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Comportamento Adolescente e Educação

O que as escolas estão fazendo para promover a saúde mental de adolescentes?

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Por Carolina Delboni

No mundo, mais de 13% dos adolescentes com idades entre 10 e 19 anos têm diagnóstico de transtorno mental, segundo dados da OMS. Mas se não quisermos perder essa geração para as estatísticas, precisamos olhar para a promoção de saúde mental. O que sua escola tem feito?

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Nem tudo é papel da escola, mas muitos assuntos atravessam a escola e quando isso acontece é preciso parar e olhar para ele com carinho e atenção. O mês de setembro é marcado pelas infinitas campanhas do Setembro Amarelo, um movimento global de conscientização sobre a prevenção do suicídio. O mês acabou, mas o assunto saúde mental continua permeando a vida de adolescentes e jovens.

Mas o que fazer? Ou o que foi feito? Como as escolas estão lindando com o aumento de alunos que sofrem de algum transtorno e como elas estão criando ambientes que promovam a saúde?

As escolas não são responsáveis por tratar de alunos com algum tipo de transtorno. Óbvio. Mas elas desempenham um papel fundamental na identificação de alguns sinais que são sintomas e no apoio aos alunos em situações de vulnerabilidade.

Isso porque tudo que vive dentro de um aluno é levado para dentro da escola junto com ele. Passa pelo portão todos os dias. E se as escolas - e as famílias - quiserem garantir desempenho e engajamento de alunos, elas precisam, necessariamente cuidar do que angústia esses mesmos alunos.

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Isso é parte do cuidado da saúde mental. E é cuidando da saúde mental que vamos ter a chance de baixar índices e dados de suicídio de adolescentes e jovens, entre outras estatísticas tão doloridas e violentas.

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), nos últimos anos, o número de casos de depressão em crianças de 6 a 12 anos aumentou de 4,5% para 8%. No mundo, mais de 13% dos adolescentes com idades entre 10 e 19 anos têm diagnóstico de transtorno mental.

O assunto é tão sério que o relatório Preventing Suicide: a global imperative, elaborado pela OMS em 2014, já havia revelado que o suicídio é um grave problema de saúde pública, que preocupa as autoridades. Tanto que, na agenda global publicada em 2017 pela OMS, uma das metas é reduzir 1/3 das mortes prematuras por doenças não transmissíveis, além de promover a saúde mental e o bem-estar das pessoas até 2030.

Diante dessa realidade, as escolas precisam exercer um papel cada vez mais importante na vida de seus alunos, compreendendo as questões que afetam a saúde mental dessas crianças e adolescentes, a fim de prevenir possíveis consequências relacionadas a transtornos, como a depressão e a ansiedade.

No mundo, mais de 13% dos adolescentes com idades entre 10 e 19 anos têm diagnóstico de transtorno mental, segundo dados da OMS. Foto Getty Image  

Para a professora e orientadora de conflitos, Wanessa Fernandes de Lira, da E.E. Tarcísio Álvares Lobo, a escola é um dos locais ideais para que as mudanças de comportamento dos alunos sejam analisadas e tratadas. "Anualmente, falamos do Setembro Amarelo. Para este ano, eu e minha coordenadora de gestão pedagógica Tatiana Chamma, desenvolvemos uma iniciativa chamada Setembro Amarelo o Ano Inteiro. Esse programa envolve ativamente os alunos por meio de rodas de conversas e aconselhamento para fomentar o bem-estar emocional deles ao longo de todo o ano letivo," conta.

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A educadora acrescenta que o programa tem como base os princípios do Instituto Ame Sua Mente na Escola, um projeto que atua na formação em saúde mental para educadores, capacitando esses profissionais em relação às estratégias de manejo, prevenção e redução de estigmas em saúde mental junto a crianças e jovens.

