Brasil Educação Enem e vestibular

'Os direitos humanos estão acima do patamar de qualquer ideologia', diz presidente do CNE

Eduardo Deschamps criticou que anulação de regra sobre redação aconteça tão próximo ao Exame
Provas do Enem 2019 serão em 3 e 10 de novembro Foto: Guito Moreto / Agência O Globo/31-08-2017
Provas do Enem 2019 serão em 3 e 10 de novembro Foto: Guito Moreto / Agência O Globo/31-08-2017

RIO - O presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Eduardo Deschamps, criticou a decisão judicial que tenta mudar as regras da redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) a poucos dias da aplicação da prova, que acontece nos dias 5 e 12 de novembro. Segundo Deschamps, a medida pode trazer prejuízo para os candidatos, que se prepararam para o modelo vigente. Na quarta-feira, o desembargador federal Carlos Moreira Alves, do Tribunal Regional Federal, suspendeu o critério que anula o texto dos candidatos em caso de violação dos direitos humanos . Em entrevista ao GLOBO, Deschamps ressalta ainda que o tema está acima de ideologias, e trata-se de um preceito firmado internacionalmente.

O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) afirmou que mantém as competências de redação e que ainda não foi notificado da decisão judicial. Segundo o TRF1, o Inep só será notificado após a publicação do acórdão, o que ainda não aconteceu.

- Algo que me preocupa é que decisões dessa natureza sejam tomadas muito próximas ao Enem, isso gera prejuízo para os estudantes que estão se preparando. Nesse momento, o prudente seria manter a regra que já existe e aprimorar para as próximas provas - argumentou Deschamps.

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O educador argumenta ainda que o contexto atual faz com que princípios universais como os direitos humanos sejam confundidos como algo pertinente somente a determinadas ideologias.

- Estamos vivendo em um mundo muito polarizado e tudo é uma linha muito tênue. Por exemplo, se alguém defende que uma pessoa presa receba um tratamento digno, consideram que essa pessoa está contra a justiça. Isso não tem nada a ver. O debate fica polarizado e sai do foco principal. Os direitos humanos estão acima do patamar de qualquer ideologia e devem valer para todos os seres humanos. Não há doutrinação em trabalhar os direitos humanos, é uma questão de direito universal estabelecida pela sociedade - diz.

Por outro lado, Deschamps defende que o debate sobre retirar o critério sobre a anulação da redação aconteça. De acordo com ele, é pertinente questionar se em um texto argumentativo cabe restringir determinadas visões:

- É necessário travar uma discussão sobre isso e ouvir opiniões variadas. Mas acho que esse não é um debate tão simples, ele precisa ser feito de maneira mais profunda.

ENTENDA A QUESTÃO

A decisão de suspender o critério foi tomada em caráter de urgência a pedido da Associação Escola Sem Partido. No pedido feito ao TRF1, a entidade sustenta que um dos principais objetivos do Enem é o de servir de mecanismo de seleção ao preenchimento de vagas em instituições de ensino superior,  e que "ninguém pode ser obrigado a dizer o que não pensa para poder entrar numa universidade". O movimento defende que o critério de violação dos direitos humanos na redação é injusto e subjetivo e, por isso, prejudica a liberdade de expressão dos alunos.

Na decisão, o desembargador federal Carlos Moreira Alves, do Tribunal Regional Federal, determinou a suspensão do item 14.9.4 do edital do exame que atribui nota zero, sem correção de seu conteúdo, à prova de redação que seja considerada desrespeitosa aos direitos humanos. Ao analisar o caso, informa a Justiça Federal, o magistrado invocou dois fundamentos que sustentam a ilegitimidade desse item: “Ofensa à garantia constitucional de liberdade de manifestação de pensamento e opinião, também vertente dos direitos humanos propriamente ditos; e ausência de um referencial objetivo no edital dos certames, resultando na privação do direito de ingresso em instituições de ensino superior de acordo com a capacidade intelectual demonstrada, caso a opinião manifestada pelo participante venha a ser considerada radical, não civilizada, preconceituosa, racista, desrespeitosa, polêmica, intolerante ou politicamente incorreta”.

Em nota, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) afirmou que ainda não foi notificado sobre o tema,  e reiterou que os critérios de avaliação das cinco competências da redação estão mantidos. O órgão declarou também que "seus atos são balizados pelo respeito irrestrito aos Direitos Humanos, conforme a Declaração Universal dos Direitos Humanos, consagrada na Constituição Federal Brasileira."