Elio Gaspari
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Elio Gaspari

Jornalista e escritor

Informações da coluna

Elio Gaspari

Elio Gaspari é um jornalista e escritor. Em 2016, foi homenageado com um Prêmio Vladimir Herzog.

Por Elio Gaspari

Na quarta-feira, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, divulgou o relatório técnico da fiscalização do sistema eletrônico de votação pelas Forças Armadas. Nele concluiu-se que nos resultados do primeiro turno em 442 seções eleitorais sorteadas aleatoriamente, bem como nos de 501 seções do segundo turno, “não se verificou divergências entre os quantitativos registrados no Boletim de Urna afixado na seção eleitoral e os quantitativos de votos constantes no respectivo boletim disponibilizado no site do TSE”. Nesse dia, o presidente eleito Lula circulava por Brasília dispondo-se a recuperar “a harmonia entre os Poderes”.

Fechava-se assim um ciclo de tentativas de instrumentalização dos militares na vida política nacional. Ele foi aberto em abril de 2018 com o infeliz tuíte do comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, às vésperas do julgamento de um habeas corpus em benefício de Lula.

Nesses quatro anos, um presidente que dizia dispor do “meu Exército” tentou instrumentalizar as Forças Armadas no atacado. Não conseguiu. No varejo, conseguiu alguma coisa e militarizou de forma desastrada o Ministério da Saúde no pico da pandemia.

A essas instrumentalizações, não corresponderam flagrantes quebras da disciplina. Um comandante como Edson Pujol seguiu a escrita de seu antecessor, Enzo Peri. Enzo quem? Ele comandou o Exército de 2007 a 2015 e não falou de política nesse período, nem depois. (Quem não lembra o nome de um general passa-lhe o atestado de silencioso profissionalismo.)

As tentativas de instrumentalização dos militares nos últimos quatro anos foram contidas por oficiais que não falam de política. Fechou-se esse ciclo e vai para o Planalto um presidente que em oito anos de poder nunca se meteu com os quartéis.

A boa estatística de 2020

O Banco Mundial pôs na rede três estudos sobre a pobreza e as desigualdades sociais de Pindorama. Coisa fina. Intitula-se Brazil Poverty and Equity Assessment (Uma avaliação da pobreza e da desigualdade no Brasil) e tem três capítulos. Um deles trata do Brasil no tempo da Covid e traz uma informação surpreendente.

Simulações mostram que, graças ao Auxílio Emergencial pago em 2020 a 67 milhões de pessoas, a percentagem de pessoas vivendo com menos da metade de um salário mínimo caiu em cerca de 7,1 pontos percentuais em relação a 2019. Sem o Auxílio, teria subido 1,3 ponto. Isso apesar da deterioração do mercado de trabalho.

Mais: com esse resultado, o andar de baixo teve um inédito refresco, e o índice de Gini, que mede a desigualdade social dos países caiu (em 2020) para 0,474, o menor em muitas décadas. Sem o socorro, ele teria ido a 0,521. Quanto maior o índice de Gini, mais injusta é a sociedade. O de Portugal está em 0,32.

O estudo do Banco Mundial atribui a bonança de 2020 ao período em que foi pago o auxílio de R$ 600 e deixa claro que depois disso andou-se para trás.

Passou o tempo e discute-se agora a permanência desse socorro social.

Uma coisa tem pouco a ver com a outra, mas em 1991, quando o então senador Eduardo Suplicy propôs o seu programa de Renda Básica da Cidadania, foi visto como um excêntrico. Passaram-se 31 anos.

O deputado e médico baiano Antônio Ferreira França apresentou seu projeto de extinção gradual da escravidão em 1830. Aos poucos, ela acabaria em 1880. Só acabou em 1888.

Testamento no Judiciário

O ministro Luis Felipe Salomão, corregedor nacional da Justiça, barrou a nomeação de sete desembargadores para o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (Brasília) e abriu uma saia-justa no mercado de nomeação de magistrados. Contrariou o ministro Kassio Nunes Marques, mas sua decisão foi mantida pelo ministro Ricardo Lewandowski.

Deixar nomeações de magistrados para mais tarde é uma doce prerrogativa do Executivo para aumentar seu poder sobre alguns juízes interessados na própria promoção ou na de um afilhado. Apressá-las em fim de mandato é uma amarga prerrogativa para quem está de saída.

Por vias tortas e pedestres, Bolsonaro e um pedaço da magistratura reeditaram um conflito que, nos Estados Unidos, elevou a Corte Suprema à condição de árbitro da constitucionalidade de atos do presidente.

Nos primeiros meses de 1801, às vésperas da posse de Thomas Jefferson, o presidente John Adams mudou a lei e produziu um festival, nomeando 58 juízes. Jefferson assumiu e cuidou de revogar as nomeações.

Quatro juízes foram à Suprema Corte, e seu presidente, John Marshall, nomeado por Adams, conseguiu uma decisão unânime do Tribunal. A anulação da nomeação era ilegal, mas a mudança da lei que a permitiu era inconstitucional. Daí em diante, a Corte ampliou sua jurisdição.

(Adams detestava Jefferson e não lhe passou o cargo, indo embora de Washington. Com os anos, acercaram-se e morreram no mesmo dia 4 de julho de 1826, o do cinquentenário da Declaração de Independência, assinada por ambos.)

Eremildo, o idiota

Eremildo é um idiota, apoia todos os governos e não consegue ser nomeado para nada.

O cretino soube que a Comissão de Ética da Presidência resolveu azucrinar a vida de três destacados bolsonaristas.

Impôs uma pena de censura a Sérgio Camargo, o ex-presidente da Fundação Palmares que deixou o governo para ser candidato a deputado federal por São Paulo e atolou.

Ele diz impropriedades há anos.

Será investigado o ex-presidente da Caixa Pedro Guimarães, que deixou o cargo em junho passado, ao ser acusado de assédio por funcionárias. Além dele, caiu na malha o assessor Filipe Martins, por ter feito um gesto racista em 2021.

As investigações levarão tempo, indo além do que Martins chamaria de “eventual transição”.

Eremildo acredita que deveria haver uma norma pela qual nenhum órgão de controle do governo poderia tomar decisões punitivas depois de uma eleição por fatos ocorridos nos seis meses anteriores ao pleito.

O idiota acha que essa norma reduziria os papéis ridículos produzidos por Brasília.

Meirelles disse tudo

Henrique Meirelles entendeu direito o discurso de Lula da quinta-feira, que derrubou a Bolsa e encareceu o dólar:

“Ele estava no modo campanha.”

Plano de governo

De uma víbora:

“Sonhei que Lula passaria os próximos quatro anos viajando gloriosamente pelo mundo por três semanas de cada mês.

Na semana restante, Geraldo Alckmin cuidaria da quitanda.”

De olho no FIES

A turma que enricou com o programa de financiamento para alunos de escolas privadas está sonhando com um ministro da Educação que afrouxe as condições para se obter o empréstimo.

Na sua primeira versão petista, o FIES pagava as anuidades de estudantes matriculados em faculdades privadas, sem examinar o cadastro do fiador. Recebia financiamento até o aluno que havia tirado zero na prova de redação do Enem.

O Tribunal de Contas estimou em R$ 20 bilhões o custo da gracinha para a bolsa da Viúva.