Brasil Educação

Pesquisa mostra que 49% dos professores não recomendam a profissão

Baixos salários e falta de reconhecimento docentes desestimularem jovens a seguir a carreira
Edna Marques dá aulas há 17 anos Foto: Fábio Guimarães / Agência O Globo
Edna Marques dá aulas há 17 anos Foto: Fábio Guimarães / Agência O Globo

RIO- Edna Marques ainda se lembra do alívio que sentiu quando sua filha desistiu da ideia de seguir a mesma carreira da mãe no magistério. Professora há 17 anos, ela gosta da profissão, mas pensa duas vezes antes de recomendá-la, e não é a única. Segundo uma pesquisa feita pelo Movimento Todos Pela Educação, 49% dos docentes não indicariam a carreira para um jovem. Entre os principais motivos para justificar a decisão estão os baixos salários e a falta de reconhecimento.

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Estudo do MEC mostra que só uma das 20 metas do PNE saiu do papel

De acordo com o estudo, que entrevistou 2.160 professores da educação básica de todo país, os que têm de 11 a 30 anos de carreira são os que menos recomendam a profissão. Os mais novos, que estão há menos de 10 anos nas salas de aula, são os que mais indicam, seguidos pelos docentes que têm mais de 31 anos de prática. A etapa da educação onde lecionam também influencia. A pesquisa mostra que os professores que dão aula no Ensino Médio são os que menos recomendam a carreira, seguidos pelos do segundo segmento do ensino fundamental (do 6º ao 9º ano). Os que mais indicam a profissão, por outro lado, são os das etapas iniciais (educação infantil e primeiro segmento do fundamental).

— Quando um aluno me diz que quer ser professor, eu sempre brinco "não faça isso". E vejo que é uma prática comum entre os professores dizer isso. A desvalorização da nossa classe, com um salário defasado tanto na rede pública quanto na particular e o desrespeito que hoje é muito grande são alguns dos pontos negativos. Antes, a família participava mais da educação dos filhos, hoje, eu brinco que se escrever um palavrão no caderno do aluno ninguém vê — lamenta Edna, que dá aula de Português para o segundo segmento do ensino fundamental em uma escola municipal e leciona inglês para o ensino médio de uma escola estadual.

O descontentamento dos professores tem base nos dados. Um estudo divulgado pelo Ministério da Educação (MEC) para acompanhar as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) mostrou que o salário dos docentes pouco aumentou nos últimos anos. A meta 17 do PNE determinava que até 2020 o rendimento desses profissionais fosse equiparado ao dos demais trabalhadores com mesmo nível de ensino.  Em 2012 o salário dos professores correspondia a 65,2% da média dos outros profissionais do mesmo nível. Já em 2017 o percentual era de 74,8%. A disparidade diminuiu de 2012 a 2017, mas por conta da queda do salário dos outros profissionais e não devido ao crescimento do valor recebido pelos professores que, no período, teve ganho real de apenas 2%. A disparidade diminuiu de 2012 a 2017, mas por conta da queda do salário dos outros profissionais e não devido ao crescimento do valor recebido pelos professores que, no período, teve ganho real de apenas 2%, frente a uma inflação de 40,3% no período. Atualmente, o piso estabelecido pelo MEC para professores que cumprem 40 horas semanais é de R$2.455, 35.

Mas a queixa dos professores não se limita à questão salarial. A falta de envolvimento de outros atores, como a família e a comunidade, e, além disso, a falta de confiança nas secretarias de educação também justificam o descontentamento profissional. Segundo os dados da pesquisa do Todos pela Educação, 59% dos docentes discordaram da afirmação “Acredito que a Secretaria da Educação está efetivamente preocupada com a melhoria da aprendizagem dos alunos”. Para 64% deles também não há um bom canal de comunicação entre professores e a Secretaria de Educação. A maioria ainda opinou que a pasta não dá continuidade a bons programas e também não ajusta os projetos que não funcionam bem.

EFEITO CASCATA

Para Rafael Anselmo, que dá aulas de história há 11 anos, ainda que a desvalorização seja o calcanhar de aquiles da carreira, essas outras questões não ficam atrás.

— A pior face é a desvalorização, há colégios da rede privada que não pagam o mínimo obrigatório. Mas hoje encontramos na educação cada vez mais problemas que vêm da família, que não se interessa pela vida do educando. Ou questões domésticas que desencadeiam problemas psicológicos nos alunos, e nós professores nos vemos sozinhos nessa hora. No Rio, nos últimos anos tivemos secretários que não são educadores, são economistas, engenheiros ...A educação é vista como gasto e não como investimento — afirma Anselmo, que atualmente é diretor de uma escola normalistas, que forma professores.

Presidente-executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz argumenta que a falta de estímulo dos professores pode causar um efeito cascata.

— Há uma necessidade de atrair os melhores alunos da educação básica para carreira docente, e se os proprios professores desestimulam esses jovens a ingressarem na profissão temos um reforço do problema que está instalado no Brasil. Para a maioria dos alunos brasileiros, o profesor é o profissional que ele mais tem contato, então a avaliação que o próprio professor faz impacta demais nessa decisão. Nas nossas pesquisas vemos que no segundo segmento do ensino fundamental, 30% dos alunos querem ser professor, mas no final do ensino médio apenas 2% permanecem com esse desejo. É uma queda enorme — analisa.