Sociedade

No dia do Combate à LGBTfobia, lembremos de Dandara

O brutal assassinato ocorrido em fevereiro, em Fortaleza, é símbolo da violência cotidiana no Brasil

Protesto durante a 11ª Parada do Orgulho LGBTS de Taguatinga (DF)
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Não bastassem as rebeliões nos presídios e as cabeças de presos cortadas, o noticiário sobre o Brasil que correu o mundo no início deste ano de 2017 teve outra imagem macabra – o assassinato brutal da travesti Dandara dos Santos, de 42 anos.

A lenta morte de Dandara, os pontapés cheio de ódio e a humilhação foram registradas com um aparelho celular pelos jovens agressores. No vídeo, podem-se ouvir risadas, satisfação em espancar Dandara, em um bairro da periferia de Fortaleza.

Não consta que Dandara devesse qualquer coisa a seus assassinos, nem que lhes tivesse feito mal. Sua morte foi gratuita, motivada apenas pelo ódio, como acontece a centenas de LGBTs todos os anos no Brasil, em especial travestis e transexuais.

O Brasil é um dos países recordistas em violência de gênero. Relatório da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Interssexuais (ILGA) diz que apenas em 2016 o país teve 343 homicídios de LGBTs. É quase um morto por dia. As mais vulneráveis são justamente as transexuais.

Ainda que tenhamos avanços como o reconhecimento do nome social em diversas esferas da administração pública, ou o casamento igualitário, é preciso mudar a cultura da intolerância e da violência contra os LGBTs. E isso se faz sobretudo na escola. Mas não no Brasil, onde deputados e vereadores vetaram em grande parte do País esse debate nos currículos escolares.

Se os avanços eram lentos nos governos petistas, aliados das lutas LGBTs, no atual governo em exercício, respaldado pelos setores mais retrógrados do País, a agenda é barrar retrocessos. Lembremos que o segundo colocado nas pesquisas para a Presidência, Jair Bolsonaro, já disse que ser “gay é falta de porrada”. Outro presidenciável, o tucano João Doria, é entusiasta do projeto Escola Sem Partido.

Para essa turma, falar de respeito e igualdade de gênero na escola é doutrinação comunista. À medida que conquistamos alguns direitos, a reação conservadora se organizou de forma a transformar os LGBTs em bode expiatório para todos os males. Isso é visível no Congresso, onde deputados religiosos berram contra direitos igualitários criando uma cortina de fumaça para tocar livremente suas negociatas com os setores mais espúrios da política.

Os assassinos de Dandara não teriam a ousadia de matá-la se não estivessem certos de que seu ato teria a complacência e os sorrisos sádicos de muita gente. E é o discurso dos Bolsonaros e Malafaias que respaldam barbaridades contra os LGBTs.

Não consta que Dandara tenha sido ativista. Era apenas uma menina negra e pobre da periferia do Nordeste, que não se via no corpo em que nasceu, e que ousou viver de acordo com seus sentimentos e sua vontade. Para seus assassinos, o pecado de Dandara foi ser ela mesma.

Não se sabe ainda o que levou Dandara a escolher seu nome. Por uma coincidência, ela deu a si o nome de um mito da resistência e contra a opressão – Dandara, mulher de Zumbi dos Palmares. Segundo a lenda, a primeira morreu como heroína se jogando de um penhasco quando as tropas portuguesas capturam Zumbi e o seu quilombo, no fim dos anos 1600.

Em 2017, já não queremos nenhum heroísmo de nossas Dandaras. Para muitos LGBTs, sobretudo travestis e transgêneros, viver já é um ato heróico. Dandara dos Santos, presente!

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