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Negra e bolsista do Prouni, advogada lembra como sua vida mudou com oportunidade aberta pelo programa: 'Tudo o que tenho hoje começou ali'

A paulista Tamires Sampaio conta que era uma das três únicas pessoas negras em sua turma na faculdade; todos estavam ali pelo programa
Tamires Sampaio Foto: Guilherme Fahl
Tamires Sampaio Foto: Guilherme Fahl

A advogada paulista Tamires Sampaio, hoje com 28 anos, lembra que há sei, era uma entre as três únicas pessoas negras de uma turma de 80 alunos na faculdade em que estudou. Aprovada na Mackenzie em 2015, ela está entre os estudantes de baixa renda que se beneficiaram do antigo modelo do Programa Universidade Para Todos (Prouni), cujas regras foram modificadas ontem em medida provisória do presidente Jair Bolsonaro , que liberou a participação no programa alunos de baixa renda de escolas privadas que não tiveram bolsa. Antes, a participação só era permitida para quem estudou em escola pública ou teve bolsa integral em instituições particulares.

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Tamires conta que só conseguiu realizar o sonho de cursar Direito graças à bolsa integral conquistada através da nota do Enem. Na sua opinião, permitir que jovens de escolas particulares tenham acesso ao programa social vai prejudicar a entrada de estudantes negros e pobres, como ela foi, no ensino superior.

— Eu só tinha perspectiva de Fuvest (vestibular da USP), que não passei, e o Enem, que consegui passar através do Prouni. Naquela época, a minha mensalidade custava R$ 1,2 mil. Imagina quanto deve estar hoje? — questiona. — Pessoas que podem pagar por uma escola privada têm mais oportunidades de aprendizado, ainda mais agora na pandemia. Mas o sucateamento das políticas públicas e a exclusão de pobres e negros predominam nos últimos anos. Além de excludente, esta MP é inconstitucional e é muito importante que haja manifestações contra essa mudança — afirma a advogada, ressaltando que, por ser fruto de uma lei federal, o Prouni não poderia ser alterado por uma medida provisória, apenas por projeto de lei.

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Em sua turma na Mackenzie, todas as três pessoas negras eram bolsistas do Prouni. Após ouvir comentários de que pessoas como ela regrediam a qualidade da instituição, Tamires passou a se engajar no movimento estudantil universitário e a reivindicar o direito à permanência de pessoas pretas e pobres no ambiente acadêmico privado. Além de ter se tornado referência entre conhecidos e familiares que também usufruíram do programa, ela colheu os frutos da graduação: se tornou mestre e publicou um livro.

— Nós que somos bolsistas, especialmente com cota racial, agarramos a oportunidade com unhas e dentes, porque é uma chance da vida, muitas vezes. Tudo o que eu tenho hoje, começou lá atrás no Prouni. E, apesar de eu ter sido uma entre três negros apenas, pelo menos éramos três, poderia ser nenhum, porque todos entraram pelo programa — diz.