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Opinião

MEC continua distante da agenda dos reais problemas da educação

Não falta trabalho a ser feito pelo ministro e equipe, que perdem tempo em pregações ideológicas

Aparcela ideológica do governo Bolsonaro tem passado por surtos de hiperatividade. Os mais frequentes ocorrem no Ministério da Educação (MEC), em que Ricardo Vélez Rodríguez ainda não conseguiu estabelecer uma agenda de trabalho voltada ao combate dos reais problemas do setor, que não são poucos nem pequenos.

O ministro já produziu reações negativas ao fazer comentários ácidos sobre o turista brasileiro no exterior. E recebeu críticas ainda maiores quando despachou circular para as escolas públicas, a fim de que, no primeiro dia de aula, todas seguissem um rito capaz de relembrar os ares do Estado Novo de Getúlio e a ditadura militar de 64 a 85: hastear a Bandeira Nacional e cantar o Hino, sendo lido um texto que finalizava com o slogan da campanha do presidente Bolsonaro.

Para agravar a determinação, eram pedidos vídeos dos alunos na solenidade, a serem enviados à assessoria de imprensa do MEC ou à Secretaria de Comunicação da Presidência. Havia uma indisfarçável e descabida intenção de usar o material com finalidade de propaganda. Ocorreram recuos, mas tudo continuou na mesma no MEC, em meio à intensa briga de grupos bolsonaristas.

O ministério se mantém subordinado a preocupações ideológicas. Este tem sido um costume do próprio presidente Bolsonaro, em toda a sua carreira política. Difícil mudar agora, mas é imprescindível fazer a sintonia de áreas do governo com temas concretos. É preciso um esforço, ao menos em setores-chave, como o MEC.

A última da série são comentários do procurador da Justiça de Santa Catarina, Gilberto Callado de Oliveira, representante da sociedade civil numa comissão criada para analisar o questionário do Enem, exame do ensino médio, criticado por Bolsonaro na campanha.

Callado considera os professores “corrompidos”, as universidades, contaminadas pelo “esquerdismo”, e o Supremo, inimigo da família. A liberdade de expressão garante ao procurador dizer o que pensa. A questão é o risco de o Enem ser contaminado por uma visão oposta ao “esquerdismo”, mas também distante da necessidade de o universo do ensino ser um espaço aberto ao aprendizado.

Nos governos do PT, também havia áreas entregues à militância sectária. Como agora, aparelhamento sustentado pelo dinheiro do contribuinte. Enquanto isso, faltam ações para enfrentar com vigor a má qualidade do ensino médio, para o qual há uma reforma a ser implementada; e existe o essencial Currículo Único também a ser colocado em prática. Duas tarefas que ocupariam melhor o tempo do ministro e equipe.