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Mariana Luz

O vírus da desigualdade e como combatê-lo

Políticas públicas no pós-Covid devem priorizar o bem-estar das crianças

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Mariana Luz

Presidente da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal e Young Global Leader do Fórum Econômico Mundial

A Covid-19 exacerbou as desigualdades de oportunidades para as crianças e suas famílias. Novos dados mostram que suas repercussões atingiram drasticamente a todos, principalmente os mais vulneráveis. O desemprego aumentou, o acompanhamento vacinal diminuiu e o risco de insegurança alimentar cresceu. Essas são conclusões do grupo de pesquisadores das entidades que integram o Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI).

Embora as crianças não tenham sido consideradas grupo de risco na pandemia, elas têm sofrido seus impactos. É urgente colocá-las em primeiro lugar ao pensar políticas públicas e ao eleger prioridades de investimento de curto, médio e longo prazo. As famílias com crianças cujos adultos têm menor escolaridade foram as que tiveram sua renda mais afetada. O percentual é quase o dobro que o do grupo de famílias com ensino médio ou superior. A constatação é do economista Naercio Menezes Filho, do Insper. Outra pesquisa, do Data Favela, mostra que, para 76% dos moradores de comunidades, faltou dinheiro para comprar comida em pelo menos um dia da semana.

A criança está no centro do turbilhão causado pelo estresse, fruto do desemprego e do risco da fome. Ela absorve os efeitos desse ambiente hostil em seu desenvolvimento físico, mental e emocional. Pesquisadores do Laboratório de Pesquisas em Oportunidades Educacionais da UFRJ constataram que crianças pobres têm 88% mais chances de terem problemas de saúde mental em comparação às mais ricas.

Outro número preocupante foi identificado pelo Epicovid-19, estudo realizado pela Universidade Federal de Pelotas: 22,7% das crianças mais pobres deixaram de ser vacinadas em 2020; entre os mais ricos, o índice foi de 15%.

Esses dados são o retrato do retrocesso que tivemos nos cuidados com nossas crianças. É hora de reverter essas estatísticas. As evidências mostram que há três tipos de atendimento que, juntos, são capazes de endereçar a maior parte dos desafios apontados aqui: a Estratégia Saúde da Família (ESF); a oferta de escola e creche de qualidade para todas as crianças; e a ampliação do repasse de renda aos mais pobres, com o fim das filas de espera.

Os programas de visitação domiciliar da ESF são efetivos para o atendimento de saúde e de assistência social. É preciso ampliar essa política.

O retorno seguro das crianças às escolas e às creches é uma das estratégias mais eficientes para garantir o estímulo e o ambiente necessários para o desenvolvimento. Oferecer nesses locais programas de atendimento socioemocional para as crianças e também para os adultos é uma alternativa para ajudar essas famílias a superar estresses da pandemia e seguir adiante.

As crianças têm o direito de serem olhadas como prioridade e de serem protegidas. E nós todos temos a obrigação de incorporar essa urgência para tirá-las da situação de vulnerabilidade e elevá-las ao patamar mais alto de oportunidades, cuidados e bem-estar que houver.

Nós sabemos o que fazer para chegar lá. Vamos juntos?

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