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O que podemos fazer pela educação?

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Por Fabrício Motta
Atualização:
Fabrício Motta. Foto: Atricon/Divulgação

Os dados revelados por recente estudo da Escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV) a respeito dos danos provocados pela baixa qualidade do ensino deveriam chamar a atenção de todos que se preocupam com o desenvolvimento brasileiro, no setor estatal, no privado e na sociedade civil. Como integrante do primeiro segmento, me questiono o quanto poderíamos avançar se, em cada órgão público, em qualquer esfera de poder e instância administrativa, nos grandes municípios e nos pequenos lugarejos, fosse feita a seguinte pergunta: o que essa instituição pode fazer pela educação desse país?

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Mas, primeiro, vamos aos dados do estudo. Cruzando informações de dezenas de pesquisas internacionais sobre as relações entre educação e crescimento econômico, o levantamento calcula os prejuízos da falta de qualidade na instrução. A conclusão mais eloquente: se os alunos brasileiros atingissem, aos 15 anos de idade, o mesmo nível médio de aprendizagem dos estudantes das nações desenvolvidas o Brasil poderia obter crescimento, ao ano, de dois pontos porcentuais no Produto Interno Bruto (PIB). Em um país em que o desenvolvimento patina há décadas, essa informação deveria valer ouro -entre 2011-2020, por exemplo, as riquezas brasileiras cresceram apenas 0,26% ao ano.

Se o Brasil teve o mérito de aumentar a taxa de matrículas e escolaridade nessa fase mais recente de sua história, ainda tem muito a avançar no quesito qualidade. Os estudos compilados pela FGV levam em conta os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa). Na prova realizada em 2018, por exemplo, o Brasil teve notas abaixo da média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico em matemática, ciência e leitura.

Esse cenário foi bem apresentado e aprofundado em reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, publicada no início de março e cujo título é instigante: "Quanto o Brasil seria mais rico se tivesse ensino de país desenvolvido?" Foi nesse questionamento que pensei ao formular a pergunta que apresenta essas reflexões. Não tenho dúvida de que o país poderia avançar muito na qualidade do ensino se o tema fosse prioridade em qualquer órgão público, inclusive naqueles nos quais, em primeiro momento, essa ideia pareça fora de lugar. Importante lembrar que a educação de qualidade é direito fundamental e que a Constituição consagra compromissos firmes no assunto, inclusive no que se refere ao financiamento da educação.

A partir da visão de que o proveito da boa educação é revertido para toda a sociedade, é possível defender que o esforço para tal alcance deve ser coletivo, do ambiente público e da sociedade, o que significa ação articulada, coordenada e efetiva. Os Tribunais de Contas têm caminhado nessa direção ao incentivar a instalação de Gabinetes de Articulação para Efetividade das Políticas de Educação (Gaepes) pelo país. Idealizado pelo Instituto Articule e fruto da cooperação com a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil, o Instituto Rui Barbosa, os gabinetes reúnem, em um ambiente horizontal de diálogo, as secretarias e os conselhos de educação, o Tribunal de Contas, o Poder Judiciário, os Ministérios Públicos Estadual e de Contas, a Defensoria Pública, o Poder Legislativo e a sociedade civil. O objetivo é apoiar o gestor no enfrentamento dos desafios na área da educação e fortalecer o regime de colaboração. Esses gabinetes têm contribuído decisivamente para aumentar o ambiente de segurança jurídica na tomada de decisões.

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A temática é discutida anualmente, em encontros temáticos para debater as carências e necessidades da educação pública brasileira durante os Simpósios Nacionais de Educação (Sineds). Em 2023, a quinta edição Sined ocorrerá entre os dias 10 e 12 de maio, em Goiânia, e pretende reunir atores de diferentes seguimentos para mapear ações que possam ser implementadas em conjunto por diferentes seguimentos da sociedade.

O artigo 205 da Constituição Federal assegura que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família. Ainda segundo a Carta Magna, a educação deve ser "promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". Há urgência de repensar as ações isoladas em prol de esforços coletivos, que reconheçam os espaços de atuação diferentes, mas que valorizem os compromissos comuns.  Os muitos jovens e crianças que estão fora da escola e aqueles que não gozam de uma educação de qualidade não podem mais sofrer com a omissão de quem tem o dever de transformar essa realidade -  e esse dever é de todos nós.

*Fabrício Motta, é conselheiro do TCM-GO, professor da UFG, doutor em Direito do Estado (USP) e mestre em Direito Administrativo (UFMG). Integra a Associação de Membros dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon) e o Instituto Rui Barbosa. É um dos organizadores do V Sined

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