Coluna
Antônio Gois

Pátria Educadora em colapso

Em livro, ex-ministro Renato Janine Ribeiro faz relato transparente da gestão do MEC no auge da crise do governo Dilma

A capacidade de um ministro de implementar políticas públicas de Estado na educação não depende apenas de sua competência. É também altamente influenciada pelo contexto político e econômico que o cerca. Neste sentido, o cenário enfrentado pelo filósofo Renato Janine Ribeiro quando assumiu o MEC em 2015, no auge da crise do segundo governo Dilma, não poderia ser pior. As reflexões de Janine sobre o curto período em que esteve no MEC estão no livro “A Pátria Educadora em colapso” (editora Três Estrelas).

Pátria Educadora era o lema do segundo mandato de Dilma, mas que logo virou, na análise de Janine, um slogan contra o MEC. Para ganhar as eleições de 2014, o governo fez promessas que, logo se viu, eram irreais num cenário de crise econômica agravada pela queda nos preços internacionais das commodities (produtos de exportação como soja, petróleo e minério de ferro), dos quais a economia brasileira segue sendo extremamente dependente. Sem recursos e com altas expectativas lançadas sobre o MEC, Janine, bem como seu antecessor, Cid Gomes, tiveram que lidar com greves e protestos veementes daqueles que cobravam as promessas de campanha.

A eleição de um Congresso conservador e mais hostil a Dilma já era visível nos primeiros meses do segundo mandato, mas, como relembra Janine, quem começou a sangrar o governo foram setores de sua base, que, pouco depois, tentariam em vão defender o governo do processo de impeachment.

“O que via de perto eram beneficiários de políticas públicas, sobretudo no ensino superior, incluindo professores, servidores e alunos de universidades ou campi que não existiriam sem a ação dos governos Lula e Dilma, sendo implacáveis na cobrança. Não nego que essas pessoas tenham alguma responsabilidade pela crise em que se meteu o país. Tinham acesso às informações. Deviam estar vendo o que acontecia”, diz Janine em trecho do livro, sem, porém, deixar de criticar também o governo Dilma pela falta de diálogo e transparência sobre a situação fiscal do país: “Se o governo tivesse dito a verdade (quero dizer toda a verdade), isso teria ajudado a superar a crise de confiança pela qual estava passando”.

Na segunda parte do livro, Janine reflete sobre caminhos para melhorar a qualidade da educação. Ele lista como prioridade zero a educação infantil (zero a 5 anos), em seguida cita a alfabetização na idade certa, e depois fala do ensino médio e técnico. Um pouco antes de elencar essas prioridades, ele lamenta algo que muitos de seus antecessores no cargo também citam em depoimentos que colhi para o livro “Quatro décadas de gestão educacional” (Instituto Unibanco e Editora Moderna): os ministros querem priorizar a educação básica, mas logo percebem que seu tempo será tomado principalmente pelas pautas do ensino superior.

Ao falar do programa Ciência Sem Fronteiras, que dava bolsas para universitários estudarem no exterior, Janine pondera a questão: “Lamento constatar que o corte de 5.550 bolsas causaria na opinião pública uma repercussão mais negativa do que a suspensão de benefícios para crianças pobres (...). Se você deixa de construir uma creche num bairro pobre, a reação dos beneficiários potenciais pode nem chegar à mídia, assim como acontece com as greves na escola pública, que, mesmo quando ocorrem nas grandes capitais, hoje pouco aparecem no noticiário.”

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