Por Mateus Rodrigues, TV Globo


O Ministério da Educação anunciou nesta quinta-feira (4), em Brasília, a suspensão de um acordo de cooperação técnica internacional suspeito de irregularidade. De acordo com o MEC, o governo brasileiro enviou R$ 178 milhões desde 2008 à instituição internacional parceira. O contrato foi feito com a Organização dos Estados Interamericanos (OEI), que se declarou surpresa com a decisão e disse estar aberta a prestar esclarecimentos.

"O contrato é irregular, na nossa opinião, a ponto de acionar os órgãos competentes. Não estou acusando ninguém de roubo. Não estou acusando ninguém de dolo. Quem vai decidir são os órgãos competentes", disse o ministro Abraham Weintraub.

Os termos do acordo serão avaliados pela corregedoria da pasta, pela Controladoria-Geral da União e pelo Tribunal de Contas da União. Questionado, o MEC não deixou claro quais suspeitas recaem sobre os documentos ou sobre gestores anteriores.

Segundo a secretária-executiva-adjunta do MEC, Maria Fernanda Bittencourt, o acordo está suspenso desde 10 de junho. Ao analisar os papéis para renovar a parceria, o ministério notou que alguns passos da contratação não tinham seguido o rito previsto em um decreto de 2004.

A suspensão implicou em desligar 89 consultores que prestavam serviço no ministério. O número inclui 50 profissionais da área de tecnologia da informação (TI) – o restante trabalhava “em todas as outras áreas do MEC”, segundo a pasta.

Acordo com a OEI

O acordo cancelado foi firmado em 2008 com a OEI e, naquele ano, R$ 4,4 milhões foram repassados à entidade. Em 2018, o acordo já previa R$ 37,4 milhões, com 89 consultores contratados para atuar no MEC.

Em nota, a entidade disse que "tomou conhecimento, com surpresa, da recente decisão" e disse que não foi "convidada para ser ouvida, em nenhum momento". A OEI também afirma que está aberta para esclarecer os questionamentos (veja a íntegra da nota ao fim da reportagem).

Problemas

Segundo o consultor jurídico do MEC, Rodrigo Pirajá, a contratação de consultoria não é, por si só, irregular. O problema encontrado pelo ministério foi que o acordo de cooperação técnica, registrado como “voluntário”, vinha sendo bancado com contribuições “voluntárias” do Brasil à OEI.

"Houve um aumento de uma prática um pouco informal, e não obediente à conformidade legal", disse. "O problema não é no mérito, é na formalização jurídica. De uma forma um pouco mais solta que o exigido pela legislação", afirmou.

Além da relação direta entre as doações voluntárias do Brasil e a contratação de consultores, o MEC diz que houve problemas como a inexistência de um projeto básico (previsto em lei) e de assinaturas da área técnica do ministério e da Agência Brasileira de Cooperação.

Decisão unilateral

O consultor jurídico do MEC afirma que a decisão de suspender o acordo e dispensar os consultores foi unilateral. Até a tarde desta quinta-feira (4), o ministério não havia pedido explicações à OEI sobre as falhas apontadas nos documentos.

Uma reunião deve ser marcada nos próximos dias e, segundo Pirajá, o contrato pode até ser retomado com as devidas correções.

Íntegra da nota

Parceria entre a OEI e o MEC

A Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, a Ciência e a Cultura (OEI), é um organismo intergovernamental de cooperação internacional com 70 anos de trajetória, presença e atividade nos 23 países membros da Organização.

A OEI tomou conhecimento, com surpresa, da recente decisão do Ministério da Educação do Brasil de decretar nulidade do um acordo firmado em fevereiro de 2018. Uma decisão unilateral da atual gestão do MEC, uma vez que a OEI não foi convidada para ser ouvida, em nenhum momento, no decurso do processo, nem ao menos foi solicitado qualquer aporte de informação complementar ou para esclarecimento.

A Organização ressalta seu total compromisso com a transparência e garante a regularidade de todos seus contratos. A OEI desconhece qualquer irregularidade ou falta de lisura, tanto que se colocou à disposição da atual gestão do MEC para oferecer esclarecimentos e sanar eventuais dúvidas.

Insistimos que em 2019, a Organização dos Estados Ibero-americanos completa 70 anos de trabalho em benefício da população Ibero-americana e de seus 23 Estados-Membros, sempre marcado pelo compromisso inconteste com a melhoria da qualidade da educação e do desenvolvimento científico e cultural da região. E é por isso que a Organização detém tanta presença e atividade na região, graças à confiança que é oferecida pelos países que a integram.

Atuando no Brasil desde 2001, a OEI guarda larga e profunda experiência de atuação junto ao Estado brasileiro, em parceria com os órgãos da administração pública direta e indireta, incluindo o Ministério da Educação.

A OEI, assim como outros organismos internacionais, contribui para o desenvolvimento de projetos relacionados às suas atribuições, contando para isso com o apoio técnico e financeiro dos países no desenvolvimento de estratégias para promover a construção de uma agenda regional ibero-americana.

São exemplos de ações no campo da educação o Programa de Bilinguismo com foco no fortalecimento da língua portuguesa, incluindo a atuação junto a escolas de fronteira, o Programa Primeira Infância e Educação, o Programa Ibero-americano de Educação em Direitos Humanos, Democracia e Cidadania, do Programa de Mobilidade – aprovados na Cimeira Ibero-americana de Chefes de Estado e de Governo, entre tantas outras ações desenvolvidas a partir do apoio dos estados membros da OEI, sem o qual esses programas tornam-se inviáveis.

De mais a mais, não se pode deixar de esclarecer que cooperações similares vêm sendo celebradas, há muitos anos, inclusive neste ano de 2019, por diversos outros órgãos do Governo brasileiro e com diferentes organizações internacionais, inclusive com aquelas das quais a República Federativa do Brasil não é Estado-membro ou com as quais não celebrou acordos-quadro de cooperação.

Enquanto um organismo internacional intergovernamental, do qual o Brasil é membro integrante, a OEI entende a importância da cooperação interacional para o desenvolvimento e aprimoramento das políticas educacionais brasileiras, motivo pelo qual mantém total interesse na continuidade da parceria com o Ministério da Educação, razão pela qual aguarda mais informações sobre o processo para que possa se posicionar adequadamente a respeito do tema, prestando os esclarecimentos que se façam necessários.

Ainda assim, indicamos que a OEI é auditada anualmente por auditoria externa independente, por auditoria interna e pela União Europeia. Por sermos pautados pela transparência, já oferecemos ao Ministério da Educação todas as informações e até o presente momento não recebemos nenhuma resposta. Indicamos, da mesma forma que tentamos realizar reunião com o Ministro da Educação há meses.

Esperamos poder esclarecer quaisquer dúvidas ou questionamentos e, para tanto, seguimos à disposição.

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