Opinião

A Unesco em tempos de pandemia

Organização nascida no Pós-Guerra  vive o desafio de promover cooperação mundial contra inimigo comum

Em 1945, no final da Segunda Guerra Mundial, o mundo em escombros buscava maneiras de se reerguer. A guerra ocasionou situações devastadoras, além de desigualdades econômicas e sociais, com milhões de refugiados e excluídos. As tensões entre os países e a busca por uma nova ordem mundial passavam pelas ideias de cooperação e multilateralismo, reforçando a necessidade do diálogo e da construção de uma cultura de paz.

Nesse contexto, em novembro de 1945, foi criada a Unesco, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, com a missão de construir uma cultura de paz na mente dos homens e das mulheres, por meio da educação, das ciências e da cultura, visando a favorecer o respeito universal à justiça, aos direitos humanos e às liberdades fundamentais afirmados aos povos do mundo.

É parte essencial do nosso mandato promover uma educação de qualidade, equitativa e inclusiva, como proposto no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4 (ODS 4), da Agenda 2030, aprovada em 2015. Essa agenda, adotada pelos países e pela sociedade civil, representa um compromisso universal, ambicioso e sustentável, uma agenda “das pessoas, feita pelas pessoas e para as pessoas”. São 17 objetivos que contribuem para construir um futuro mais justo e inclusivo, que não permita deixar ninguém para trás.

A Unesco colaborou intensamente para a elaboração da Agenda 2030. Com a finalidade de contribuir para implementar os ODS, a Organização busca, por meio de suas áreas de mandato (Educação, Ciências Naturais, Ciências Humanas e Sociais, Cultura e Comunicação e Informação) consolidar princípios e valores universais, tais como: solidariedade global, inclusão, redução das desigualdades, não discriminação, equidade de gênero e igualdade de oportunidades. Esses princípios estão refletidos em todas as ações e em todos os projetos de nossa Organização.

Neste ano de 2020, percebemos que o mundo foi, mais uma vez, desafiado. Desta vez, pela pandemia da Covid-19.

A educação foi umas das áreas mais afetadas. O fechamento das escolas atingiu cerca de 1,6 bilhão de estudantes em todo o mundo, o que representa 90% da população em idade escolar. É a maior interrupção da aprendizagem em toda a história, que também evidenciou o peso da exclusão digital, entre quem está on-line e quem está off-line.

A pandemia, no entanto, evidenciou outras fragilidades que vão além da educação, as quais nos mostram que ainda há uma enorme desigualdade entre países e povos.

Hoje, diante da mais grave emergência global de saúde do nosso tempo, o mandato da Unesco segue mais importante e atual do que nunca. Assim como ocorreu no pós-guerra, a atual pandemia coloca diante de todos uma profunda reflexão sobre o mundo que queremos. E mostra que, sem cooperação internacional, nenhum país ou sociedade será capaz de solucionar os complexos desafios do mundo em que vivemos.

A Unesco está, neste momento, a pedido de seus Estados-membros, discutindo as implicações éticas do uso da inteligência artificial e buscando formas de tornar o progresso científico igualmente alcançável para todos, com sua iniciativa de ciência aberta.

Continuaremos trabalhando para promover a educação de qualidade, proteger o patrimônio natural e histórico, fomentar a criatividade e respeitar a diversidade cultural, promover o avanço das ciências a serviço de um futuro sustentável, preservar a biodiversidade terrestre e marinha do nosso planeta, favorecer a liberdade de expressão e o acesso ao conhecimento e à informação.

A Unesco renova seu compromisso com um mundo mais inclusivo para todos e acredita que, 75 anos após sua criação, seu mandato continua mais importante do que nunca.


Marlova Jovchelovitch Noleto é diretora e representante da Unesco no Brasil