores do instituto compilou as principais situações enfrentadas pelo corpo de funcionários e enviou para órgãos como Congresso e TCU
Danilo Dupas Ribeiro, novo presidente do Inep Foto: Divulgação/ABMES
Danilo Dupas Ribeiro, novo presidente do Inep Foto: Divulgação/ABMES

RIO - Denúncia divulgada na tarde desta sexta-feira pela Associação dos Servidores do Inep (Assinep) revela que a “alta gestão” do instituto decidiu que não atuaria na resolução de problemas durante a aplicação do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) e que os servidores escalados deveriam resolver qualquer imprevisto com “uma espécie de votação” entre eles.

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Esse é um dos pontos que levaram 37 servidores a entregarem os cargos de chefia faltando pouco menos de duas semanas para a prova, que será realizada neste domingo e no próximo.

De acordo com os servidores, a realização da prova para 3,1 milhões de inscritos traz riscos inerentes exigindo capacidade de pronta resposta do Inep, órgão do governo federal responsável pela aplicação do exame.

Para isso, é formada uma Equipe de Tratamento de Incidentes e Respostas (ETIR) que sempre é acompanhada pelo presidente do Inep. Segundo os servidores na denúncia, a presença da alta gestão do órgão durante a aplicação serve, inclusive, "para dar segurança jurídica às decisões tomadas em regime de urgência nos dias de aplicação".

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Na escala de 2021, no entanto, a cúpula do Inep avisou aos servidores que não participaria da ETIR, “eximindo-se da responsabilidade pela tomada de decisões em casos de incidentes”, e apenas servidores selecionados participariam das deliberações “em uma espécie de votação sobre que ação tomar no caso de incidentes”, diz a denúncia.

O relatório elaborado pela associação coletou, organizou e compilou as principais situações enfrentadas pelos servidores do Instituto atualmente. Os registros indicam assédio institucional e foram entregues em documento único a diversas instituições, como  Congresso Federal,  Tribunal de Contas da União,Controladoria-Geral da União, Ouvidoria do Inep  e a Comissão de Ética do Inep.

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Ainda segundo a denúncia, a presidência do Inep só decidiu participar da aplicação da prova três dias depois da renúncia coletiva dos servidores, a maior parte deles atuava no Enem. Em 12 de novembro, menos de dez dias antes da prova, “foi solicitado às diretorias a indicação dos servidores que integrariam a equipe e sinalizada a participação da presidência na cadeia de comando da ETIR”.

A demora para definir a ETIR gerou, segundo os servidores, no aumento dos custos de deslocamento das equipes de campo, com valores elevados de passagem aérea e hospedagem.

"Isto é, quando do pedido de exoneração dos servidores dos cargos em comissão, ainda não se tinha sequer início do processo de definição da equipe de resposta aos incidentes que possam ocorrer no Exame, justificando a — ainda presente — desconfiança de falhas na capacidade de resposta do instituto e da sua alta gestão", afirma a denúncia.

Assédio institucional

A denúncia afirma ainda que o Inep funciona atualmente sob um clima de "insegurança e medo" gerado pela atual gestão do presidente Danilo Dupas.

Segundo o texto, "há casos de servidores em licença médica devido aos episódios de assédio institucional na autarquia".

Ainda de acordo com os sevidores, assédio institucional é uma série de atos ou omissões políticas e administrativas com abuso de poder, desvio de finalidade ou prevaricação, de forma sistemática, para o desmonte de processos, políticas e insitutições.

Uma das denúncias apontadas também alerta para o risco de quebra de sigilo e de intervenção ideológica na prova. Segundo o documento, desde as eleições presidenciais de 2018, se vê "uma diretriz do presidente da República para indução ideológica no exame, com críticas reiteradas a diversas questões".

Segundo o dossiê, "depoimentos de servidores indicam pressão política oriunda da presidência do órgão para retirada de questões, sem motivo idôneo, como relatado na imprensa". Os servidores pedem que haja uma investigação para determinar se houve acesso de pessoas alheias ao processo de montagem da prova e se existiu pedido de retirada de questões.

Falhas no Enem

A aplicação do Enem tem apresentado problemas sistematicamente durante a gestão Jair Bolsonaro. No primeiro ano, o exame teve o maior erro de correção da história do Enem. Foram identificados problemas em 5.974 provas – 96,7% estavam concentrados em 4 cidades: Alagoinhas (BA); Viçosa (MG); Ituiutaba (MG) e Iturama (MG).

No ano passado, o exame teve o maior número de abstenções da história. O índice alcançou a casa de 55,3% dos inscritos com a prova realizada no meio da pandemia. O registro de 29.555 mortes daquele mês só não ultrapassava os picos de junho e julho de 2020, com 31.627 mortes . O mês foi também o maior em número de novos casos, com 1.386.005 pessoas contaminadas pela Covid no país.

Por fim, o exame que começará a ser aplicado no próximo dia 21 já teve o menor número de inscritos da história. O MEC não havia autorizado a inscrição gratuita a quem faltou ao último exame, de 2020, por causa da pandemia de coronavírus.

Com isso, o Enem deste ano teria apenas 3,1 milhões de candidatos, o menor número desde 2005. Entidades civis, como a Educafro, entraram na Justiça e conseguiram a reabertura das inscrições para garantir a isenção a quem faltou no ano anterior, o que conseguiu mais 300 mil participantes.