Português é obstáculo para brasileiros à procura de estágio
Para quem tenta uma vaga de estágio, o desafio está também no domínio do próprio idioma.
Vaga tem, mas o Guilherme não está conseguindo encontrar estagiários qualificados para contratar na multinacional fabricante de autopeças em que trabalha, no ABC paulista. A cada dez candidatos que ele entrevista, cinco não passam em um teste fundamental: o de português.
“Nos últimos anos a gente vem percebendo que está piorando um pouquinho. Tem essa parte da escrita, tem a parte do entendimento mesmo do candidato, onde ele não entende o que está sendo proposto ali na atividade, e tem uns erros ortográficos também”, diz o analista de RH, Guilherme Monteiro.
Muitos jovens têm tropeçado nesta disciplina nas seleções de emprego: é o que mostra uma pesquisa do Núcleo Brasileiro de Estágios, responsável pela aplicação de provas para mais de 14 mil empresas em todo país.
Ortografia, gramática e interpretação de texto, todo esse conteúdo caiu nos testes e o nível das perguntas foi compatível com o que se aprende no ensino médio, e que os mais de 59 mil candidatos já tiveram na escola. Só que a maioria não passou na prova. Mais de 49,9 mil estudantes foram desclassificados justamente por causa da nota de português.
Os alunos do ensino médio tiveram o pior desempenho: 89% não passaram nas provas. Entre os universitários, os mais reprovados foram os dos cursos de Direito, Letras e Administração.
“A prova é a mesma já tem alguns anos. Antes, em 2019, a última pesquisa que nós fizemos, nós tínhamos um índice de desclassificação em torno de 50%. Agora, na última pesquisa de 2021, esse índice subiu de uma maneira muito drástica. Então, nós imaginamos que tenha relação com a situação da pandemia”, afirma Helenice Accioly, que é gerente de recrutamento e seleção do Nube.
A Paula é gerente comercial de uma empresa de softwares de assinatura eletrônica e diminuiu a exigência da prova de português. Mesmo assim, ela não conseguiu contratar todos os estagiários de que precisa, e isso afeta o desenvolvimento de outras áreas da empresa.
“Eu levo mais tempo para crescer, para atingir metas que a gente esperava. A gente imaginava ter formados, dentro da nossa equipe, pelo menos 30 pessoas. E eu não consegui formar essas 30 pessoas”, lamenta Paula Sino.
O diretor da ONG Todos pela Educação diz que a pandemia prejudicou o nível de aprendizagem dos estudantes, e que agora o poder público precisa investir ainda mais nessa área, para recuperar a defasagem escolar.
“Não há país desenvolvido, justo, próspero sem educação de qualidade. E é educação de qualidade para todos. A gente tem que entender, de uma vez por todas, que qualidade para poucos, não é qualidade”, explica Olavo Nogueira Filho.