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‘Poupança Jovem’: programa tem bom custo-benefício no combate à evasão, avaliam especialistas

Para pesquisadores da área, é preciso, porém, cuidado na hora de definir o foco dos alunos que poderão receber o benefício

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Por Adriana Fernandes , Bianca Lima e Paula Ferreira
Atualização:

Brasília – Um dos maiores especialistas do Brasil na avaliação de programas voltados ao combate à evasão escolar, o professor da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), Vitor Pereira, avalia que o “poupança jovem” - programa que prevê a criação de poupanças, com recursos federais, para alunos do ensino médio - sai barato quando comparado ao enorme benefício que pode alcançar para diminuir o elevado abandono escolar no País.

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Pela avaliação preliminar do governo, o custo pode somar até R$ 4 bilhões ao ano - a depender do desenho e do escopo do projeto, que ainda estão sendo definidos.

Segundo Pereira, as taxas de abandono e evasão continuam altas no Brasil e longe da trajetória necessária para universalizar a conclusão do ensino médio entre os jovens. Ele alerta ser preciso que os gestores tenham, no entanto, muito cuidado na hora de definir o foco dos alunos que poderão receber o benefício para evitar o risco de “estigmatização” desses jovens, o que poderia gerar o efeito contrário ao desejado.

Pereira tem vários estudos publicados sobre o tema e acompanha o impacto de experiências desse tipo. Segundo ele, para cada 100 alunos que ingressam no ensino médio, dez evadem a cada ano e menos de 60% vão terminar os estudos na idade correta. O pesquisador já mediu a eficiência de experiências adotadas no Brasil, como nos Estados do Rio de Janeiro e Piauí, locais onde pôde constatar a redução da taxa de evasão escolar.

Vitor Pereira, professor do Enap Foto: Vitor Pereira

Com a poupança, o aluno pode escolher como gastar. Pode, por exemplo, usar os recursos para abrir um pequeno negócio ou mesmo começar a financiar uma faculdade. Segundo ele, o programa não funciona apenas para evitar a evasão escolar, mas para igualar as oportunidades na entrada no mercado de trabalho.

“O menino pobre não tem esse oportunidade. Não conta com nenhum capital formado para abrir um pequeno negócio ou mesmo fazer uma faculdade ou comprar uma moto”, ressalta.

Pereira considera que uma das estratégias possíveis para o governo é expandir o programa em fases, o que ajuda na avaliação “no meio do caminho”. Ele conta que há experimentos bem-sucedidos em outros países, como no Canadá, Inglaterra, Chile e Colômbia.

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No Rio, o programa era chamado de “Renda Melhor Jovem” e a conta poupança era aberta no nome do aluno. Ele lamenta que a medida - que tinha custo baixo, de R$ 30 milhões - tenha sido descontinuada quando o Estado começou a ter restrições fiscais.

“O programa mudou a trajetória de evasão no nível do município de forma significativa, com queda de um terço da taxa de abandono”, diz ele. No caso do Rio, os alunos eram de famílias do programa Bolsa Família que viviam em condições de extrema pobreza.

No Piauí, a focalização dos beneficiados foi feita com base nos municípios mais pobres do Estado. Mas a poupança era concedida para todos os alunos da escola, o que o pesquisador não considera uma boa escolha. “Apesar de o município ser pobre, pode ter um filho de um fazendeiro na escola recebendo”, afirma. Para Pereira, o que faz mais sentido é focalizar entre os alunos que têm mais chance de abandonar a instituição.

Enxugar gelo

Especialista no tema, o pesquisador da USP Romualdo Portela afirma que a iniciativa do governo federal é interessante por atacar um dos principais aspectos que motivam a evasão escolar, mas é preciso ir além. O pesquisador coordenou o estudo “Cenário da Exclusão Escolar no Brasil”, do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) em parceria com a Unicef.

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“A população que está fora da escola majoritariamente tem relação com a questão financeira. A ideia da bolsa ataca um problema real. O que acontece é que só isso é enxugar gelo, porque traz o estudante de volta, mas se a escola não dialoga com suas dificuldades, ele reprova e acaba saindo de novo. Junto com a ideia da bolsa, é preciso modificações na escola”, opina Portela, que é diretor de pesquisa e avaliação do Cenpec.

Ele explica que é preciso promover um acompanhamento da aprendizagem do estudante para que a reprovação não acabe expulsando esses alunos da escola, apesar do benefício financeiro.

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