Por Mirielly de Castro e Maria Eduarda Martins, Diário TV 1ª Edição


Número de crianças que não aprenderam a ler nem escrever durante a pandemia está em 65%

Número de crianças que não aprenderam a ler nem escrever durante a pandemia está em 65%

Um levantamento realizado pela Organização Não Governamental (ONG) Todos pela Educação mostra que o número de crianças brasileiras que não aprenderam a ler e escrever aumentou mais de 65% em 2021. O índice é uma das heranças ruins deixadas pela pandemia.

No Alto Tietê, as escolas se dedicam para que os alunos recuperem o tempo perdido e sejam alfabetizados. A preocupação é com o futuro, mas educadores, alunos e famílias tentam atuar em conjunto para semear boas sementes no presente.

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A rotina das aulas presenciais, que voltou em 2021 com muitas incertezas, agora está mais firme. Apesar das máscaras, que passaram a fazer parte do uniforme, e dos protocolos de controle da pandemia, o cenário até parece o mesmo de dois anos atrás. No entanto, a realidade é bem diferente.

Ágatha Eliana Gonzales tem 7 anos e já deveria estar alfabetizada. A mãe, Leila Arlinda de Oliveira, conta que a menina fez todas as atividades necessárias durante o ensino remoto e destaca que se dedicou muito para auxiliá-la.

"Eu acho que já era para as crianças estarem lendo e escrevendo. No caso dela, ela ainda está aprendendo. Eu não sou estudada, mas a gente faz o que pode, né? Eu comprei pela internet livros, inclusive um que eu usava quando era criancinha para me alfabetizar. Assim fomos indo, mas é complicado, porque nada como uma professora para ensinar", diz Leila.

A pequena estudante faz parte de um universo de quase 2,5 milhões de estudantes com idades entre 6 e 7 anos que ainda não sabem ler e escrever. Segundo um levantamento da ONG Todos Pela Educação, em 2021, mais de 40% das crianças nessa faixa etária não estavam alfabetizadas.

Em Ferraz de Vasconcelos, dos quase 4,5 mil alunos do segundo ano do ensino fundamental, 1,8 mil não estão alfabetizados. A supervisora da Secretaria Municipal de educação da cidade, Lilian Aparecida Bernardes, comentou os índices observados na cidade.

"Alfabetização é a criança entender o que são as letras, como essas letras formam o som e isso ela consegue registrar. A partir daí, ela estando alfabetizada, aí tem a questão do letramento, que é como eu utilizo isso. Então a gente fala crianças não alfabetizadas, mas dentro dessa condição tem crianças hoje que realmente não compreenderam a questão do esquema de escrita alfabética, eles não reconhecem letras, ainda não conseguem fazer o som que ele produz, que ele escuta, com o registro escrito. Porém nós temos crianças que estão nessa transição. Ela já consegue identificar algumas situações", explica Lilian.

"A gente vê que a pandemia teve um impacto muito grande, porque a gente compara o que nós tínhamos antes da pandemia e o que nós temos agora", avalia a supervisora.

Os alunos que estão no primeiro ano do fundamental não fizeram a pré-escola. O início do processo foi quase todo a distância.

"A minha mãe ajudava e eu conseguia fazer", conta Sara Santos Carvalho, de 5 anos, que está feliz que as aulas voltaram.

Atualmente, a menina está bem assistida em uma escola municipal do Jardim Nova América, em Suzano. Os alunos já arriscam as primeiras palavras e aprendem os números. A rede de ensino da cidade tem 98 unidades, incluindo as conveniadas. O trabalho de recuperação é integrado.

"Quais são as dificuldades que a rede de ensino possui? Ou quais são os estrangulamentos que nós temos associados ao período de recuperação da pandemia? Então esses dois quadros associados fazem com que a gente construa um quadro de formação de professores. Suzano está investindo na formação de professores e no uso de tecnologia para conseguir alavancar. Fora isso também, no contraturno, aulas diferenciadas, especiais, para crianças em vulnerabilidade, com maior dificuldade de aprendizagem", afirma o secretário municipal de Educação Leandro Bassini.

Os professores se reinventaram para levar conhecimento para os alunos em casa, mesmo diante de tantos obstáculos. Desde o começo da pandemia, Suzano teve uma média de 0,11% de evasão escolar na rede municipal, um percentual considerado baixo.

Dados da Prefeitura indicam que mais de 6 mil crianças estão na fase de alfabetização. Além de todo planejamento, didática e conteúdo, a diretora de escola Rosilene Barbosa do Nascimento acredita que emocional também é importante nessa retomada e reflete no aprendizado.

"O primeiro e maior desafio nesse momento está sendo receber as crianças e eles entenderem que eles precisam estudar na escola agora, todos os dias, como era antes da pandemia. Pra uma criança, dois anos são muito tempo. Então esse está sendo o maior desafio. As metas a gente vai traçar depois que a gente fizer esse processo de acolhimento, de adaptar as crianças na escola, aí a gente vai fazer diagnóstico, sondagem, pra traçar novas metas que vão ser alcançadas no decorrer do tempo. Claro que a gente teve um prejuízo. A gente não vai mais conseguir que crianças de 6, 7 anos estejam alfabetizadas porque o ensino em casa é muito diferente, mas a gente acredita que a gente vai conseguir recuperar isso sim e que, em breve, as crianças estarão alfabetizadas", avalia.

Alfabetização na pandemia — Foto: Arte: g1

Diagnóstico

Ivan Gontijo, coordenador de políticas educacionais do Todos Pela Educação explica que alguns públicos específicos, como estudantes pobres, periféricos, negros foram mais afetados e precisam de atenção especial. "Alguns estudantes foram muito mais prejudicados do que outros. Essa pesquisa que a gente fez mostrou que os estudantes de menor nível socioeconômico, os estudantes mais pobres, antes da pandemia não sabia escrever. Agora a gente passou para a metade. Quando a gente faz recorte de raça e cor, alunos pretos e pardos também foram prejudicados", diz.

"A alfabetização é considerada uma habilidade base do conhecimento. Se eu não consigo ser bem alfabetizado e na idade certa, eu vou ter dificuldade em toda a minha trajetória escolar e não só em linha portuguesa. Se eu não sou alfabetizado de forma adequada, eu vou ter dificuldade em história, geografia, ciências. Então assim, o aluno que não consegue cumpri essa etapa de forma satisfatória vai ser prejudicado em toda a sua trajetória", explica Gontijo.

"A única notícia um pouco boa é que esses estudantes de 6 e 7 anos ainda vão ter muito tempo dentro dos sistemas educacionais, quase dez anos. A gente vai ter tempo para recuperar e correr atrás do tempo perdido. Mas o que a gente precisa fazer agora, as secretarias municipais e estaduais? Primeiro a gente precisa ter um diagnóstico, entender quais estudantes não estão alfabetizados. Quantos são? São muitos? São poucos? Cada escola precisa ter esse diagnósticos e clareza. A partir disso tentar fazer com que esses estudantes, por exemplo, tenham mais programas de reforço e recuperação, estudem em turmas menores de modo que os professores possam estar mais próximos, dar mais apoio. Os professores também precisam ser preparados para alfabetizar alunos que em outros tempos já estavam alfabetizados", orienta.

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