Por Ana Carolina Moreno e Flavia Foreque, G1 e TV Globo


Depois de reformar o ensino médio e lançar um programa para expandir o número de matrículas em tempo integral nesse ciclo da educação básica, a gestão do ex-presidente Michel Temer conseguiu aumentar em 41,8% o número de estudantes que passam sete horas por dia na escola. Entretanto, não bateu a meta que ela mesma se impôs: em 2018, segundo dados do Censo Escolar divulgado nesta quinta-feira (31), as matrículas no ensino integral representavam 9,5% do total de estudantes matriculados no ensino médio. A expectativa é que chegassem até 13% no fim do ano passado.

Evolução da taxa de matrícula em tempo integral no ensino médio — Foto: Alexandre Mauro/G1

Dados da Diretoria de Estatísticas Educacionais (Deed) do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) mostram que o Brasil tem visto aumentar ano a ano a participação das matrículas do ensino médio que são em tempo integral.

Eles indicam, também, que desde 2016 esse aumento aconteceu em um ritmo mais acelerado, ao mesmo tempo em que o número absoluto de matrículas do ensino médio caiu. Em 2016, o Brasil tinha 8,1 milhões de estudantes de ensino médio, e 518 mil passavam sete horas por dia na escola. Já em 2018, essa quantidade subiu para 735 mil, mas o total de matrículas do ensino médio havia recuado 5,2%, para 7,7 milhões.

O secretário-executivo Luiz Antônio Tozi explica que a queda das matrículas no ensino médio é um 'reflexo' do que ocorre no fundamental.

"Ele [estudante] vem carregando deficiências que o professor vem tentando trabalhar com ele, mas naquele instante o modelo quebra, e na mudança ele sofre o impacto e perde o esteio”, afirma Luiz sobre a transição entre o fundamental I e II, quando muitas vezes a responsabilidade da escola passa do município para o Estado.

Queda nas matrículas do ensino médio
Total de alunos caiu pelo segundo ano consecutivo
Fonte: Inep/Diretoria de Estatísticas Educacionais (Deed)

Esse movimento vai em caminho oposto ao cenário de jovens fora da sala de aula: de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad C) de 2017, 900 mil adolescentes de 15 a 17 anos estão fora da escola e não concluíram o ensino médio. No Plano Nacional de Educação, a meta era universalizar o atendimento desse público há três anos, em 2016.

Além disso, a distorção idade-série do ensino médio se manteve no patamar de 28,2%, depois de subir 0,2 ponto percentual entre 2016 e 2017. Ela indica a porcentagem de adolescentes de 15 a 17 que estão matriculados no ensino fundamental, e portanto fora da série esperada para sua idade.

Procurada pelo G1, a assessoria do ex-presidente Michel Temer informou que não iria comentar sobre os dados divulgados sobre o Censo 2018.

"O presidente não vai comentar. Isso é uma questão administrativa e o ministério [da Educação] pode se pronunciar sobre isso. Não é uma questão do presidente. O presidente tinha os ministros e o ministério continua e pode fazer uma avaliação com ele”, informou a assessoria por telefone.

Investimento bilionário

O aumento das matrículas em tempo integral coincide com o anúncio, feito pelo então ministro Mendonça Filho, do Programa de Fomento à Implantação das Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), em setembro de 2016. Ele previa um investimento de R$ 1,5 bilhão até o fim de 2018, e o custo anunciado chegaria a R$ 4 bilhões em quatro anos.

Pela iniciativa, o MEC investiria R$ 2 mil por aluno matriculado no ensino integral, como ajuda de custo para que as redes públicas ampliassem a oferta.

Em maio de 2018, a pasta afirmou que 516 escolas já estavam sendo financiadas em 2017, mas alterou a previsão de investimento. "No total, o MEC apoiará progressivamente 500 mil matrículas nas escolas de Ensino Médio em Tempo Integral e até 2020, os investimentos podem alcançar R$ 1,5 bilhão", dizia o comunicado.

Em outubro do ano passado, três meses antes do fim do prazo, uma apresentação feita pelo então ministro da Educação Rossieli Soares Silva indicou que o programa já atendia 900 escolas, reunindo um total de 430 mil matrículas, e que o investimento chegou a R$ 900 milhões.

Além disso, outros R$ 200 milhões foram anunciados naquele mês para um programa de avaliação da política. Inicialmente, a proposta era selecionar 312 escolas para passarem pela avaliação sobre o impacto do fomento ao tempo integral, com duração prevista de quatro anos. Em novembro, o MEC afirmou que selecionou 204 escolas para a avaliação comparativa – metade delas participa do programa, e a outra metade não.

