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Para chegar à sala de aula, debate étnico-racial deve estar na formação de professores

por Ruam Oliveira ilustração relógio 15 de junho de 2021

África do Sul, Zimbábue, Nigéria, Gana, Quênia e Libéria. Esses são alguns dos países no continente africano falantes de língua inglesa. Sempre que se pensa no inglês é comum que sejam associados apenas os mais conhecidos vindos da Europa ou da América do Norte. Porém, há uma gama de outros países que adotam o idioma ou como língua oficial ou como língua franca, ou seja, que não é o idioma principal, mas é usado com frequência na comunicação.

Nas aulas de inglês, os exemplos ficam restritos ao britânico e ao norte-americano, o que desconsidera a diversidade de outras localidades que podem ser usadas para exemplificar como esta é uma língua bastante diversa. “Se nós avaliarmos nossa formação enquanto professores de inglês, nós vamos observar que não tivemos essa abordagem em questões étnico-raciais”, aponta Carolina Azevedo, professora de inglês da rede municipal do Rio de Janeiro (RJ) e mestranda em educação com ênfase em Diversidades e Relações Étnico-raciais pela UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro).

Em conversa durante webinário Raça, gênero e o ensino de inglês no Brasil, promovido pelo British Council, Carolina afirmou que existem hoje diversos mecanismos previstos inclusive na Lei 11.645/08 e na BNCC (Base Nacional Comum Curricular) que podem e devem ser usados como base para discutir raça em sala de aula e principalmente embasar a formação de professores.

Na maioria das vezes que se discute raça e gênero no ensino, há sempre uma pergunta semelhante: quantos professores negros ou quantas professoras negras você já teve? Dados do Censo Escolar de Educação Básica de 2020 apontam que a maioria dos professores de inglês é composta por mulheres brancas – o equivalente a 80,34%.

Mas esse é apenas um dos exercícios possíveis para identificar como as questões de raça aparecem em sala de aula.

Carolina pontua que é necessário avaliar “de que forma essa língua inglesa que ensinamos e consumimos é trazida para dentro da escola e de que forma o racismo vai estar presente ali”. A professora também pontua a necessidade de que os educadores tenham uma postura crítica em relação à representação de mulheres negras.

“[Precisamos] fugir desses estereótipos. Se não temos essa formação, precisamos buscá-la, pois estamos tratando de humanidades, estamos tratando de reestruturação social”, disse.

Cíntia Camargo Vianna, pós-doutora em Estudos da Literatura pela UFF (Universidade Federal Fluminense) com pesquisa voltada à descolonização do ensino de línguas estrangeiras, diz que existe um passo anterior a essa discussão que é verificar qual o lugar que esses temas ocupam na formação do professor de língua inglesa no cenário brasileiro e também na formação continuada, a qual por vezes os educadores estão sendo constantemente expostos.

A pesquisadora destaca que com esse movimento de identificação do espaço que a temática ocupa na formação, é possível observar o “lugar de apagamento do problema na rotina escolar”. Essa atitude aparece, por vezes, na forma de uma neutralidade por parte dos educadores, que pode acabar sendo evidenciada na aula à medida em que não se aborda o assunto ou evita-se falar a respeito.

O tema não é de exclusividade de educadores negros e educadoras negras. Cíntia reforça que os professores não devem cair nesse “subterfúgio” de evitar o assunto por serem brancos. Ela reforça que, independentemente do grupo racial ao qual pertençam os estudantes ou docentes, questões raciais e de gênero devem sempre aparecer, inclusive dado o cenário brasileiro onde mais da metade da população se considera negra ou parda.

Buscar uma formação facilita que os professores tragam o assunto de forma naturalizada, de maneira que fuja do “exótico”, pontua Carolina. As discussões podem acontecer, inclusive, independentes de efemérides ou datas marcadas.

Trazer elementos da cultura negra pode ser uma estratégia para discutir o assunto sem estar vinculado a datas como 20 de novembro. Carolina comenta que confeccionou caxixis – uma espécie de chocalho – para trabalhar a cores e usando o conteúdo de membros familiares conseguiu abordar ancestralidade e memória, por exemplo.

A professora aponta que o principal desafio para professores está na formação em relações étnico-raciais e de gênero, tanto pessoal quanto coletiva. Para ela, todos os indivíduos que estão envolvidos no ambiente escolar devem ter algum tipo de formação, pois podem tanto ser vítimas – e para isso precisam aprender a identificar para rebater – quanto agentes do racismo e causar algum tipo de violência na comunidade escolar.

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educação bilíngue, formação de professores, racismo

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