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No colégio Centro Educacional Pioneiro, há um projeto de mediação que inclui a Convivência Ética, focada em questões socioemocionais dos professores. "Temos nos dedicado intensamente aos cuidados com a saúde mental e existencial de nossas crianças, jovens e colaboradores. Em 2021, participamos do Programa Raise, uma formação para a prevenção do suicídio e dos processos autodestrutivos, ministrada pela psicóloga suicidologista Karina Okajima Fukumitsu," comenta a diretora geral da escola, Irma Akamine Hiray.

"No mês de agosto, fizemos uma reciclagem abordando novamente a importância de ações de prevenção e cuidados com a saúde emocional. Inclusive o projeto de Convivência Ética está inserido dentro do currículo da escola desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, respeitando as especificidades e as fases de desenvolvimento de cada faixa etária", destaca Irma.

Para Wanessa, quando a criança ou o adolescente se sente protegido e acolhido, fica mais fácil compartilhar suas dores e incômodos com os professores. "Eu e Tatiana desenvolvemos várias temáticas com o intuito de promover a reflexão e o debate saudável entre os alunos. Recentemente, criamos o projeto Empatia, que tem como objetivo fazer com que esses alunos aprendam a se colocar no lugar do outro", diz.

Já no Pioneiro, Irma esclarece que eles têm um planejamento de ações contínuas e permanentes para além do Setembro Amarelo. "Esse trabalho envolve desde a formação da equipe pedagógica até a elaboração das aulas com temas pontuais que são trabalhados na disciplina de Convivência Ética (Fundamental) e Projeto de Vida (Ensino Médio); passando pela constituição de Equipes de Ajuda formadas pelos próprios alunos; estudos frequentes da equipe gestora e assessoria de profissionais com conhecimento no assunto", acrescenta.

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Mas nem sempre falar sobre problemas emocionais ligados à saúde mental é comum às escolas, pelo contrário, é um desafio constante. "Aqui na Tarcísio, temos a história de uma ex-aluna que se cortava. Uma vez ela chegou aqui toda agasalhada em pleno verão. Nós estranhamos e a chamamos para conversar. Ela teve uma crise de choro e, ao tirar o agasalho, constatamos que ela estava toda cortada. Chamamos os pais que prontamente vieram à escola e nos relataram que ela estava com sintomas de depressão mesmo", relata Wanessa que encaminhou a aluna a tratamento psiquiátrico.

A automutilação na adolescência serve de alerta máximo para pais e educadores, pois se trata de um indicador de transtornos psicológicos sérios que requerem uma intervenção profissional. A prática não é uma maneira de chamar a atenção, pelo contrário, ela está relacionada a questões mentais graves que precisam ser tratadas adequadamente e com especialista.

A orientadora Wanessa conta que além disso, muitos alunos sofrem de ansiedade e frequentemente têm crises de choro em sala de aula. "É assim, começa um e todos começam a chorar angustiados".

Segundo ela, ano passado havia muitos alunos com problemas de comportamento e, que por muitas vezes, acabavam influenciando os demais. "Para tentar entender esses comportamentos e ajudar essas crianças, criamos o projeto Indisciplina: Um Outro Olhar, para promover encontros semanais com alunos do 6º ao 9º ano e conversar sobre essas questões," destaca.

"Como mediadora, tenho a missão de ouvi-los e juntos buscarmos soluções, como uma terapia pelo SUS, embora a gente saiba da dificuldade de se conseguir vaga, ou mesmo atividades que façam com que eles tenham a oportunidade de se expressarem sem julgamentos morais", diz Wanessa.

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Já a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo (Seduc) esclarece que o foco principal da Pasta é realizar um trabalho preventivo e, portanto, compreende que a abordagem do Setembro Amarelo deve ser feita com extrema sensibilidade por conta da natureza delicada do tema.

Para este ano, a Seduc reestruturou as abordagens em todas as unidades escolares, para que as escolas possam trabalhar questões psicoemocionais em diferentes faixas etárias dos estudantes ao longo de todo o ano, indo além das ações previstas para o Setembro Amarelo. Durante esse período, o enfoque das atividades será direcionado com muito cuidado para as questões mentais e emocionais dos alunos.

