Por Mirielly de Castro e Maiara Barbosa, Diário TV 2ª Edição


Pedidos de afastamento de profissionais da educação municipal crescem 120% no Alto Tietê

Pedidos de afastamento de profissionais da educação municipal crescem 120% no Alto Tietê

Um levantamento da produção do Diário TV mostra que os pedidos de afastamento de profissionais da educação na rede municipal do Alto Tietê, de janeiro a outubro deste ano, já superam em quase 120% os de todo o ano passado. E quase 10% desses afastamentos são por problemas psiquiátricos.

Quase três décadas em sala de aula, uma carreira que começou aos 19 anos de idade ainda no magistério. A Lana Janaina Prado Silva é professora de educação infantil.

“Sala de aula é vida. Criança é inspiração. E eu amo, desde o início estar com eles, viver toda essa aprendizagem, essa descoberta desse conhecimento que eles trazem e que eles levam do ambiente escolar”, disse a professora.

Ao longo do tempo, todo o amor e dedicação começaram a ultrapassar as grades de uma escola municipal que fica em Biritiba-Mirim.

“Na verdade, tudo aconteceu de uma vez. No dia 28 de outubro de 2013 eu morri. Eu tive sintomas físicos desconhecidos que me levaram até um hospital. O médico que me atendeu ele não relacionou à ansiedade generalizada ou ao pânico. Ele relacionou a um processo alérgico, porque, naquele momento, a minha garganta fechou, a minha boca secou, o meu coração acelerou. Eu lembro, assim, que eles apagavam o fogo, ninguém teve um olhar pra me dizer: ‘você precisa de ajuda’. Não é uma alergia, é algo mais. Demorou, até que um profissional de saúde pudesse me olhar e dizer: ‘não, você precisa de um acompanhamento psiquiátrico, de um acompanhamento psicológico, porque você tá num nível de estresse, de estafe, de ansiedade muito grande e é isso que tá causando em você todo esse sintoma físico que te faz tão mal’”, explicou Lana.

Com o quadro estabilizado, a professora voltou a lecionar, mas segue em tratamento. Atualmente, ela sabe que pra continuar fazendo a diferença na vida dos pequenos tem que se cuidar.

Lana Janaina Prado Silva é professora de educação infantil em Biritiba Mirim — Foto: TV Diário/Reprodução

A situação da Lana reflete a de centenas de educadores. Nas escolas municipais do Alto Tietê, o número de licenças por transtornos mentais e comportamentais vem aumentando a cada ano.

Em 2019, dos 10.986 afastamentos, 405 foram por problemas mentais, o que representa 3,68% dos atestados. Em 2020, durante a pandemia, mais de 2 mil professores foram afastados do trabalho, 158 por problemas mentais - 6,83% do total. Em 2021, a quantidade de afastamentos ficou na casa dos 4 mil, 338 por problemas mentais - o que corresponde a 8,26%.

Até outubro deste ano 8.880 educadores entraram com atestado de afastamento, 757 por problemas mentais - quase 8,52% do total.

Outra professora, que prefere não se identificar, ainda está com a saúde fragilizada. afastada há 3 meses da sala de aula lembra de algumas situações que a deixaram emocionalmente abalada no retorno das atividades presenciais logo depois da flexibilização da pandemia.

“ Um momento em que eu precisei de ajuda dos meus superiores e eu não obtive essa ajuda. Naquele momento eu percebi que estava sozinho. Quanto nós retornamos pra sala de aula, nós ouvíamos falar em acolhimento, acolha o máximo. E assim, todos os meus colegas foram fazendo, a gente acolhia da melhor forma possível, de todas as formas. Mas e o professor? Quem acolheu?”.

A educadora é concursada da rede estadual e sem saber que estava doente, nos primeiros sintomas, quase pediu exoneração do cargo.

“Eu sou uma pessoa que eu falo baixo, eu falo muito baixo, então, eu tô acostumada a falar e os meus alunos são sempre muito tranquilos, eles interagem e, com o tempo, eles entendem que falando baixo a gente consegue se entender melhor. Mas esse ano eu não consegui, esse ano não. E constantemente eu tava com dor de garganta e constantemente tomando antibiótico e cuidando da saúde, pra não baixar a imunidade, pra não pegar coronavírus outra vez. Lá no início do ano eu peguei coronavírus, foi bem complicado, porque crianças vindo pra escola e contando pra gente: ‘olha, o meu pai não foi trabalhar hoje porque testou positivo’. ‘Poxa, então por que você veio?’. ‘Ah, eu vim porque precisava tomar café’”.

Já são 15 anos dando aula de português, matemática, ciências, história e geografia, mas agora é hora de cuidar da saúde. A professora não tem previsão de retornar para sala de aula.

“Todos os dias eu recebo mensagens de bom dia, de louvores, de carinho, de música que eles escutaram e que eles querem que eu escute também pra, quando eu voltar pra sala de aula, a gente cantar junto. Os pais também vêm até minha casa e a gente conversa muito e essa é a parte boa. O carinho verdadeiro, sabe? O acolhimento que eu não imaginei que teria”.

Ferraz de Vasconcelos informou que acompanha os afastamentos para melhorar a saúde mental dos professores, oferecendo o suporte necessário aos profissionais. Que no retorno pós-quarentena foram trabalhadas discussões em rede sobre comunicação não-violenta e acompanhamento de forma on-line com psicólogo. Já Guararema disse que promove ações como cursos e palestras.

De 2019 a 2022, cerca de 90 atividades foram feitas. Em Mogi das Cruzes, a prefeitura disse que faz o monitoramento e encaminhamento dos servidores e que, no ano passado, desenvolveu o projeto "todos cuidando de todos", e ofereceu o atendimento psicoeducacional. Atualmente, as ações estão em processo de revisão.

Já Santa Isabel informou que investe em cursos que desenvolvam a autoestima, valorização, confiança coletiva e individual da equipe. Suzano disse que os profissionais têm à disposição as atividades de rodas de conversa, palestras, atendimentos com psicólogos, entre outros. Poá informou que faz o acompanhamento e apoio dos casos nas próprias unidades, com encontros com psicólogas, rodas de conversa e palestra com os docentes, mediante necessidade e disponibilidade.

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