Contramão da meta do PNE

Enquanto as matrículas em tempo integral no ensino médio evoluíram, no ensino fundamental elas perderam participação entre 2017 e 2018. Os dados do Censo Escolar divulgados nesta quinta mostram que, do total de 27,1 milhões de matrículas nos anos iniciais e finais do fundamental, apenas 9,4% eram em tempo integral no ano passado.

Isso representa uma queda expressiva se comparado ao ano anterior: em 2017, o percentual era de 13,9%. Se considerada apenas a rede pública, a queda foi ainda maior, de 16,3% das matrículas em 2017 para 10,9% no ano passado.

Em coletiva de imprensa nesta quinta-feira (31), o diretor de estatísticas educacionais do Inep, Carlos Eduardo Moreno Sampaio, comentou sobre a queda de matrículas integrais no fundamental.

"Certamente isso se deve ao programa Mais Educação que era utilizado pelos municípios para ampliar a jornada escolar dos estudantes atendidos", disse.

Além da meta autoimposta pela gestão Temer, porém, o Brasil é obrigado por lei a expandir as matrículas em tempo integral da educação básica para 25% até 2024.

Essa é uma das metas do Plano Nacional de Educação (PNE), que neste ano chega à metade do caminho, completando cinco dos dez anos de vigência da lei.

O ensino médio e os professores

Entre 2017 e 2018, porém, o Brasil registrou um aumento no total de professores que atuam no ensino médio. No ano passado, o Censo aponta que 513.403 mil docentes estavam nesta situação, contra 509.814 mil em 2017. O avanço, de 0,7%, porém, não recuperou a queda de 1,9% registrada entre 2016 e 2017.

Professores do ensino médio
Após recuo entre 2016 e 2017, número de docentes do ensino médio (em vermelho) voltou a subir
Fonte: Inep/Censo Escolar

Veja outros destaques do Censo Escolar 2018:

  • ESCOLAS: Em 2018, o Brasil tinha 181.939 escolas de educação básica, sendo que 60,6% delas são mantidas pelas redes municipais, e 22,3% são instituições particulares. A maior parte das escolas oferece ensino fundamental ou pré-escola. No caso do ensino médio, a oferta só existe em 28.673 escolas, que representam 15,8% do total.
  • ENSINO INFANTIL: A matrícula das crianças de 0 a 3 anos de idade nas creches avançou no país entre 2017 e 2018, de 3.406.796 para 3.587.292. Atualmente, 56,5% delas estavam matriculadas em período integral. Já na pré-escola, onde estudam as crianças de 4 e 5 anos, o aumento foi de 5.101.935 para 5.157.892 matrículas, mas apenas 11,1% delas eram em tempo integral.
  • ENSINO PROFISSIONALIZANTE: Em 2018, o Brasil chegou ao maior número em cinco anos de matrículas no ensino profissionalizante integrado ao ensino médio. No total, 584.564 estudantes estavam nessa modalidade. No total, o país retomou o crescimento após dois anos de queda e registrou 1.903.230 matrículas na educação profissional, mas o número ainda ficou abaixo do patamar de 2014 e 2015.
  • EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: O número total de matrículas na educação de jovens e adultos (EJA) caiu. Em 2017, 3.598.716 pessoas com mais de 18 anos que não tinham terminado a educação na idade esperada estavam matriculadas em uma turma de EJA. Em 2018, esse número recuou 1,5%, para 3.545.988. No entanto, a queda foi registrada entre as matrículas do ensino fundamental. No ensino médio, o número de estudantes de EJA aumentou de 1.425.812 para 1.437.833.
  • EDUCAÇÃO ESPECIAL: Há pelo menos cinco anos, o número de matrículas de estudantes com necessidades especiais vem crescendo consecutivamente. Ele chegou a 1.181.276 em 2018, um avanço de 33,2% desde 2014. Também cresceu de 87,1%, há cinco anos, para 92,1% a porcentagem de alunos de quatro a 17 anos da educação especial matriculados em classes comuns, e não em turmas especiais. Na rede pública, essa taxa chega a 97,3%, mas entre as escolas privadas ela é de apenas 51,8%.
  • TOTAL DE MATRÍCULAS: Em cinco anos, o Brasil "perdeu" mais de um milhão de matrículas na educação básica, segundo os dados históricos do Censo Escolar. Porém, especialistas explicam que essa queda não se deve necessariamente ao abandono dos alunos. Outros motivos por trás da redução estão o aprimoramento das metodologias do Censo, onde matrículas duplicadas de estudantes são retiradas – por exemplo, no caso de um estudante que transferiu de escola e antes era "contado duas vezes" –, e fenômenos demográficos como a queda da taxa de natalidade, que faz com que o número de habitantes de uma certa faixa etária seja menor que em anos anteriores.

Evolução das matrículas na educação básica brasileira — Foto: Igor Estrella/G1

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