Luciléa Rocha, professora na equipe Conviva SP, explica que as Equipes do Programa de Melhoria da Convivência e Proteção Escolar (Conviva-SP) capacitam vice-diretores e professores orientadores de Convivência (POCS) por meio de transmissões ao vivo, que acontecem regularmente, para que possam identificar qualquer vulnerabilidade em sua unidade escolar.

"Além disso, a Seduc desenvolve vários materiais e oferece formações aos professores em parceria com a Escola de Formação e Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação do Estado de São Paulo (EFAPE) na área de saúde mental e assuntos relacionados às questões socioemocionais, adequados às diferentes faixas etárias dos alunos", revela.

O Ministério da Saúde também oferece o repasse de recursos ministeriais para Equipes Multiprofissionais de Atenção Especializada em Saúde Mental (EMAESM/AMENT) que atendem crianças e adolescentes com transtorno de ansiedade e depressão. Essas equipes já fazem parte das unidades de saúde existentes, bem como ambulatórios, policlínicas e hospitais.

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O que mais as escolas podem fazer? Na escola Tarcísio Álvares Lobo, os alunos, com o apoio dos professores e coordenadores, estão criando uma oficina de bijuterias, entre outras atividades manuais, como fazer bonecas de pano com a técnica Amigurumi. "Os próprios alunos nos propuseram e nós incentivamos. A mãe de uma aluna sabe fazer essas bonecas e vai ensinar para quem quiser aprender", conta a professora Wanessa.

No Pioneiro, os estudantes participam de conversas não só entre eles, mas também com as famílias. "Oferecemos também palestras com informações relevantes sobre a saúde mental. Além de atendimentos individualizados, intervenções e orientações, quando necessários, aos alunos em sofrimento existencial com a equipe de professores mediadores, coordenação pedagógica e direção", conta Irma.

A Seduc orientou as escolas a focarem suas atividades no autocuidado, autoconhecimento e controle das emoções. A ideia é que os educadores busquem alternativas que fomentem debates com abordagens leves, positivas e respeitosas para não despertar gatilhos e reabrir detalhes perturbadores para os estudantes.

"Para este ano, traremos palestras e projetos voltados à saúde mental dos nossos alunos e professores. Nossa prioridade é fomentar a reflexão sobre o assunto a partir do autocuidado e destacar a importância do controle emocional em todas as situações através de estratégias já elencadas que serão adotadas", afirma Luciléa.

A participação da família e o suporte de uma rede de apoio desempenham papéis essenciais nesse processo. Irma revela que as famílias do Pioneiro são muito parceiras e que a relação entre eles é baseada no respeito e na confiança.

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Para ela, o diálogo e a construção coletiva são essenciais na ação de prevenção ao suicídio. "Nossos professores, coordenadores, inspetores e gestores são bastante sensíveis e atentos. Eles percebem quando o jovem está triste, apreensivo, inquieto ou com algum comportamento que exija um olhar mais meticuloso", relata.

A professora mediadora da escola Tarcísio, conta que cada sala de aula tem seu grupo de WhatsApp com a participação dos professores, coordenadores e direção e dos pais, onde trocam mensagens de apoio e falam das ações que vão acontecer na escola. "Os pais são bem participativos e estão sempre tentando ajudar. Futuramente contaremos com ajuda de um profissional de psicologia que vai integrar o programa Psicólogo na Escola e com isso, acreditamos que os atendimentos farão muita diferença na vida dessas crianças," diz Wanessa.

A convivência com os pares também é outra alternativa na busca de auxílio. "Geralmente os próprios alunos trazem essa preocupação para nós. Estes são os que fazem parte da Equipe de Ajuda e, que, junto dos professores mediadores, coordenação e direção, farão parte dessa rede de apoio, contando também com as respectivas famílias nessa grande trama de ajuda," conta Irma.

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