Educação

Por Pedro Lins, TV Globo


Série Educação: NE1 traz debate sobre a importância das creches

Série Educação: NE1 traz debate sobre a importância das creches

O ensino infantil é um dos principais desafios para a melhoria da educação básica no Brasil. Além de ser um local seguro para que os pais e mães possam deixar os filhos para ir trabalhar, também estimula o desenvolvimento das crianças (veja vídeo acima).

Em Pernambuco, há mais de 62 mil crianças matriculadas em creches e pré-escolas públicas, o que, para os especialistas, é um número insuficiente para o universo de mais de 236 mil crianças que necessitam dessa fase de ensino.

(Desta segunda-feira, 7, até a sexta-feira, 11, o g1, o Bom Dia PE, o NE1 e o NE2 trazem reportagens com reflexões sobre a educação.)

Idealmente, as crianças em creches fazem cinco refeições por dia e têm acompanhamento de profissionais como professores, pedagogos e auxiliares de desenvolvimento infantil (ADIs). No entanto, essa não é a realidade de muitas instituições. Em alguns casos, sequer há vagas.

Crianças em creches municipais no Recife, em foto de arquivo — Foto: Andréa Rêgo Barros/Divulgação

Foi nesse cenário de escassez que a dona de casa Rosângela Mercês criou os quatro filhos. Ela mora em Abreu e Lima, a pouco mais de 20 quilômetros do Recife. Sem rede de apoio familiar e auxílio do poder público, ela, a contragosto, precisou se dedicar exclusivamente à criação dos filhos.

"Eu tenho quatro filhos e foi uma caminhada longa e muito difícil, sem auxílio, sem amparo nenhum. Minha vida seria bem mais agradável, teria sido bem mais proveitosa [com creche para as crianças]. Eu parei, não trabalhei, não consegui produzir nada. Aonde ia, tinha que levar meus filhos", afirmou Rosângela.

A história de Rosângela não é uma exceção. Dados da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal apontam que, em 2020, havia 545.968 crianças de até 3 anos em Pernambuco, sendo que 236.404 precisavam de creche, o que equivale a 43,25% do total. Apesar disso, o mesmo índice mostra que somente 18,7% dessas crianças estavam matriculadas.

Direitos e deveres

Discussão sobre creches é tema de reportagem de série da TV Globo — Foto: Reprodução/TV Globo

Apesar de o cenário de falta de vagas em creches ser corriqueiro, os números demonstram a ineficiência do poder público de cumprir aquilo que é dever do Estado, de acordo com a Constituição Federal de 1988.

No Brasil, segundo a especialista em educação infantil Tetê Brandão, as creches surgiram desde a época da abolição da escravatura de forma assistencialista, para que as mães pudessem trabalhar deixando os filhos seguros.

Esse pensamento, que perdura até os dias atuais, vem dando lugar à noção de que esses locais devem servir, sobretudo, para o desenvolvimento das crianças, sendo uma das etapas da educação infantil.

"É muito importante que a gente entenda que sai desse lugar do assistencialismo para um lugar do direito da criança com a Constituição Federal de 1988. É um direito do bebê e da criança que ele tenha vaga na creche e é muito importante que esse espaço seja um espaço de promoção de desenvolvimento", afirmou Tetê.

A matrícula de bebês e crianças em creches e pré-escolas não é obrigatória. Entretanto, é dever do poder público ofertar vagas para as famílias que quiserem e precisarem. Isso ultrapassa a noção de haver um lugar onde as crianças comem, dormem e voltam para a casa.

Segundo a pedagoga e gestora da educação infantil de Pernambuco, Adriana Toledo, é necessário dar toda a estrutura para o pleno desenvolvimento dessas crianças, na primeira etapa da educação básica.

Adriana Toledo ressalta que, sendo um espaço de profissionais que estudam e pesquisam sobre aprendizado infantil, as creches faz diferença na vida das crianças.

"O espaço é importante, os materiais que são utilizados, os livros de literatura infantil, os brinquedos, os objetos, o espaço do lado de fora, para ter esse contato com a natureza, porque é assim que a gente constrói o respeito à natureza", disse Adriana Toledo.

Num caminho inverso ao que foi trilhado por Rosângela está a empreendedora Gabriela Vasconcelos. Sem rede de apoio familiar, ela conseguiu vaga numa creche municipal do Recife e, assim, pode trilhar um caminho profissional.

A filha estuda desde os 3 meses de idade, e, segundo Gabriela, frequentar a creche tem sido essencial no desenvolvimento da menina.

