EXCLUSIVO PARA ASSINANTES
Foto do(a) coluna

Cientista político e economista

Opinião|O mundo mudou e o Brasil precisa se adaptar; um Estado maior não será um caminho para o futuro

Hoje o mundo é muito mais problemático, mas, felizmente, podemos nos divertir com o carnaval

PUBLICIDADE

Foto do author Albert Fishlow

Hoje começa a maior atração do carnaval carioca, quando o Sambódromo, construído em 1984, recebe os desfiles das principais escolas de samba. São Paulo e outras cidades também começaram a festa oficialmente. O carnaval termina na quarta-feira de cinzas, quando começam as seis semanas da Quaresma.

O que deixou o carnaval do Brasil tão único, desde sua robusta evolução inicial na década de 1920, não foi apenas a música, mas suas origens nas camadas de baixa renda. Havia uma crítica implícita à nova riqueza que surgia, mas não chegava à população negra. As celebrações brilhantes em grandes hotéis à beira-mar são um exemplo moderno.

Carnaval teve origem nas camadas de baixa renda Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil

PUBLICIDADE

A desigualdade da distribuição da renda brasileira, junto com a baixa qualidade de boa parte da educação, contribuiu para a vitória apertada de Lula nas eleições. As famílias mais pobres preferiram o compromisso verdadeiro do presidente com a melhoria de suas vidas e rendas à incapacidade de Bolsonaro de se importar com qualquer coisa que não fosse a continuidade de seu poder pessoal. Até seu vice-presidente parece ter tido acesso a ganhos financeiros.

O Brasil vem reafirmando sua preferência pelo avanço democrático há mais de 35 anos.

Não se trata de uma conquista trivial ou acidental. Muitos países se saíram menos bem. O Poder Judiciário continuou funcionando e limitando a transferência de participações privadas em grandes gastos públicos. Isso ocorreu com os grandes gastos da Copa do Mundo e da Olimpíada, além de tantos outros empreendimentos públicos. Desde então, instalações impressionantes se tornaram ruínas.

Publicidade

A popularidade doméstica de Lula aumentou quando os preços das commodities e, depois, do petróleo subiram em seus dois primeiros mandatos. Seu sucessor não pôde ser José Dirceu, envolvido em escândalo financeiro; Dilma Rousseff foi indicada em seu lugar.

Em vez de dobrar a renda entre 2012 e 2022, como ela prometera, a realidade foi sombria. A renda per capita estagnou em vez de crescer. Ela sofreu impeachment depois que as investigações da Lava Jato vieram à tona. Muitos outros enfrentaram processos judiciais.

Lula também ficou preso por mais de um ano, mas foi solto em 2019. Não havia dúvidas sobre seu forte desejo de retomar seu antigo papel como candidato presidencial na eleição de 2022. Bolsonaro acabou sendo um presidente pior que Donald Trump, figura que considerava uma fonte apropriada para imitar.

Lula procurou a oposição e obteve apoio. Isso permitiu que ele vencesse por pouco e sobrevivesse à débil tentativa de Bolsonaro de utilizar os militares para derrubá-lo. Mas esse esforço funcionou para levar Lula a um grande gabinete com um grupo muito menor do PT funcionando como a verdadeira autoridade. Ele reagiu negativamente a qualquer um que ainda tenha permanecido e a qualquer medida que tenha sido promulgada anteriormente. A restauração tem de ser completa.

Mas o mundo mudou. O Brasil precisa se adaptar. Ter um estado muito maior não será um caminho para o futuro. Seguidas vezes, vimos os déficits governamentais se expandirem, pois os gastos necessários já exigem parcelas cada vez maiores dos gastos. Vai ocorrer aumento dos déficits do setor público. Como financiá-los ainda é um mistério a ser resolvido pelo ministro Haddad no próximo mês.

Publicidade

Lula também busca redenção pessoal internacionalmente. Isso ficou evidente em seu recente encontro com Biden. Mais uma vez, o Brasil dificilmente conseguirá negociar a adesão ao Conselho de Segurança da ONU, muito menos o fim da invasão da Ucrânia.

Infelizmente, o mundo ficou muito mais problemático ao longo dos anos. Felizmente, podemos nos divertir com o carnaval.

Opinião por Albert Fishlow

Economista e cientista político, professor emérito nas universidades de Columbia e da Califórnia em Berkeley

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.