Educação

O que diz o MEC sobre o debate da linguagem neutra nas escolas

O tema voltou a agenda após o STF julgar inconstitucional que os estados proíbam o ensino da variante linguística

Sede do Ministério da Educação, em Brasília. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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Uma recente decisão do Supremo Tribunal Federal determina que é atribuição do Ministério da Educação tratar das diretrizes sobre o ensino da “linguagem neutra” nas escolas. A posição veio após a Corte derrubar uma lei no estado de Rondônia que proibia a variante linguística.

“Não se trata de ‘ensinar’ ou ‘não ensinar’ a linguagem neutra”, explicou a Secretária de Educação Básica do MEC, professora Kátia Schweickardt, a CartaCapital. Trata-se de seguir as diretrizes estabelecidas na BNCC e tomar a língua como um objeto de estudo e reflexão, nas suas diferentes manifestações”. 

Para ela, a decisão judicial reafirma a possibilidade de conhecimento dos estudantes, mas diz que não há intenção de mudar o currículo escolar. 

A última versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), homologada em 2018 e implementada no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), diz que as orientações sobre o ensino da Língua Portuguesa buscam “atualizá-las em relação às pesquisas recentes da área e às transformações das práticas de linguagem ocorridas neste século”. 

O texto acrescenta que o objetivo é “proporcionar aos estudantes experiências que contribuam para a ampliação dos letramentos” e permitir “a participação significativa e crítica nas diversas práticas sociais permeadas/constituídas pela oralidade, pela escrita e por outras linguagens”.

Para a Secretária de Educação Básica, o movimento de atualização e transformação da língua deve ser fonte de compreensão dos estudantes. 

“Isso exige que eles sejam competentes no domínio da norma culta (ou norma padrão) da língua portuguesa, mas que também compreendam e sejam competentes para utilizar as demais variações do idioma que circulam na vida social e que podem ser mais inclusivas e ir desfazendo os pilares da estrutura desigual e preconceituosa da sociedade”, afirma.

Ela ainda defende que “transformar esse tema em uma arena de guerra cultural ou ideológica é desrespeitar os professores e os estudantes”. 

Em Rondônia, a lei que foi derrubada pelo STF proibia “expressamente” o ensino da linguagem neutra na grade curricular e material didático de instituições de ensino públicas ou privadas, bem como em editais de concursos públicos. 

O argumento do autor, o deputado Eyder Brasil (PSL), foi o de que se tratava de uma “medida protetiva ao direito dos estudantes”.

Com a aprovação, a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade no STF em que defendia que a lei ultrapassava as responsabilidades do estado, pois seria de competência da União.

O ministro-relator, Edson Fachin, afirmou em seu voto que a “norma estadual que, a pretexto de proteger os estudantes, proíbe modalidade de uso da língua portuguesa viola a competência legislativa da União”.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, disse que “a competência normativa em escala nacional para tratar da adoção da Língua Portuguesa não é dada aos entes estaduais adentrar nesse domínio. Proibições haverão de ser discutidas e promovidas, se for o caso, também em âmbito nacional”.

A posição dos especialistas

Para Claudia Costin, diretora do Centro de Políticas Educacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e ex-Secretária Municipal de Educação no Rio de Janeiro, “a mudança é sempre desafiadora, mas não é por lei que você vai proibir que a língua e vou evolua numa certa direção”.

Já o professor Luiz Carlos Schwindt, do Departamento de Linguística, Filologia e Teoria Literária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, discorda dos parlamentares que dizem que a linguagem neutra prejudicaria o ensino infantil.

“Eu não acho que possa trazer prejuízo algum para a alfabetização, até porque eu não imagino que a alfabetização comece por isso”, diz o professor, que também representa a Associação Brasileira de Linguística (ABRALIN).  “A alfabetização tem etapas, quando ela chega nessa etapa sobre a discussão de gênero, sobre marcas possíveis de gênero, as crianças já têm um conhecimento sobre relação entre letra e som que permite que elas promovam diferentes combinações da língua que elas sejam capazes de usar a língua sobre diferentes demandas”. 

O professor ainda relembra outro marco, da BNCC, que estabelece que na educação fundamental “cabem também reflexões sobre os fenômenos da mudança linguística e da variação linguística inerentes a qualquer sistema linguístico e que podem ser observados em quaisquer níveis de análise”. 

Costin acrescenta que essas normas vigentes, BNCC e LDB, dão conta de abarcar o contexto.

“Tendo achar que não chegamos ainda nesse momento de ter uma norma dizendo que tem que ser desse jeito e nem de dizer que não se pode falar desse jeito na escola”, diz. “As duas coisas não fazem sentido, talvez faça menos sentido ainda proibir de falar desse jeito”.

“Definitivamente não estamos falando de uma forma em lugar da outra. Estamos falando da convivência entre muitas formas de se dizer a mesma coisa”, afirma o prof. Luiz Carlos Schwindt. 

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