Número de crianças brasileiras não alfabetizadas dispara na pandemia
A mãe de Gabriel, Vanessa Oliveira Rocha, mostra para ele o caminho das letras. Gabriel tem 7 anos. A pandemia chegou bem quando começaria a aprender a ler e a escrever, e ele tem uma doença respiratória. Ficou em casa mesmo nos períodos em que a escola reabriu. Nem sempre Vanessa conseguia ir lá buscar as lições para ele.
“Às vezes tinha alguém com Covid, às vezes alguém com a saúde meio dificultosa, aí não dava para atender a população”, conta a dona de casa.
E Gabriel enfrentou uma situação que foi muito comum pelo Brasil: a falta de acesso à internet.
“Aqui em casa é um celular para três crianças que estão na escola, então não tem como. A gente acabou pegando um tablet para eles terem a aula, só que eu não conseguia acessar os links que eles falavam”, diz Vanessa.
Um levantamento feito pela ONG Todos Pela Educação, a partir de informações do IBGE, mostra: em 2019, 25% das crianças de 6 e 7 anos não sabiam ler e escrever. Em 2021, segundo ano da pandemia, já eram 40%.
Em números absolutos, são quase 2,5 milhões de crianças nessa faixa etária que ainda não estão alfabetizadas. Nunca foram tantas nos dez anos em que esse levantamento é feito.
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A faixa etária dos 6 aos 7 anos é aquela em que as crianças começam o ensino fundamental e, nos dois primeiros anos do ensino fundamental, o foco deve estar exatamente na alfabetização. É o que diz a Base Nacional Comum Curricular, documento que define o que os alunos precisam aprender em cada etapa da educação.
Sem a alfabetização nessa idade, como ou quando as crianças vão aprender tudo o que vem depois?
Priscila Cruz, presidente do Todos Pela Educação, explica o que pode acontecer com essas crianças.
“Quando uma criança não aprende na idade certa, ela pode derrapar nos anos seguintes. Ela pode não conseguir acompanhar mais a sua turma, porque os professores dos anos seguintes acompanham o currículo que segue. Isso vai fazer com que ela cada vez aprenda menos, inclusive com o risco enorme de evasão escolar, de desistência”, enfatiza.
O levantamento ainda mostra que o percentual de crianças pretas e pardas que ainda não sabem ler e escrever é bem maior do que o de crianças brancas. A mesma coisa quando se compara as crianças mais pobres com as mais ricas.
Segundo a Constituição, todos os governos - municipais, estaduais e o federal - têm responsabilidades sobre a educação.
Priscila afirma que eles precisam tomar providências já.
“A gente tem uma agenda emergencial agora que é a reabertura das escolas, todas as escolas, expandir o tempo integral, garantir recuperação e avanço da aprendizagem, investimento na infraestrutura das escolas, na formação de professores. A gente precisa de um esforço nacional e, esse ano, que é um ano de eleições, é um bom ano para a gente pensar esse plano, esse pacto pela aprendizagem das crianças”, reforça.