"A partir do trabalho das professoras, ela começou a socializar mais com as pessoas, falar mais, se desenvolver, comer sozinha, se vestir. Com menos de um ano, ela já está desfraldando, pede para ir ao banheiro, diz ‘obrigada’ e ‘por favor’, conversa como uma menina velha. É um desenvolvimento que vai além desses cuidados que ela teria de dormir e se alimentar", disse a mãe.

Parceria família-escola

Creche Escola Brejo de Beberibe, na Zona Norte do Recife — Foto: Rodolfo Loepert/Divulgação

A partir da mudança de paradigma sobre o papel da creche na educação infantil, saindo de um lugar de assistencialismo para necessária ao desenvolvimento das crianças, passou-se a pensar a creche e a pré-escola como lugar de promoção de desenvolvimento, que, segundo Tetê Brandão, "atende a todas as necessidades de desenvolvimento do bebê e da criança".

Entretanto, existe uma discussão sobre quais atribuições cabem à escola e quais são da família. A coordenadora pedagógica de creches no Recife, Michaelle Moraes, contou que o diálogo entre pais e escola é o "fio condutor para que a educação aconteça em sua plenitude", mas, muitas vezes, acaba prejudicado.

Para sanar esse problema, é necessária não apenas a promoção de diálogo constante com os pais, de forma transparente e, acima de tudo, rotineira, como, por parte da família, a procura da escola para discutir o bem-estar das crianças, apresentando as necessidades dos alunos.

"Precisa haver esse diálogo e essa troca. O que a família traz para a creche em relação à criança vai favorecer o nosso trabalho, possibilitando que a gente repense nossas práticas pedagógicas em função do bem-estar dessa criança. Esse cuidar tem que existir em casa e ser uma extensão na escola", explicou Michaelle.

A especialista em educação infantil Tetê Brandão complementou dizendo que os papéis de família e escola, embora sejam semelhantes nessa faixa etária, não podem se confundir. Além disso, nos casos em que os profissionais não conseguem acessar essas famílias, é preciso resiliência.

"Não é a mesma coisa que estar em casa, porque é um espaço que amplia as possibilidades dessa criança. [...] Se não tem o diálogo, se em casa não é do jeito que eu acho que deve ser, ou se realmente não consigo acessar essa família, por diversos motivos, ainda assim, não posso desistir do meu trabalho e deixar para lá porque eu faço aqui e a família desfaz", afirmou.

Estrutura

Criança na Creche Esperança, em San Martin, Zona Oeste do Recife — Foto: Marcos Pastich/Divulgação

O administrador Renan Gomes é pai de uma menina, e, enquanto buscava vaga para a filha numa creche, sentiu na pele a falta de estrutura. A garota foi matriculada em uma que funciona em parceria entre a prefeitura e uma universidade, mas, nas buscas, pode ver de perto que muitas instituições não funcionam como deveriam.

"A creche que minha filha fica tem uma estrutura muito boa. É diferenciada, porque é uma parceria da universidade com a prefeitura. [...] Quando eu estava procurando, via que não tinha estrutura suficiente para todas as crianças, nem para estimular essas crianças com livros, cadeiras, o que faz a diferença. É muito precária a estrutura que a prefeitura oferece", afirmou.

A professora Adriana Barros trabalha há 15 anos com a educação infantil. Ela se diz "fã de creche" por conhecer de perto o trabalho. Mas, apesar do esforço dos profissionais, a estrutura também é determinante para a qualidade do ensino, especialmente para crianças com deficiência e necessidades especiais.

Faltam, segundo ela, fonoaudiólogos e psicólogos dentro das creches, e isso é sentido na ponta pelos professores e demais profissionais.

"É preciso ampliar o leque de profissionais que trabalham na creche. A gente sente a dificuldade, porque a gente trabalha com crianças com necessidades especiais, com autismo, com síndrome de Down, com hiperatividade. O que a gente pode fazer é dar uma orientação, um parecer para os pais procurarem um profissional qualificado. Se esse profissional estivesse dentro da creche, seria um trabalho casado", afirmou Adriana Barros.

Dentro dessa estrutura também está a formação dos professores, que, segundo a gestora da educação infantil de Pernambuco, Adriana Toledo, é fundamental.

"Estamos falando de uma etapa, a primeira etapa da educação básica, que é a educação infantil, [...] da importância da formação. Tanto da formação do profissional, daquele que está na creche, como a formação inicial e a formação continuada, que é muito importante", declarou.

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